Com feminicídio em alta, Tarcísio congela verba de violência contra mulher

Apesar do aumento de estupros e feminicídios no estado de São Paulo em 2023, este ano o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) congelou a verba de um programa para combater a violência contra as mulheres.

O que aconteceu

Tarcísio congelou os investimentos de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher em 2024. Os R$ 5 milhões do programa deveriam sair dos cofres da Secretaria de Políticas para a Mulher, mas a verba foi congelada por um decreto assinado por Tarcísio em 18 de janeiro.

Dinheiro foi congelado apesar do aumento de estupros e feminicídios em 2023. Ao todo, 221 mulheres foram assassinadas no estado, contra 195 em 2022. Já os boletins de ocorrências relatando estupros chegaram a 14.504, ante 13.240 no ano anterior.

O governador também congelou um programa criado para dar independência às mulheres. Estão contingenciados os R$ 5 milhões para a Secretaria da Mulher tirar do papel o programa de Parcerias para Empreendedorismo e Autonomia Financeira da Mulher.

Segurança da mulher terá dinheiro, diz a pasta. Em nota, a secretaria diz que "os recursos para a elaboração e execução das políticas públicas voltadas à segurança, a saúde e ao desenvolvimento das mulheres serão viabilizados pela atual gestão". A secretaria afirma que R$ 429 milhões estão previstos para "proteção e segurança das mulheres".

2º menor orçamento

O orçamento da Secretaria da Mulher, de R$ 20,4 milhões, é o segundo menor do governo. Só perde para a Secretaria de Negócios Internacionais, com R$ 3,8 milhões.

Além de baixo, metade do orçamento da Secretaria da Mulher é para mantê-la funcionando. Ao todo, R$ 10,4 milhões foram reservados para gastos administrativos, que tiveram apenas R$ 511,8 mil contingenciados. Os outros R$ 10 milhões —agora congelados— eram destinados aos dois únicos programas da pasta com alguma verba.

Os outros dois programas da secretaria somam R$ 20 para investimentos. Tanto a Gestão de Parcerias para Promoção da Saúde da Mulher quanto a Gestão de Parceiras para Atenção à Saúde da Mulher Gestante têm orçamento previsto de R$ 10 cada.

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Programa tem apenas R$ 10 previstos para 2024
Programa tem apenas R$ 10 previstos para 2024 Imagem: Reprodução/Secretaria da Fazenda do Governo do Estado

Criada por Tarcísio no ano passado, a pasta nasceu sem verba própria, como mostrou o UOL. Os R$ 20,4 milhões deste ano equivalem a 0,005% das despesas do governo previstas para o ano, estimadas em R$ 346 bilhões.

Sem dinheiro do governo, a secretária Sonaira Fernandes —da cota bolsonarista— só poderá usar a verba de emenda parlamentar. Ao todo, os deputados estaduais destinaram R$ 3,8 milhões em emendas para que a Secretaria da Mulher investisse em programas para esse público em 2024.

"Mas o governo não acatou outras emendas", diz a deputada estadual Andréa Werner (PSB), que cobra mais orçamento para a Secretaria da Mulher. "Indiquei 33 emendas. Não passou nenhuma", afirma.

Ao todo, Tarcísio congelou R$ 13,6 bilhões do orçamento de 2024. O valor corresponde a 4% de toda a verba, o maior desde 2011. Esse percentual, no entanto, chegou a 51% na Secretaria da Mulher.

Sonaira Fernandes na vigília antiaborto
Sonaira Fernandes na vigília antiaborto Imagem: Reprodução/Instagram
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Embora a secretaria tenha ficado sem dinheiro para investir, todas as pastas foram contingenciadas. Educação está com R$ 265 milhões congelados, 0,8% dos R$ 31,5 bilhões de seu orçamento. Saúde não pode mexer em 3% (R$ 781 milhões) de seu orçamento de R$ 26 bilhões. Segurança está com R$ 289 milhões congelados —1,5% de sua verba para o ano, de R$ 18,3 bilhões.

Com orçamento seis vezes maior que o da Mulher, a Secretaria de Comunicação teve 9,6% de sua verba contingenciada. Dos R$ 146,9 milhões, R$ 14,1 milhões não podem ser mexidos.

"O que fica é uma Secretaria da Mulher figurativa", diz a deputada Andréa Werner. A parlamentar já considerava "quase nada" os R$ 5 milhões para combater violência contra a mulher e os R$ 5 milhões para o empreendedorismo feminino.

Secretaria diz que sua atuação não precisa de verba. "É uma pasta articuladora de políticas públicas, com atuação transversal no governo e que tem a missão de identificar necessidades e articular soluções com as demais Secretarias e órgãos do Estado", diz em nota.

A advogada Marina Muniz, especialista em direito público e direitos humanos, defende protagonismo à secretaria. "As decisões relacionadas ao orçamento são também políticas, e a pasta não parece ser uma prioridade da gestão estadual", diz a advogada, que analisou o orçamento da secretaria a pedido do UOL.

É importante que a secretaria conte com o orçamento necessário para a sua atuação, sob pena de esvaziamento da sua própria razão de ser.
Marina Muniz, advogada

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"Sem orçamento, a pasta fica dependente da boa vontade do governo e de outras secretarias", diz Marina Ganzarolli, advogada e presidente do Me Too Brasil, organização nascida nos EUA para dar visibilidade a mulheres vítimas de violência. "Se a pasta não tem a mesma força que outras, não vai conseguir fazer muita coisa, porque o orçamento não é dela e as ações são de responsabilidade de outras pastas."

A baixa influência da pasta já tem consequências. Mesmo com R$ 24 milhões para implantar Delegacias da Mulher 24h em 2023, o governo estadual empenhou apenas R$ 675,5 mil ao longo do ano passado, segundo levantamento do gabinete do deputado estadual Paulo Fiorilo, líder do PT na Assembleia Legislativa.

A secretaria diz que ajuda em campanhas educativas e que as paulistas têm à disposição 140 Delegacias de Defesa da Mulher.

Sobre o contingenciamento, a pasta lembra que "não se trata de corte". "Mas sim planejamento orçamentário prestigiando-se despesas obrigatórias".

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