'Não existe homicídio eleitoral', diz Aras sobre assassinato de petista
Pressionado por congressistas que fazem oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL), o procurador-geral da República, Augusto Aras, recebeu hoje um pedido para que a investigação sobre a morte do guarda municipal Marcelo Aloizio Arruda seja deslocada da Justiça Estadual para a esfera federal. Filiado ao PT, ele foi assassinado a tiros pelo policial penal bolsonarista Jorge José da Rocha Guaranho enquanto comemorava o aniversário de 50 anos na noite de sábado (9). O PGR afirma que deve esperar que as apurações feitas pela Polícia Civil do Paraná sejam concluídas antes de tomar alguma medida.
"Precisamos obter a conclusão do inquérito para analisar se há, ou não, possibilidade técnica de fazer requerimento de federalização", afirmou Aras ao UOL. "É preciso compreender a motivação e as circunstâncias para analisar se os fatos atraem a competência da Justiça Federal. Se o crime for eleitoral, não há homicídio eleitoral. Então, excluímos imediatamente a possibilidade de acionar a Justiça Eleitoral... Ou o fato tem interesse da Justiça Estadual ou da Justiça Federal. Certamente não existe homicídio eleitoral. Não podemos antecipar situações que não podem, em tese, ser apreciadas agora. Qualquer apreciação minha seria temerária neste momento."
A declaração foi dada após reunião em que dirigentes de PT, PSB, PCdoB, PV, PSOL, Rede e Solidariedade pediram o deslocamento das apurações para a esfera federal. Ao UOL, a equipe jurídica do PT afirmou que avalia quais medidas jurídicas podem ser tomadas. O envio de casos como o que envolve Jorge Guaranho e Marcelo Arruda para a esfera federal é incomum, e eventuais representações junto à PGR não devem prosperar. Atualmente, o crime é investigado pela Polícia Civil do Paraná e acompanhado pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Estado.
PGR deve cumprir seu papel, dizem Randolfe e PT
Ao UOL, o líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que espera que Augusto Aras cumpra seu dever enquanto procurador-geral da República. "Temos tido uma escalada de fatos violentos. E temos um responsável por isso: o senhor Jair Messias Bolsonaro. Não há paralelo nem polarização quando um lado atenta contra a ordem democrática e o outro cumpre a ordem democrática. Esperando que a PGR cumpra suas atribuições constitucionais, que é de ser o fiscal da lei."
De acordo com auxiliares de Aras consultados pelo UOL, esse é um caso de competência da Justiça Estadual a ser apurado em primeira instância. "Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o PGR, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal."
Os advogados Eugênio Aragão e Cristiano Zanin, que representam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) junto a tribunais superiores, destacam que a reforma do Poder Judiciário instituiu o chamado incidente de deslocamento de competência, que abre possibilidade de transferência de casos da Justiça Estadual para a Justiça Federal nas hipóteses de graves violações aos direitos humanos. "O Estado está agindo de forma insuficiente nesse caso. No caso do Paraná, nós temos um complexo de fatos que demonstram leniência do Estado sobre violências praticadas contra opositores do governo federal", afirmou Aragão ao UOL.
Crime foi motivado por política, diz mãe de atirador
O crime ocorreu dentro da Aresf (Associação Recreativa Esportiva Segurança Física), clube em que Arruda comemorava o aniversário de 50 anos numa festa temática com símbolos do PT e imagens do ex-presidente Lula. Ao UOL, testemunhas dizem que Guaranho se deslocou ao local após um jantar com a esposa e um bebê de cerca de 3 meses.
A mãe do policial penal afirma que o filho tocou músicas de apoio ao presidente Bolsonaro enquanto fazia uma ronda de carro pelo clube. Segundo registros da Polícia Civil, Guaranho fez ainda ameaças de morte a pessoas que participavam da festa de Arruda. Do banco de trás, a mulher do bolsonarista teria pedido ao marido para que parasse com as provocações e fosse embora. Eles deixaram o local após Arruda jogar pedras no veículo de Guaranho, que reagiu apontando uma arma em direção ao guarda municipal petista.
