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Revisor segue relator e vota pela condenação de Marcos Valério, ex-sócios e ex-diretor do BB

Camila Campanerut*

Do UOL, em Brasília

22/08/2012 18h24Atualizada em 22/08/2012 21h11

O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do mensalão, endossou o voto do relator Joaquim Barbosa e decidiu pela condenação do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, do publicitário Marcos Valério e de seus ex-sócios, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, em sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (22).

Lewandowski votou pela condenação do ex-diretor do banco por corrupção passiva, por dois peculatos (uso de cargo público para desvio de recursos) e lavagem de dinheiro. Já para Valério, acusado de ser o operador do mensalão, o ministro votou pela condenação por corrupção ativa e também por dois peculatos.

O revisor também votou por condenar Paz e Hollerbach por corrupção ativa e por dois peculatos, para cada um. Já o ex-secretário de comunicação do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, Luiz Gushiken, foi absolvido pelo revisor --assim como havia sido feito pelo relator e pelo procurador-geral, Roberto Gurgel.

O grupo de Marcos Valério é acusado de ter pagado R$ 326 mil a Pizzolato em troca de vantagens em contratos do Banco do Brasil com suas agências de publicidade (crimes de corrupção ativa e passiva).

A Procuradoria Geral da República acusa o grupo de ter recebido antecipações ilegais de pagamentos de publicidade, no valor total de R$ 73 milhões, por meio de autorização de Pizzolato (primeiro peculato), e de ter se apropriado ilegalmente de R$ 2,9 milhões durante a execução do contrato com o Banco do Brasil, usando o chamado "bônus de volume" (prêmio de incentivo pago por veículos de comunicação a agências de publicidade para estimular a propaganda), com anuência de Pizzolato (segundo peculato).

A verba desviada teria abastecido o "valerioduto", usado para comprar apoio de parlamentares durante a primeira gestão do ex-presidente Lula, como afirma a Procuradoria. 

HENRIQUE PIZZOLATO

Pizzolato era diretor de marketing do Banco do Brasil na época do suposto esquema, além de sindicalista e petista desde a década de 80. 

"Apesar de ter negado o recebimento de R$ 326,6 mil, afirmando que não tinha conhecimento do numerário, (...) e que havia feito apenas um 'favor' ao corréu Marcos Valério, a verdade é que a sua versão não condiz com as provas constantes nos autos", afirmou Lewandowski ao votar pela condenação de Pizzolato por corrupção passiva.

Segundo o ministro, o objetivo do pagamento ilícito de R$ 326,6 mil a Pizzolato era a autorização de antecipação do pagamento à agência DNA referente a um contrato firmado com o BB no valor de R$ 73 milhões.

O ministro citou depoimentos de Pizzolato à Justiça para mostrar inconsistências sobre a entrega de um envelope com a quantia. Segundo o réu, o envelope, que não teria sido aberto por ele, vinha do Banco Rural por meio da agência de Marcos Valério e deveria ser entregue a alguém do PT, não especificado.

Pizzolato alega "ter feito um favor a Valério", mas, para Lewandowski, o valor "tinha destino certo", o próprio réu.

Ao comentar os crimes de peculato, o ministro-revisor disse que as antecipações às empresas de Marcos Valério foram consideradas irregulares e ao menos três notas fiscais da agência foram falsificadas para justificar os valores. Já sobre o desvio de R$ 2,9 milhões, Lewandowski alegou que a agência DNA propaganda "extrapolou" o chamado bônus de volume, ao receber recursos de uma empresa não caracterizada como veículo de comunicação.

O ex-diretor também foi considerado culpado pelo crime de lavagem de dinheiro. Para Lewandowski, Pizzolato tinha a "nítida intenção de dissimular a origem do dinheiro recebido [R$ 326,6 mil]. (…) O modo pelo qual foi efetuado o saque que beneficiou Pizzolato permite que se conclua pelo delito de branqueamento de capitais”, sustentou.

Em sua defesa, apresentada no último dia 9, o advogado do réu disse que seu cliente não sabia nada a respeito do conteúdo dos envelopes, que os repasses a Valério eram legais e que a denúncia, portanto, era um "ilusionismo".

MARCOS VALÉRIO

O ministro Lewandowski levou poucos minutos para apresentar as "graves irregularidades" cometidas pelo grupo de publicitários, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, então donos das agências DNA Propaganda, Graffiti e SMP&B Comunicação. “Para cada corrupção passiva sempre tem uma corrupção ativa”, afirmou. 

