"É evidente que era caixa dois", diz advogado de ex-deputado petista
O advogado João dos Santos Gomes Filho, que defende o ex-deputado Paulo Rocha (PT-PA) no julgamento do mensalão, disse nesta terça-feira (14) no plenário do STF (Supremo Tribunal Federal), em Brasília, que era evidente que os recursos repassados pelo diretório nacional do PT, oriundos de empréstimos intermediados por Marcos Valério, eram para a caixa dois de campanha.
Gomes Filho citou a sustentação oral de Arnaldo Malheiros Filho, que defende o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, no julgamento, apresentada no Supremo no último dia 6, para confirmar a existência de caixa dois. “Quando vejo meu professor, Arnaldo Malheiros, dizer que é evidente que isso era um caixa dois, fiquei tranquilo. Me pareceu desde o começo que isso era um caixa dois, porque é evidente!”, afirmou o advogado.
Dinheiro já chegou limpo, diz defesa de Paulo Rocha
A prática conhecida como caixa dois consiste na arrecadação de dinheiro não declarado para gastos com campanha e é considerada crime eleitoral. Além de Gomes Filho e Malheiros Filho, vários defensores de réus do mensalão, entre eles dos parlamentares ligados ao PT, PL e PP, admitiram que os recursos recebidos pelos acusados era para caixa dois. “É uma pratica recorrente no Brasil o uso de caixa dois. É muito duro falar isso”, disse Gomes Filho.
O ex-deputado Paulo Rocha é acusado de lavagem de dinheiro e de receber pelo menos R$ 820 mil do empresário Marcos Valério, apontado como operador do suposto esquema. O envolvimento no caso o levou a renunciar ao mandato de deputado em 2005, para evitar a cassação.
A polêmica sobre sua participação, no entanto, não refletiu em seu eleitorado. Em 2006, ele candidatou-se e foi eleito novamente deputado federal e, em 2010, tentou uma das duas vagas no Senado, mas ficou em terceiro lugar, com mais de um milhão de votos.
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Gomes Filho disse que Rocha, que na época presidia o diretório do PT no Pará, viajou a São Paulo e procurou Delúbio Soares em busca de recursos para saldar dívidas da campanha eleitoral de 2002. Delúbio teria dito, segundo o advogado, que iria levantar os recursos e depois repassa-los a Rocha.
Sobre a acusação de lavagem de dinheiro, o advogado afirma que seu cliente não tinha ciência da origem do dinheiro, contrariando a acusação da Procuradoria Geral da República. "O que diz a denuncia é que Paulo sabia que o dinheiro tinha origem ilícita, mas não diz como ele sabia."
Segundo a denúncia, o indício de que o acusado sabia da ilicitude é o fato de ter mandado a secretária Anita Leocádia para sacar o dinheiro. “Para qual pessoa ele daria ordem se não para a secretária?”, questionou.
Ainda de acordo com Gomes Filho, Leocádia foi até São Paulo pegar o dinheiro e prontamente transferiu, via transferência bancária, os valores para os credores da dívida da campanha de 2002. "Ela saiu com o dinheiro na mão, e a primeira conduta dela foi ir ao banco e fazer o pagamento aos credores. Se a intenção fosse efetivamente distanciar a ilicitude originária da reinserção no sistema financeiro, por que cargas d'água ela vai ao um banco e se identifica como fonte pagadora desses depósitos?", disse.
Durante vários minutos o advogado se debruçou sobre o conceito de crime antecedente. Segundo ele, para haver lavagem de dinheiro, teria que ter ocorrido um crime antecedente do qual seu cliente deveria ter conhecimento para ser culpado.
De acordo com Frederico Crissiúma de Figueiredo, professor de Processo Penal da EDB (Escola de Direito do Brasil), "o entendimento sobre o crime de lavagem ainda está se desenvolvendo, mas não basta que você receba um dinheiro de forma ilícita para que você seja acusado de lavagem". "Na época dos supostos crimes do mensalão, vigorava uma lei dizendo que só caracteriza lavagem de dinheiro quando houvesse um crime antecedente", disse.
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"A partir de uns meses atrás, qualquer crime pode ser crime antecedente. Por isso existe a tese de que a origem é de caixa dois --um crime eleitoral, mas, na época dos casos, ele não era caracterizado como crime antecedente", afirma o professor.
A nona sessão do STF destinada ao julgamento do mensalão começou por volta de 14h30 desta terça-feira (14). Na sequêncai, serão defendidos, Anita Leocádia, ex-chefe de gabinete de Paulo Rocha, os ex-deputados federais petistas Paulo Rocha (PA), Professor Luizinho (SP) e João Magno (MG), além do ex-ministro dos Transportes do primeiro mandato do governo Lula, Anderson Adauto (então no PL, atual PR).
Núcleo petista
De acordo com a Procuradoria Geral da União, Pedro Rocha recebeu o dinheiro por meio de sua assessora Anita Leocádia, que será a segunda a ser defendida nesta terça-feira. Ela também é acusada de lavagem de dinheiro, e sua defesa deverá seguir a linha de que Leocádia apenas cumpriu ordens de seu superior.
"STF analisa pela 1ª vez lavagem de dinheiro", diz advogado
A terceira defesa será a do ex-deputado Professor Luizinho, na época líder do governo na Câmara dos Deputados, é acusado de receber R$ 20 mil. A acusação que pesa sobre ele é a de lavagem de dinheiro. O ex-parlamentar afirma que o dinheiro foi recebido por seu assessor sem o seu conhecimento ou permissão e repassado para o diretório do PT, para pagar dívidas de campanhas.
Já o ex-deputado João Magno (PT-MG), quarto a ser defendido, é acusado de ter recebido cerca de R$ 350 mil do suposto esquema por meio de dois intermediários para votar seguindo a orientação do partido, em favor dos interesses do governo federal.
Ele também é acusado de lavagem de dinheiro e deverá utilizar a mesma argumentação de outros parlamentares: a de que usou o dinheiro para quitar dívidas de campanha. À época do mensalão, o parlamentar foi absolvido pelos seus pares na Câmara dos Deputados, que votaram contra a cassação de seu mandato.
Até esta segunda-feira (13), as defesas de 30 dos 38 réus do processo já haviam sido apresentadas no que promete ser o mais longo julgamento da história da Suprema Corte.
Anderson Adauto
Anderson Adauto, o último a ser defendido hoje, é acusado dos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro. De acordo com o Ministério Público, ele recebeu pelo menos R$ 900 mil a mando do então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, para pagar parlamentares para votar com o governo. Hoje, ele é prefeito de Uberaba (MG), eleito em 2008 pelo PMDB.
A defesa de Adauto deve alegar que ele recebeu R$ 410 mil por meio do então chefe-de-gabinete, José Luiz Alves, para sanar dívidas da campanha de 2002 e negar que teria dado dinheiro para parlamentares do PTB votarem com o governo.
Entenda o mensalão
O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus, incluindo membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.
O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.
O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.
*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo
O dia a dia do julgamento
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