Sem contar gasto de Bolsonaro, viagem à Rússia custou R$ 1,2 milhão
A viagem do presidente Jair Bolsonaro (PL) à Rússia e à Hungria custou aos cofres públicos ao menos US$ 250 mil (ou cerca de R$ 1,2 milhão), segundo planilhas do Ministério das Relações Exteriores obtidas pelo UOL por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação). A viagem contou com pelo menos 70 pessoas e foi realizada na semana anterior ao início da invasão da Rússia à Ucrânia.
Os dados não incluem despesas feitas pelo presidente e seu filho vereador do Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro (Republicanos), que o acompanhou. De acordo com um dos artigos da LAI, ficam em segredo as informações que podem "colocar em risco a segurança do presidente e vice-presidente da República e respectivos cônjuges e filhos" por cinco anos ou até o término do segundo mandato presidencial, em caso de reeleição.
"O montante de recursos destinados a pagamento de hospedagem, em ambas as cidades, não poderá ser divulgado", explicou a Divisão de Pagamentos do Ministério das Relações Exteriores à reportagem.
"Os expedientes de autorização dessas despesas foram classificados como reservados e se tornaram objeto de Termo de Classificação de Informação", continuaram os servidores do Itamaraty.
Gastos com avião da FAB sob sigilo
Segundo o Itamaraty, a comitiva e o escalão avançado, grupo que chega antes para preparativos de segurança e planejamento, que foram à Rússia eram compostos por, ao menos, 70 pessoas.
Para Moscou, foram 71 servidores. Eles gastaram mais de US$ 150 mil (R$ 760 mil), sendo US$ 129 mil (R$ 655 mil) em diárias, como gastos com hotéis e alimentação. Outros US$ 21 mil (R$ 106 mil) foram despendidos em passagens aéreas.
Os gastos com manutenção e combustível dos aviões do governo federal não estão computados, mas apenas os bilhetes aéreos em voos comerciais. Muitos não tiveram despesas com avião discriminadas porque estavam em aeronaves da FAB (Força Aérea Brasileira), cujos gastos com combustível são sigilosos.
O grupo contou com 48 servidores da Presidência da República, 13 do Itamaraty e 10 da FAB e do Ministério da Defesa.
Estiveram presentes os ministros Carlos Alberto França (Relações Exteriores), Walter Braga Netto (Defesa), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência), diplomatas, ajudantes de ordem, assessores que cuidam da comunicação de Bolsonaro e, ainda, Raimundo Carreiro, que estava em processo de deixar o TCU (Tribunal de Contas da União) para ser embaixador em Portugal, por exemplo.
As diárias são valores colocados à disposição dos agentes públicos para indenizar despesas com hospedagem, alimentação e transporte. Os valores são pagos de acordo com uma tabela por dia no contracheque do servidor. Não existe obrigação de devolver valores recebidos além dos gastos efetivamente realizados.
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Budapeste
No segundo trecho da viagem, para Budapeste, na Hungria, 70 servidores gastaram mais de US$ 98 mil (cerca de R$ 498 mil), sendo quase US$ 82 mil (R$ 416 mil) em diárias, como gastos com hotéis e alimentação, e mais US$ 16 mil (R$ 81 mil) em passagens aéreas.
Havia 50 servidores vinculados à Presidência, 12 ao Ministério das Relações Exteriores e 8 militares da FAB.
Sem dados de gastos do presidente e de Carlos
A reportagem solicitou as despesas feitas por particulares e por agentes públicos de governos estaduais e municipais, como Carlos Bolsonaro, empresários e eventuais assessores legislativos de cidades e estados, por exemplo, que também participaram da comitiva.
No entanto, nenhuma informação relativa ao vereador e filho do presidente foi fornecida. O Itamaraty apenas informou não possuir dados de despesas sobre agentes privados.
Os dados fornecidos não incluem também despesas feitas pelo próprio Jair Bolsonaro. Desde o início de sua gestão, o presidente tem colocado seus gastos com viagens internacionais sob sigilo, medida que já foi tomada por seus antecessores.
Durante a viagem oficial, Bolsonaro defendeu a presença do filho. Disse que Carlos "não ganha nada do governo federal" para estar nas viagens da Presidência da República e que, mesmo assim, "votou em praticamente tudo o que acontecia na Câmara Municipal do Rio de Janeiro".
"Ele dorme no meu quarto, não tem qualquer despesa e trabalhou ontem comigo até de noite com nossas redes sociais prestando informações a todos do Brasil. O conteúdo que nós postamos no Facebook, Telegram, Twitter, em grande parte passa pelo crivo dele. É uma pessoa que não ganha nada do governo federal, é um vereador do Rio de Janeiro e essa noite, inclusive, ele votou em praticamente tudo o que acontecia na Câmara Municipal", argumentou o presidente.
A ida de Carlos Bolsonaro chamou a atenção de parlamentares, como o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Ele pediu ao STF (Supremo Tribunal Federal) que sejam apuradas as circunstâncias da viagem. O assessor presidencial Tércio Arnaud — tido como líder do chamado "gabinete do ódio" — também estava na comitiva.
Na ação, Randolfe cogitou que a visita de Bolsonaro ao Kremlin (sede do governo russo) possa representar um risco às eleições presidenciais deste ano. Isso porque os serviços de inteligência dos EUA relataram ao Congresso do país que a Rússia teria tentado interferir no pleito presidencial de novembro de 2020 em favor da reeleição do então presidente Donald Trump.
O ministro da Corte Alexandre de Moraes, então, pediu que a Presidência da República explique as condições da participação do vereador na comitiva presidencial, incluindo a agenda dele. A Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro também deverá informar se concedeu licença oficial ao vereador. As respostas, se já prestadas, ainda não foram reveladas.
O UOL pediu ao Itamaraty um consolidado de todos os protocolos e memorandos de entendimento que tenham sido assinados por ocasião da visita de Bolsonaro à Rússia.
"No contexto da visita do senhor presidente da República a Moscou, foi assinado o Protocolo de Emenda ao Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da Federação da Rússia sobre Proteção Mútua de Informações Classificadas, de 2008, a fim atualizar os níveis de equivalência de classificação da informação", respondeu o ministério em nota.
A pasta também citou outros entendimentos em diversos temas entre os presidentes Bolsonaro e Vladimir Putin.
Na prática, alguns dos focos de Bolsonaro foi tratar de questões militares e do reforço à importação de fertilizantes da Rússia. Os fertilizantes do país são importantes para a agricultura brasileira, mas a guerra deve atrapalhar as tratativas realizadas, ao menos num futuro próximo. O Brasil já busca alternativas aos produtos russos.
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