Sem citar Bolsonaro, defesa de indiciados diz: 'Todo mundo tem um chefe'
A defesa de dois assessores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) indiciados por tentativa de golpe de Estado vai se concentrar em apresentá-los como personagens secundários na trama golpista desvendada pela PF.
O que aconteceu
Defesa de Marcelo Costa Câmara e Tércio Arnaud Tomaz quer mostrar que eles "não tiveram poder decisório na trama". Segundo o advogado Luiz Eduardo Kuntz, que representa os ex-assessores de Bolsonaro na Justiça, a ideia é afastar o que ele chama de "cortina de fumaça" e colocá-los como secundários no plano do golpe de 2022, investigado pela Polícia Federal.
Câmara é citado nos relatórios da Polícia Federal como integrante do núcleo de inteligência paralela. Segundo a PF, ele monitorou o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes e passava as informações sobre ele para o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid.
Arnaud é mencionado nos relatórios da PF como membro do núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral. Ex-assessor de Bolsonaro, ele também é considerado um dos pilares do chamado "gabinete do ódio". Segundo a PF, ele foi o responsável por espalhar o conteúdo editado da live realizada pelo argentino Fernando Cerimedo contra as urnas eletrônicas.
"Todo mundo tem um chefe", afirma defesa de ex-assessores, sem citar ex-presidente Bolsonaro. Kuntz disse que não iria comentar a suposta atuação de outros indiciados pela Polícia Federal. "Não sou defensor, nem acusador", afirma. O advogado diz que as investigações são uma "tentativa de atingir Bolsonaro independentemente do custo de atingir todo o entorno", disse.
A investigação da PF coloca Bolsonaro no centro da articulação do golpe. Segundo o inquérito, ele "planejou, atuou e teve o domínio de forma direta e efetiva" do plano de golpe de Estado em várias frentes. O documento também afirma que o ex-presidente tinha conhecimento do plano para assassinar o presidente Lula, o vice Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
"Coadjuvantes de um roteiro", diz advogado. Kuntz diz que o relatório da Polícia Federal é "mais do mesmo", mas admite que o documento é "bem elaborado". "Não tem novidades quanto ao Câmara e ao Tércio, a não ser uma tentativa de colocá-los a todo custo como se fossem importantes para um problema principal."
Não foram autores dos fatos, alega defesa. Kuntz nega que os dois ex-assessores tenham envolvimento no plano de golpe e afirma que a defesa irá se basear em negar a autoria dos fatos e na "atipicidade das condutas", ou seja, na inexistência de um fato e, consequentemente, na inexistência de um crime.
Expectativa é que procurador-geral da República, Paulo Gonet, "afaste a possibilidade de eles serem denunciados". "É um enorme equívoco que pretendemos que seja reconhecido. A participação dele [Marcelo Câmara] é digna de uma pessoa que não merece ser denunciada. Eles não têm envolvimento", diz Kuntz.
Conteúdo falso produzido pelo núcleo de desinformação. O material divulgado por Fernando Cerimedo e que, segundo a PF, foi editado por Arnaud, alegava que as urnas fabricadas antes de 2020 "geraram uma anomalia a favor do candidato de número 13 [em referência ao presidente Lula". De acordo com o relatório da PF, Arnaud e Cerimedo integravam o núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral.
Defesa de Arnaud afirma que ex-assessor "encaminhava o que era de ordem pública e que estavam na imprensa". Segundo Kuntz, Tércio "não foi editor, nem roteirista" do conteúdo. O advogado afirma que o material chegou ao conhecimento dele e ele "repassou o conteúdo público na internet". O advogado diz ainda que estava entre as atribuições de Arnaud fazer uma pesquisa na internet sobre o assunto. "Tudo o que tivesse de bom ou ruim ele teria que informar."
Advogado diz que "autor do conteúdo tem que ser punido". Na versão da defesa, Arnaud "retransmitiu algo que foi encontrado na internet, sem participação ou interferência no conteúdo".
Câmara e o monitoramento de Moraes
Defesa alega que o monitoramento de Câmara sobre Moraes era, na verdade, um "ajuste de agenda". Na versão de Kuntz, o objetivo de Câmara era promover uma reunião entre o ministro Alexandre de Moraes e o ex-presidente Bolsonaro. Uma espécie de despedida do ex-presidente e do ministro. "Uma reunião informal e para o ministro era importante que fosse sigilosa", diz.
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Quero receberRelatório da PF tem 87 citações com o nome de Câmara. Segundo as investigações, ele esteve presente em reuniões com Cid e o também ex-assessor de Bolsonaro, Filipe Martins, além do general da reserva Mário Fernandes, para discutir a minuta do decreto golpista.
PF afirma que Câmara tinha acesso a informações privilegiadas sobre a agenda de Moraes. Ele teria dados sobre voos, itinerários e a localização da casa do ministro em São Paulo. Uma das mensagens dele a Cid diz: "Viajou para São Paulo hoje (16/12), retorna na manhã de segunda-feira (19/12) e viaja novamente pra SP no mesmo dia. Por enquanto só retorna a Brasília para posse do ladrão. Qualquer mudança que saiba lhe informo".
Câmara repassou informações sobre a rota que Moraes utilizaria para a diplomação de Lula. Segundo a PF, os dados coletados indicam um monitoramento dos trajetos do ministro em tempo real. Na versão da defesa de Câmara, tratava-se de um "monitoramento informal". O ex-assessor, segundo o advogado, "ligava em algum gabinete do ministro no STF ou TSE" para ter informações da agenda dele.
Monitoramento ocorreu durante uma ou duas semanas, segundo a defesa. "Ele falava com qualquer funcionário que estivesse na função e dizia que o pessoal estava ficando desconfiado", diz Kuntz. Em relação ao monitoramento das rotas, citado no relatório da PF, a defesa afirma que "o foco era saber quando o ministro estaria em Brasília para saber quando seria realizado o encontro com Bolsonaro".
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