Segundo imagens de câmeras de segurança, cerca de 20 minutos depois, o policial bolsonarista retornou sozinho à Aresf. Nesse momento, a mulher de Arruda, Pâmela Suellen Silva, se identificou como policial civil. Foi quando Guaranho começou a atirar no petista. "Se eu estivesse lá, teria tentado impedir que isso acontecesse. Mal consigo imaginar a dor da outra família. Não se discute sobre religião, futebol, e politica... Ninguém ganhou nada com essa provocação, só houve perdedores", afirmou a mãe do bolsonarista.
Estado grave: Guaranho levou 3 tiros, um no rosto
Ferido, o guarda municipal petista revidou os tiros que havia recebido do bolsonarista. Dalvalice afirmou que o filho foi atingido no rosto e nas duas pernas. De acordo com ela, o policial penal sofreu ainda um edema na cabeça provocado por chutes desferidos por homens presentes no local em que ele havia disparado contra Arruda. A Polícia Civil investiga se as agressões contribuíram para a gravidade do estado de Guaranho.
Bolsonarista já foi preso por ex-colegas da PM
O policial penal bolsonarista Jorge Guaranho precisou ser algemado e detido, em 2018, após ofender a honra de ex-colegas da Polícia Militar do Rio de Janeiro. Um processo, aberto por crime desacato, foi arquivado na Justiça do Paraná.
Documento obtido pelo UOL mostra que, em junho de 2018, um sargento e um capitão da PM registraram boletim de ocorrência na 59° Delegacia Policial do Rio de Janeiro após terem sido insultados por Guaranho durante uma abordagem. "Jorge Guaranho se aproximou dos policiais militares, identificou-se como ex-PM e atual policial federal. Em seguida, passou a ofender o capitão da PM, xingando-o de 'oficial de merda, capitão de merda', e chamou o sargento de 'praça baba-ovo e praça de merda', e mandou que os mesmos fossem embora do local", diz a peça.
A Polícia Militar do Rio de Janeiro, em que Guaranho trabalhou por cerca de dois anos antes de se tornar policial penal federal, afirmou que o ex-militar não foi alvo de processos internos dentro da corporação e que não há registros de conduta violenta por parte dele. "O referido homem fez parte da PMRJ por menos de dois anos e, aparentemente, saiu da corporação por ter passado em outro concurso público", afirmou o órgão estadual em nota.
Bolsonaro repreende Guaranho e critica esquerda
O presidente Bolsonaro se pronunciou sobre o assassinato na noite de domingo. "Independente das apurações, republico essa mensagem de 2018: Dispensamos qualquer tipo de apoio de quem pratica violência contra opositores. A esse tipo de gente, peço que por coerência mude de lado e apoie a esquerda, que acumula um histórico inegável de episódios violentos", escreveu.
Guaranho usa as redes sociais principalmente para defender o mandatário, se diz contra o aborto e drogas e afirma que armas são sinônimo de defesa. Em junho de 2021, ele aparece numa foto ao lado do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP). "Vamos fortalecer a direita", escreveu em abril deste ano.
Prisão decretada e delegada trocada
O governo do Paraná informou na manhã de ontem a saída da delegada Iane Cardoso do comando da investigação sobre o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda. Ela foi substituída pela delegada Camila Cecconello, que chefia a Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa, sediada em Curitiba (PR). A mudança ocorreu depois de a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR) dizer ter recebido relatos de que Iane Cardoso fez postagens contra o PT em 2016.
A Justiça decretou a prisão preventiva do agente penitenciário Jorge Guaranho, que matou o guarda municipal petista. A informação é do Ministério Público do Paraná. O promotor Tiago Lisboa disse, em entrevista a jornalistas, que um juiz plantonista aceitou o pedido de conversão da prisão em flagrante para prisão preventiva na noite de domingo.
O Ministério Público informou que tanto a arma de Guaranho quanto a de Arruda eram institucionais, ou seja, de uso ligado à profissão. O órgão afirmou que apura se o crime teve motivação política. Para o promotor do caso, a investigação deve ser "de fácil resolução", mas é preciso esclarecer a razão pela qual Guaranho estava no local. De acordo com o MP, o agente seria membro de uma associação na região, vizinha de onde aconteceu o caso.
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