Senado

Ministros, empresários e lobistas: o que disseram os interrogados pela CPI da Covid

Por Luciana Amaral e Hanrrikson de Andrade

Quem passou pela CPI?

Nos últimos seis meses, ao menos 60 pessoas prestaram depoimento à CPI da Covid, no Senado. Entre testemunhas e investigados que estiveram no colegiado estão ministros de Jair Bolsonaro, membros do alto escalão do Ministério da Saúde, empresários, lobistas e até um motoboy.
Adriano Machado / Reuters

Quatro ministros

O Brasil já teve quatro ministros da Saúde durante a pandemia. Todos falaram à CPI. O general Eduardo Pazuello (demitido em março de 2021) chegou a adiar o depoimento, mas não conseguiu escapar.
Jefferson Rudy/Agência Senado

Várias vezes, no ministério, o filho do presidente, que é vereador no Rio [Carlos Bolsonaro, filiado ao Republicanos], estava sentado atrás, tomando notas. Eles tinham constantemente reuniões com esses grupos dentro da Presidência

Luiz Henrique Mandetta,
ex-ministro da Saúde que foi o primeiro a citar na CPI o "gabinete paralelo"
Jefferson Rudy/Agência Senado
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Jefferson Rudy/Agência Senado

O pedido [de demissão] foi pelo desejo de ampliação do uso da cloroquina. Quero colocar que era pontual, mas refletia uma falta de autonomia

Nelson Teich,
ex-ministro da Saúde que afirmou ter deixado o cargo por divergências com Bolsonaro sobre cloroquina
Jefferson Rudy/Agência Senado
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Edilson Rodrigues/Agência Senado

Acredito que a relação com o presidente poderia ser maior ainda, mas os cargos e agendas são complicados. Eu o via uma vez por semana ou a cada duas semanas. Se pudesse voltar atrás, teria ido mais vezes conversar com ele

Eduardo Pazuello,
ex-ministro da Saúde em depoimento que durou dois dias inteiros
Sergio Lima/AFP

As imagens [de Bolsonaro em aglomerações] falam por si só, eu estou aqui como ministro da Saúde para ajudar o meu país e não vou fazer juízo de valor sobre o presidente

Marcelo Queiroga,
ministro da Saúde, que evitou fazer críticas ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido)
Jefferson Rudy/Agência Senado

Antonio Barra Torres

Assim como Mandetta, o diretor-presidente da Anvisa narrou uma sugestão de mudança na bula da cloroquina que teria sido apresentada numa reunião no Palácio do Planalto. A alteração teria sido sugerida a Bolsonaro por membros do chamado "gabinete paralelo".
Reuters

O que eu posso confirmar é que depois de feitas estas ofertas [de vacinas], com data de 12 de setembro, nosso CEO [Albert Bourla] mandou uma comunicação para o governo do Brasil indicando nosso interesse em chegar a um acordo

Carlos Murillo,
dirigente da Pfizer na América Latina que disse que a farmacêutica foi ignorada pelo governo brasileiro
Edilson Rodrigues/Agência Senado
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Edilson Rodrigues/Agência Senado

Minha responsabilidade como ministro entendo como nenhuma. Nada que eu tenha feito pode ser caracterizado por ter levado a qualquer percalço no recebimento de insumo [para vacinas]

Ernesto Araújo,
ex-ministro do Itamaraty, que disse à CPI que não se considerava responsável pelos entraves na importação de insumos da China para fabricação de vacinas
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Wilson Witzel

Em audiência conturbada, o ex-governador do RJ Wilson Witzel trocou farpas com senadores da base governista, autodenominou-se "perseguido político" e pediu para ser ouvido em audiência secreta sobre a gestão de hospitais federais do Rio. A oitiva acabou não sendo realizada.
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Irmãos Miranda

O deputado Luis Miranda (DEM-DF) e o irmão, Luis Ricardo Miranda (servidor do Ministério da Saúde), foram responsáveis por revelar suspeitas na negociação de compra da Covaxin, vacina produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech, com intermediação da empresa brasileira Precisa Medicamentos.
Jefferson Rudy/Agência Senado

Ele [Bolsonaro] nos recebeu num sábado (20 de março), porque aleguei que era urgente, olhou nos meus olhos e disse: 'Isso é grave'

Luis Miranda (DEM-DF),
deputado, sobre o encontro com Bolsonaro; segundo ele, o presidente disse que repassaria as suspeitas à PF
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Meu partido é o SUS. Minha função é trabalhar para que os insumos e vacinas cheguem de maneira mais rápida possível aos braços dos brasileiros

Luis Ricardo Miranda,
servidor da área técnica do Ministério da Saúde, que negou ter agido por motivação política
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Luiz Paulo Dominghetti

Policial militar em Minas Gerais e vendedor de vacinas nas horas vagas, Luiz Paulo Dominghetti foi o responsável por denunciar, inicialmente em entrevista à Folha, suposto pedido de propina que teria sido feito por Roberto Ferreira Dias, ex-diretor de logística do Ministério da Saúde.
Cláudio Marques/Futura Press/Estadão Conteúdo

[Roberto Dias] sempre pôs o entrave no sentido de que, se não se majorasse a vacina [para garantir a propina de US$ 1 por dose], não teria aquisição por parte do ministério

Luiz Paulo Dominghetti Pereira,
que reafirmou na CPI as acusações contra Dias
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Roberto Ferreira Dias

