Reabertura de SP: cientistas criticam peso maior ao critério leitos de UTI
Resumo da notícia
- Um grupo de cientistas criticou a decisão do governo do estado de flexibilizar a quarentena na cidade de São Paulo
- Segundo nota técnica do grupo, a decisão priorizou as vagas em UTI disponíveis na capital
- Porém, o critério deveria considerar igualmente a evolução da epidemia, que ainda cresce na cidade, dizem os especialistas
- Governo do estado diz que tomou decisão apoiado pelo centro de contingência; prefeitura diz que leitos de UTI aumentaram na capital
Um grupo de cientistas alerta que a cidade de São Paulo pode jogar fora em 20 dias os esforços de dois meses e meio de quarentena, se reabrir o comércio e os serviços da cidade.
Na avaliação feita pelo governo estadual para definir o Plano São Paulo — de flexibilização da quarentena, conforme um critério de classificação de risco para cada região de saúde do estado — a capital foi separada da região metropolitana e autorizada a iniciar a retomada das atividades. O critério que mais pesou para as autoridades foi a taxa de ocupação de leitos de UTI entre 61% e 70%. Ontem (7), a taxa na cidade de São Paulo foi de 67%, de acordo com a prefeitura.
Os cientistas concordam com os dois indicadores escolhidos para definir a posição de cada região do estado no Plano São Paulo: a capacidade do sistema de saúde e a evolução da pandemia no local. Entretanto, questionam o fato de esses fatores serem analisados isoladamente.
Essa opinião foi publicada em nota técnica assinada pelos membros das plataformas Covid-19 Brasil e Ação Covid-19, que reúnem pesquisadores de várias universidades, e elaborada em conjunto com especialistas do Laboratório de Saúde Coletiva da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e da Faculdade de Medicina da USP.
Eles reprovam a decisão do governo João Doria (PSDB), que permitiu, por exemplo, que a capital paulista conseguisse peso 3 no indicador taxa de ocupação de leitos UTI e fosse para a faixa laranja. Dessa forma, a cidade reabriu concessionárias de veículos e escritórios, apesar de as mortes e internações continuarem subindo. Também pode reabrir shopping centers, o que ainda não ocorreu, apesar da pressão do setor.
O mesmo critério permitiu que cidades como Botucatu e Araraquara, com mais casos de covid-19 por 100 mil habitantes do que a capital, fossem classificadas na zona amarela, a segunda fase da flexibilização da quarentena, que permite abrir até bares e restaurantes, com algumas restrições.
Professor da Faculdade de Medicina da USP Ribeirão Preto e especialista em elaboração de modelos matemáticos, Domingos Alves afirma que a possibilidade de dar mais importância a um critério foi definida para "privilegiar o comércio, e não a saúde da população". Ele diz que os indicadores deveriam estar juntos e com o mesmo peso.
"Não há uma política para controlar a epidemia no Brasil hoje. Não há, não houve e agora a política tem sido um plano de sacrifício da população, desde 1º de junho. Antes era enxugar gelo, só olhando as consequências da epidemia, agora partimos para o sacrifício", lamentou.
OMS recomenda queda constante dos casos
Segundo Alves, a OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda cautela para a flexibilização de medidas de isolamento social.
O professor explica que são necessárias a melhoria da capacidade do sistema de saúde e a diminuição de novos diagnósticos e mortes, de maneira sustentável, por períodos de duas a três semanas consecutivas — especialmente no caso brasileiro, em que não há testagem em massa da população. Segundo a OMS, "não se pode falar em relaxamento se um desses parâmetros não estiver bom", diz.
E em São Paulo, alerta a nota técnica, o crescimento de óbitos e mortes continua, apesar de menos acelerado que em outras regiões do país.
Reabertura pode fazer São Paulo perder o que ganhou
O documento reuniu estudo feito pela plataforma Ação Covid-19, da UFABC (Universidade Federal do ABC), que aponta que poderá ser desastrosa a abertura do comércio em São Paulo.
Caso as taxas de isolamento social caiam para 20%, a curva de contaminação deverá crescer por 20 dias consecutivos e a velocidade da pandemia retornar, em pouco tempo, ao quadro que havia no início da quarentena.
"Em dez dias, os casos poderão crescer 150% onde houver reabertura", alerta o professor de Medicina da USP.
Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico do Estado, desde o anúncio do Plano São Paulo o índice de isolamento social esteve abaixo dos 50% na capital nos dias úteis, com exceção de terça-feira (2). Já a empresa de monitoramento Inloco aponta que, no estado de São Paulo, foi de 48,5% ontem (7).
A preocupação é que ocorra em São Paulo, numa escala muito maior, o mesmo que aconteceu em Blumenau em abril, com a reabertura do comércio de rua e dos shopping centers. Em três semanas, a cidade teve um crescimento de 244% nos casos de covid-19.
Estado diz agir orientado por cientistas
Segundo o governo Doria, "o Plano São Paulo é multifatorial e leva em conta aspectos epidemiológicos e cenários regionalizados sobre a covid-19 no estado".
O governo afirma que uma eventual mudança de faixa não é estática e que "há monitoramento contínuo e diário" dos indicadores, permitindo, inclusive, a intensificação das medidas de isolamento social, caso o Centro de Contingência do Coronavírus identifique necessidade.
De acordo com nota enviada pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico, "São Paulo foi o primeiro Estado do Brasil a criar um centro de contingência da saúde, onde todas as diretrizes do Plano São Paulo são orientadas por cientistas, professores da USP, Unicamp, Unifesp e outras instituições de referência. O Estado tem como compromisso máximo salvar vidas e seguirá tomando decisões baseadas em critérios técnicos"
Prefeitura aumentou leitos de UTI
Segundo a prefeitura de São Paulo, as normas e os horários autorizados pelo Plano São Paulo foram definidos com base em critérios científicos para preservar a saúde da população e a fiscalização municipal tem orientado e aplicado sanções aos comerciantes que descumprem as regras em vigor.
Sobre os leitos de UTI, a cidade afirma ter saído de 915 leitos de UTI em operação (e taxa de ocupação de 88%) para 1.178 leitos, chegando aos atuais 64% de leitos de UTI ocupados. "A redução é resultado direto desse esforço na ampliação dos leitos", afirma nota da Secretaria Municipal de Saúde.
De acordo com a gestão de Bruno Covas (PSDB), a taxa de ocupação das UTIs agrega os dados da rede municipal e dos leitos contratados na iniciativa privada para se obter a taxa de ocupação total da rede municipal.
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