Por que a PM de SP reprimiu atos do MPL e permitiu contra Dilma e Lula?
Um trecho de 500 metros no meio da avenida Paulista, na região central de São Paulo, está interditado há mais de 24 horas por manifestantes que protestam contra o governo Dilma Rousseff (PT) e a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como ministro-chefe da Casa Civil.
A via está obstruída nos dois sentidos desde as 18h30 de quarta-feira (16). Desde então, policiais militares observam o ato e chegaram até a bloquear o trânsito na altura das ruas Peixoto Gomide e Pamplona no início da tarde desta quinta (17). Quem integra o ato diz pretender sair apenas quando a presidente renunciar.
A atuação da PM nessa manifestação difere, por exemplo, dos protestos ocorridos no mesmo local no início deste ano, liderados pelo MPL (Movimento Passe Livre), contra o aumento das tarifas de transporte na capital paulista, e no fim do ano passado, de estudantes da rede pública estadual.
Em um ato do MPL há pouco mais de dois meses, sob a justificativa de que "o direito à manifestação não pode impedir o direito de ir e vir da população", a corporação bloqueou a avenida e revistou manifestantes antes do início do protesto, dispersando os ativistas com bombas de efeito moral e spray de pimenta.
No início da tarde desta quinta, quando o protesto já durava aproximadamente 18 horas, o secretário estadual de Segurança Pública, Alexandre de Moraes, foi ao local e falou com a imprensa sobre a atuação da PM. Ele negou diferenças no tratamento dessa manifestação e citou o protocolo da corporação.
Segundo Moraes, "todas as manifestações devem ser previamente comunicadas", o que não aconteceu na noite de quarta. "Se não for, o protocolo da secretaria é o mesmo do que aconteceu hoje [quinta] pela manhã: verificando-se que as pessoas não saíram voluntariamente, [a orientação é] cercar a área, até para preservar a segurança das pessoas e dos demais", argumentou.
Em nota enviada ao UOL, na noite de quinta, o secretário afirmou que "os princípios que norteiam as atividades das forças de segurança de São Paulo" são os mesmos para todos os protestos e os listou: "assegurar a liberdade de manifestação, de todos os pensamentos, em um ambiente de paz e de segurança".
O secretário prosseguiu com as explicações, dizendo ter recebido um ofício de que, a partir das 13h, haveria um ato convocado pelo Movimento Brasil Livre, e que os representantes do grupo foram avisados de que deveriam se retirar até o final da tarde, o que também não ocorreu. A justificativa, segundo ele, seria o ato marcado para esta sexta (18), no mesmo local, por defensores do governo Dilma.
Moraes afirmou ainda que policiais da Tropa de Choque foram ao local pela manhã, "para que houvesse a possibilidade de desobstruir as vias", após negociação. O grupamento se retirou da avenida Paulista depois de ser aplaudido por manifestantes.
Quando foi questionado por uma jornalista se a polícia havia perdido o controle da manifestação, que durante a madrugada contou com cerca de 50 pessoas, o secretário negou e disse que o ato era "absolutamente pacífico". Nesse momento, cercado por manifestantes, ele foi hostilizado e teve que deixar o local sob escolta policial, aos gritos de "fascista", "oportunista" e acusações de que a PM "bate em pobre".
Na tarde desta quinta, a reportagem solicitou entrevista com o comandante da Polícia Militar de São Paulo, coronel Ricardo Gambaroni, e questionou a corporação sobre a diferença de tratamento entre os protestos. Até o encerramento desta reportagem, não houve nenhuma resposta.
Também à tarde, um rapaz vestido com uma camiseta vermelha foi hostilizado ao passar pelo trecho ocupado na avenida Paulista. Na noite de quarta, um casal foi agredido por manifestantes. Ninguém foi detido em nenhum dos casos.
Manifestantes ouvidos pela reportagem nesta quinta destacaram que não houve nenhum tipo de hostilidade por parte dos policiais e afirmaram que a PM "estava do nosso lado". Alguns dos participantes do ato disseram reconhecer que essa atuação "pode ter a ver com motivações políticas".
"Repressão seletiva"
Observando o ato na tarde desta quinta, o estudante de relações internacionais da USP (Universidade de São Paulo) Victor Veloso classificou como "estranha" a atuação dos policiais. "Quinta-feira, duas horas da tarde, e a PM está aceitando que interditem a Paulista numa boa. Semanas atrás, a gente estava na [avenida na altura da rua da] Consolação para protestar contra o aumento das tarifas e levamos borrachada. Eu fico questionando até que ponto a PM não está seguindo ordens de cunho político", que disse não ser petista e ter votado nulo nas duas últimas eleições presidenciais.
"Em junho de 2013, eu estava aqui protestando tão pacificamente quanto neste ato e levei uma borrachada na panturrilha que me deixou sem conseguir caminhar direito durante uns cinco dias", lembrou Victor. "Parece que existe uma repressão seletiva, porque o que a polícia falou na época foi que nós estávamos obstruindo o trânsito. Se fosse um movimento de esquerda, já tinha a Tropa de Choque querendo bater na gente", completou.
Para Pablo Ortellado, professor de gestão de políticas públicas da USP que realiza estudos sobre manifestações populares na capital paulista, a Secretaria de Segurança Pública precisa explicar se os manifestantes notificaram a polícia com antecedência e informaram o trajeto. "Se o protocolo utilizado para o MPL não está sendo seguido com os manifestantes pró-impeachment, então o governo do estado está fazendo uso político da polícia", escreveu, no seu perfil no Facebook.
Em janeiro, após repressão da PM a ato do MPL, o governo estadual afirmou em nota enviada ao UOL que "a Polícia existe exatamente para garantir que as pessoas possam protestar de forma segura e pacífica, informando e seguindo o trajeto preestabelecido, sem vandalismo e sem violência, como funciona em todos os países civilizados do mundo".
Nota da SSP
A Secretaria da Segurança Pública enviou na noite de quinta-feira (17) nota ao UOL em que afirma:
"O secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, recebeu hoje representantes da CUT, da Central de Movimentos Populares, da Central dos Trabalhadores do Brasil, da UNE, juntamente com o presidente estadual do PT, Emídio de Souza e do deputado estadual José Zico Prado (PT), que reiteraram a solicitação realizada na 3º feira, para a ocupação da Avenida Paulista para o exercício do livre direito de manifestação e expressão de suas ideias. O secretário da Segurança repetiu a todos eles os princípios que norteiam as atividades das forças de segurança de São Paulo, dentre os quais o de assegurar a liberdade de manifestação, de todos os pensamentos, em um ambiente de paz e de segurança. A secretaria de segurança reconhece o direito à livre manifestação das entidades com as quais reuniu-se hoje, tendo planejado o mesmo esquema de segurança realizado para as manifestações do último Domingo, de maneira a garantir a tranquilidade dos manifestantes. O efetivo policial será o mesmo da manifestação do dia 13, ainda que, segundo os organizadores, estejam sendo esperadas entre 100 e 200 mil pessoas.
No entanto, como foi explanado, fatos recentes exigem de todos nós, mais do que nunca, bom senso e serenidade. A prioridade máxima da Polícia será garantir a paz e a segurança de todos. Se for necessário, adaptando-se a novas circunstâncias para evitar confrontos."
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