O ex-diretor de logística do Ministério da Saúde confirmou ter encontrado Dominghetti em um jantar em Brasília, em 25 de fevereiro de 2021, mas negou ter pedido propina. Ele chamou o policial de "picareta". O relato, no entanto, não convenceu os senadores. Ao fim da audiência, o depoente chegou a ser preso, sendo solto no mesmo dia.
Marcos Oliveira/Agência Senado

Muitos aqui já foram vítimas de linchamento moral. Diante deste fato, do fato de todos os convocados por vocês terem negado qualquer ligação comigo. Espero que esse mal-entendido que eu teria participado dessa intermediação com a Covaxin fique esclarecido de uma vez por todas

Ricardo Barros (PP-PR),
deputado e líder do governo na Câmara, que negou suspeitas de ter orquestrado esquema para a compra da Covaxin
Agência Senado

Francisco Maximiano

O dono da Precisa Medicamentos,envolvida nas denúncias do caso Covaxin, conseguiu adiar o depoimento por quatro vezes e, quando compareceu à CPI, apoiado por habeas corpus, não respondeu à maioria dos questionamentos. Ele disse conhecer Ricardo Barros, mas negou ter pedido favorecimento. E culpou outra empresa por erros, a Envixia. Senadores disseram que Maximiano mentiu.
Jefferson Rudy/Agência Senado
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Pedro França/Agência Senado

Roberto Pereira Ramos Jr

O diretor do FIB Bank Garantias S.A, empresa que apresentou carta de fiança na negociação da Covaxin, surpreendeu ao revelar que o capital social da empresa é de R$ 7,5 bilhões, embora tenha alegado que a estrutura da companhia seja "pequena". O montante e a propriedade da empresa que, apesar do nome, não é um banco, levantaram suspeitas na CPI. Há desconfianças da existência de um "sócio oculto" que seria amigo de Barros.
Edilson Rodrigues/Agência Senado

Seu depoimento, senhor Roberto, é algo absolutamente surreal, e a história da sua empresa é algo que remete ao realismo mágico, sem qualquer lastro de verossimilhança, de algo minimamente factível

Marcos Rogério (DEM-RO),
senador governista que se irritou com as declarações dadas por Ramos Jr no depoimento
Leopoldo Silva/Agência Senado

Pedro Benedito Batista Junior

O diretor da Prevent Senior negou que a operadora de saúde tenha ocultado mortes decorrentes da pandemia e acusou ex-funcionários de fraude, mas reconheceu que a empresa fez mudanças em prontuários. Segundo ele, houve alterações em fichas de pacientes que deram entrada com covid, após 14 ou 21 dias. Dessa forma, o código da doença acabava não aparecendo mais no prontuário.
Edilson Rodrigues/Agência Senado
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Edilson Rodrigues/Agência Senado

O senhor realmente não tem condição de ser médico com a desonestidade que eu vi agora. Sinceramente, modificar o código de uma doença é um crime. Infelizmente, o Conselho Federal de Medicina não pune o senhor

Otto Alencar (PSD-BA),
senador e médico que enxergou tentativa de manipulação e subnotificação de casos e mortes pela Prevent Senior
Jefferson Rudy/Agência Senado

Wagner Rosário

O depoimento do ministro da CGU (Controladoria-Geral da União) foi marcado por irritação e bate-boca. Rosário, que passou à condição de investigado pela CPI, rejeitou a acusação de que cometeu crime de prevaricação em relação à Precisa e de que houve superfaturamento na negociação da Covaxin. O ministro foi chamado de "petulante pra caralho" e acusado de machismo contra a senadora Simone Tebet (MDB-MS).
Roque de Sá/Agência Senado

Bruna Morato

Advogada de 12 médicos que fizeram denúncias contra a Prevent, ela afirmou que a operadora implementou uma política interna de "coerção" e que os profissionais de saúde receitaram o chamado "kit covid" por medo de retaliação. Disse também que a Prevent e integrantes do chamado gabinete paralelo fizeram um pacto pró-hidroxicloroquina para evitar medidas de restrição social. A empresa nega.
Roque de Sá/Agência Senado

Ex-médico e paciente da Prevent Senior

O médico Walter Correa de Souza Neto, ex-funcionário da Prevent, e o advogado Tadeu Frederico Andrade, cliente da operadora, reafirmaram à CPI suspeitas contra a empresa. como a pressão pelo uso do kit covid, formado por medicamentos ineficazes contra a covid.
Pedro França/Agência Senado

Eu internava pacientes que haviam tomado o kit, acompanhava esses pacientes depois pelo prontuário durante a internação e via esses pacientes internarem, irem a óbito

Walter Correa de Souza Neto,
médico e ex-funcionário da Prevent Senior que reafirmou denúncias de que a empresa estimulou o uso do kit covid
Pedro França/Agência Senado

Minha família não concorda com o início dos cuidados paliativos, se insurge, ameaça ir à Justiça para impedir que eu saia da UTI e ameaça procurar a mídia. Nesse momento, a Prevent recua e cancela o início do tratamento paliativo, ou seja, em poucos dias, eu estaria vindo a óbito e hoje eu estou aqui

Tadeu Frederico Andrade,
ex-paciente com covid da Prevent Senior
Edilson Rodrigues/Agência Senado
Publicado em 14 de outubro de 2021.
Editado por Vanessa Alves Baptista