“Ficou claro que Henrique Pizzolato recebeu em sua casa antecipações de pagamento a mando de Marcos Valério. Dessa maneira entendo que Marcos Valério cometeu o crime de corrupção passiva. Voto pela sua condenação”, completou em seu voto. 

Valério e os ex-sócios também são acusados de serem coautores nos dois crimes de peculato. Ao votar pela condenação de Valério, o revisor citou perícias que apontaram que mais de 80 mil notas fiscais frias foram emitidas pela agência do publicitário para encobrir serviços que não foram prestados para o Banco do Brasil.

CRISTIANO PAZ E RAMON HOLLERBACH

Sobre Paz, o ministro-revisor disse que o réu era "muito mais do que um 'singelo' cotista das agências, [Cristiano Paz] agiu na condição de sócio administrador, assumindo a gerência conjunta dos negócios, incluindo a responsabilidade fiscal e contábil, além de ter sido avalizador de empréstimos milionários junto ao Banco Rural".

Lewandowski citou depoimento de Cristiano Paz que confirmou ser sócio da DNA por meio da Graffiti Participações, que funcionava no mesmo endereço da SMP&B, outra agência de Marcos Valério.

Já sobre Hollerbach, o revisor disse que o ex-sócio "assinou diversos cheques e foi avalista de empréstimos milionários".  

Os advogados dos ex-sócios se disseram “surpresos” e “perplexos” com o voto do ministro Lewandowski. “Na realidade, recebemos o voto com perplexidade porque ele [Paz] não fazia parte da administração da agência, porque era de criação. O próprio ministro disse que talvez a verdade processual não espelhe a verdade real”, argumenta Castellar Modesto Guimarães Neto, defensor de Cristiano Paz.

O advogado Hermes Guerrero, que defende Ramon Hollerbach, faz coro ao colega: “Estou absolutamente surpreso com o voto do revisor porque há provas contundentes de que ele [Hollerbach] não participava da agência DNA”.


Voto do relator

Para o advogado criminalista e professor da Escola de Direito do Brasil Gustavo Neves Forte, que acompanhou na redação do UOL o julgamento do mensalão desta quarta-feira (22), o voto do revisor se mostra independente em relação ao do relator. “Se dizia muito que ele seria um contraponto a Joaquim Barbosa, mas ele mostrou que essa previsão não está absolutamente certa. Lewandowski mostrou que sua decisão é independente, já que ele usou argumentos diferentes ao apresentar seu voto”, avalia.  

Na sessão do mensalão realizada na segunda-feira (20), Joaquim Barbosa concluiu a apresentação da primeira parte de seu parecer. O voto, chamado de “fatiado”, segue o formato de capítulos usado na denúncia apresentada pela Procuradoria Geral da República. Cada capítulo contém blocos de crimes referentes aos 37 réus do caso.

Relator se mostrou independente em voto, diz criminalista

Lewandowski anunciou que seguiria o voto fatiado e começou seu voto acerca das condutas dos réus Henrique Pizzolato, Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, todos já condenados por Barbosa por corrupção e peculato. 

O relator pediu a condenação de Henrique Pizzolato pelos crimes de peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O ministro também votou pela condenação de Valério, Paz e Hollerbach pelos crimes de peculato e corrupção ativa.

Dias antes, o relator votou pela condenação do deputado federal e candidato à Prefeitura de Osasco (SP) João Paulo Cunha (PT) pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Barbosa também votou novamente pela condenação de Valério e seus ex-sócios pelos crimes de corrupção ativa e peculato. Esta parte do processo será alvo de análise do revisor na sessão desta quinta-feira (23).

Com o voto "fatiado" –que já foi adotado em outros julgamentos, portanto, não é inédito–, depois que Barbosa der seu voto para determinadas pessoas e grupos, votará o revisor e, em seguida, cada um dos ministros, até esgotar o capítulo.

Depois de Lewandowski, os votos serão lidos de acordo com a ordem crescente da entrada dos ministros na Suprema Corte, da seguinte forma: Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Carlos Ayres Britto –que, como presidente do STF, é sempre o último a votar.

Os ministros não têm limite de tempo para falar, sendo assim, não há previsão para o fim do julgamento, que é o maior da história do Supremo.

Uma das principais dúvidas é se o ministro Cezar Peluso, que se aposenta compulsoriamente no dia 3 de setembro, ao completar 70 anos, vai conseguir apresentar seu voto integral sobre todos os réus.

Entenda o dia a dia do julgamento

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus --um deles, contudo, foi excluído do julgamento no STF, o que fez o número cair para 37-- e entre eles há membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, são acusados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal vai analisar acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

*Colaboraram Fernanda Calgaro, em Brasília, e Guilherme Balza, em São Paulo