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CPI foca na Covaxin e ouvirá amigo de Barros amanhã e suposto lobista na 4ª

Francisco Araújo Filho, ex-secretário de saúde do DF, foi um dos últimos a depor na CPI antes de 7 de setembro - Divulgação/Senado Federal
Francisco Araújo Filho, ex-secretário de saúde do DF, foi um dos últimos a depor na CPI antes de 7 de setembro Imagem: Divulgação/Senado Federal

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília*

13/09/2021 04h00Atualizada em 13/09/2021 14h49

A CPI da Covid retoma os trabalhos amanhã focada nas suspeitas de irregularidades que envolvem o caso Covaxin/Precisa Medicamentos, após mais de uma semana sem depoimentos devido ao feriado de 7 de setembro e ao temor de senadores com a mobilização bolsonarista em Brasília.

A Precisa foi responsável por intermediar contrato do Ministério da Saúde para a compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin, da fabricante indiana Bharat Biotech, ao custo de R$ 1,6 bilhão. O dinheiro chegou a ser reservado pelo governo federal, mas o contrato acabou cancelado após série de suspeitas de erros e ilegalidades vir à tona.

A Comissão Parlamentar de Inquérito prevê ouvir amanhã o advogado e dono da Rede Brasil de Televisão, Marcos Tolentino. Ele é apontado na comissão como "sócio oculto" do FIB Bank, empresa responsável por oferecer uma garantia considerada irregular por senadores do colegiado no negócio da Covaxin.

Senadores também esperam pressionar Tolentino a elucidar detalhes de seu relacionamento com o líder do governo na Câmara, deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), de quem é amigo próximo.

O deputado, que integra a lista de investigados do colegiado, nega ter cometido qualquer irregularidade.

Amparado por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), Tolentino poderá ficar em silêncio na CPI a perguntas em que possa se incriminar.

O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), disse que Tolentino, "por ser amigo de Ricardo Barros, teria facilitado a emissão da carta fiança em favor da Precisa para satisfazer os interesses do deputado na execução do contrato da Covaxin".

A garantia fidejussória emitida pelo FIB Bank — R$ 80 milhões, o equivalente a 5% do total da operação para a Covaxin —, segundo senadores da CPI, não está de acordo com o modelo previsto no contrato com o governo federal.

Para o vice-presidente da CPI e autor do requerimento de convocação de Tolentino, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), era preciso apresentar uma fiança bancária, um seguro-garantia ou uma caução em dinheiro ou títulos da dívida pública.

O diretor-presidente do FIB Bank, Roberto Pereira Ramos Júnior, em depoimento aos senadores em 25 de agosto, negou que Tolentino faça parte da empresa ou tenha alguma gerência sobre ela. Para os senadores, no entanto, há evidências de que Ramos Júnior é "laranja" de Tolentino.

Já na quarta (15), a CPI prevê ouvir Marconny Albernaz de Faria, apontado como lobista da Precisa que teria ajudado a viabilizar o negócio da empresa com o Ministério da Saúde.

Marconny também foi flagrado em diálogos com a advogada da família do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) Karina Kufa.

Havia a expectativa de que a advogada fosse convocada para ser ouvida na quinta-feira (16). Ela promoveu em sua casa um jantar em que estavam presentes Marconny Faria José Ricardo Santana, ex-diretor de órgão ligado à Anvisa. Kufa chegou a declarar, por meio de nota, que não tem "qualquer vínculo com a compra ou venda de vacinas e testes para Covid". Os senadores decidiram, entretanto, agendar o depoimento de Danilo Trento, da Precisa, para a quinta-feira.

Atestados médicos

Os dois convocados para terça e quarta-feira foram motivo de controvérsia por não terem comparecido aos depoimentos nas datas inicialmente previstas e por terem enviado à CPI atestados médicos do Hospital Sírio-Libanês.

Tolentino iria depor no último dia 1º, mas alegou que estava internado devido a um "mal-estar". Faria enviou no mesmo dia um atestado do Sírio-Libanês de Brasília, com duração de 20 dias, devido a "dor pélvica".

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), chegou a afirmar que o hospital não poderia "acobertar criminosos e emitir atestados falsos" e ligou do próprio celular para a diretoria do hospital. O atestado de Marconny acabou sendo anulado pelo médico que o concedeu.

O depoimento de Marconny estava remarcado para o último dia 2, mas ele não compareceu, o que levou Randolfe Rodrigues a anunciar que seria pedida sua condução "sob vara" (coerção judicial) para depor.

A ministra do STF Cármen Lúcia negou o pedido de condução coercitiva de Marconny. Ele tem que comparecer, mas não terá de responder a questionamentos que o incriminem.

Marconny afirmou no dia 6 que iria ao Senado para confirmar sua convocação e seu "desejo de prestar todos os esclarecimentos".

Ex-mulher de Bolsonaro

Diferente do que era esperado para a semana passada, a aprovação da convocação de uma das ex-mulheres do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Ana Cristina Siqueira Valle, ainda não se concretizou. Mensagens apontaram suposta atuação dela a pedido de Marconny.

"Mensagens eletrônicas extraídas de aparelho celular em posse desta Comissão Parlamentar de Inquérito indicam que, a pedido do lobista Marconny Faria, a senhora Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do atual presidente da República, entrou em contato com o Palácio do Planalto para exercer influência no processo de escolha do defensor público-geral federal junto ao então ministro da Secretaria-Geral da Presidência e atual ministro do TCU, Jorge Oliveira", diz trecho do requerimento de convocação dela, de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).

Atualmente, Ana Cristina Siqueira Valle trabalha no gabinete da deputada federal Celina Leão (PP-DF), com salário bruto de R$ 8.116,08 mais auxílio de quase R$ 1.000.

O ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e ex-funcionário de Ana Cristina, Marcelo Luiz Nogueira dos Santos, admitiu que no período em que foi funcionário do filho de Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio era obrigado a devolver mensalmente 80% de seu salário — prática conhecida como rachadinha.

De acordo com Nogueira, ele entregava esses valores em dinheiro vivo nas mãos de Ana Cristina. Isso teria ocorrido todos os meses ao longo de mais de quatro anos, disse.

Outra possibilidade é que os senadores se debrucem em suspeitas envolvendo a empresa de logística VTCLog, que possui contratos com o Ministério da Saúde e é investigada por indícios de corrupção e outros crimes.

Um motoboy da VTCLog, Ivanildo Gonçalves, já prestou depoimento à comissão. Senadores suspeitam que o motoboy possa ter sido usado em um esquema criminoso (há indícios de lavagem de dinheiro, corrupção e outros delitos).

*Com Agência Senado e Estadão Conteúdo

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.