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Blocos tradicionais do Rio ainda estão sem autorização e ameaçam não sair

O desfile do Carmelitas no ano passado - 9.fev.2018 - Marcelo de Jesus/UOL
O desfile do Carmelitas no ano passado Imagem: 9.fev.2018 - Marcelo de Jesus/UOL

Michel Alecrim

Colaboração para o UOL, no Rio

28/02/2019 12h25

Carmelitas, Orquestra Voadora, Simpatia É Quase Amor, Céu na Terra, Suvaco de Cristo e Barbas, entre outros, enfrentam dificuldades de última hora. Às vésperas do início do Carnaval carioca, um impasse entre as agremiações e os órgãos públicos coloca em dúvida a realização de vários cortejos tradicionais.

"Já gastamos R$ 20 mil com a organização do desfile e se não ocorrer o prejuízo será muito maior. Precisamos resolver isso hoje até as 16h para confirmarmos o patrocínio", explica Alvanísio Damasceno, presidente do Bloco das Carmelitas.

Segundo ele, a Riotur teria concordado ontem em liberar o desfile com a disponibilização de ambulâncias cedidas pelo próprio município, mas não entregou a documentação delas para que o Corpo de Bombeiros dê a autorização.

Riotur anuncia novidades para o Carnaval

bandrio

Entenda o caso

A confusão foi instaurada desde a publicação da Portaria 229, de 2 de janeiro deste ano, publicada no dia seguinte no Diário Oficial, alterando várias regras dos desfiles de blocos. A Riotur informou que apenas adequou o Carnaval de rua à legislação estadual, solicitando o cumprimento do Decreto 44.617, de 2014, que exige a autorização da PM e dos Bombeiros para esse tipo de evento. Tal norma foi alterada, no entanto, pelo Decreto 45.556, de 2016, que isenta as agremiações, "desde que não haja montagem de estruturas tais como palcos, camarotes, arquibancadas, torres de som e luz ou estruturas assemelhadas". 

A interpretação conflitante das regras está levando batalhões da PM a tomarem medidas divergentes. O 2º BPM (Botafogo), por exemplo, ainda exigiu da Orquestra Voadora, que desfilaria no Aterro na terça-feira, uma comunicação com 70 dias de antecedência, ou seja, prazo anterior à própria portaria.

 A reação dos blocos

"É uma exigência inexequível. O que é inacreditável é um batalhão pedir uma coisa e outro ter outro entendimento", afirma Rodrigo Rezende, presidente da Liga do Zé Pereira.

Rita Fernandes, da liga Sebastiana, também se mostrou inconformada com o impasse gerado. Segundo ela, a Riotur está atropelando a Constituição, que garante a livre manifestação cultural. "Muitos desses blocos que estão sendo impedidos de desfilar existem há 30 ou 35 anos e estão no calendário oficial da cidade. Sempre foi permitida a realização do Carnaval apenas com a comunicação prévia à PM. É inacreditável que isto esteja acontecendo a tão pouco tempo do evento", afirma Rita.

Uma reunião de emergência foi marcada na manhã de hoje no quartel central da PM, no Centro. As ligas de blocos esperam resolver o impasse a tempo. O diretor de Comunicação da Riotur, Rodrigo Paiva, informou que todos os blocos já anunciados continuam no calendário do órgão, que não tem poder de vetá-los. Segundo ele, a preocupação em pôr em prática medidas contidas na legislação estadual visa a dar mais segurança aos foliões. 

Após a reunião no QG da PM, aumentaram as chances de solução para os desfiles dos blocos no Rio. Segundo Rita Fernandes, a corporação informaria aos batalhões que bastaria a entrega da documentação dos blocos às unidades para que sejam permitidos os eventos. Com isso, eles seriam dispensados de um longo e burocrático processo de emissão do Nada Opor. 

"O que ficou claro é que houve uma tremenda falta de comunicação e alinhamento entre os órgãos. Vamos fazer de tudo para que nenhum bloco seja prejudicado, mas para o próximo ano tem que haver uma organização com mais antecedência. A cidade precisa de um conselho permanente de carnaval", afirmou a presidente da liga Sebastiana.

O que diz a PM

Mais cedo, a Secretaria de Estado de Polícia Militar divulgou a seguinte nota:

"A Secretaria de Estado de Polícia Militar informa que as concessões de "nada opor" foram feitas conforme os blocos carnavalescos eram autorizados pela Empresa de Turismo do Município do Rio de Janeiro (RioTur) a realizarem seus respectivos cortejos. 

A Corporação segue os procedimentos dispostos no Decreto nº 44.617, de 20 de fevereiro de 2014. No entanto, a Polícia Militar flexibilizou os prazos de recebimento de documentações considerando alterações nos procedimentos de autorização dos blocos pela RioTur. Essa mudança impactou na análise de "nada opor". 

Os blocos que já solicitaram recurso diante da negativa do "nada opor" serão reavaliados individualmente.

É importante ressaltar que a Corporação necessita de tempo hábil para planejar o policiamento a ser empregado, tendo em vista questões logísticas - mobilização de tropa e a escala de trabalho dos policiais. Também salientamos que, além das demandas de Carnaval, a Polícia tem outros pontos de atenção (jogos de futebol, Operação Praia etc) e o patrulhamento ordinário na cidade."

A Ambev, que patrocina grande parte dos cortejos afetados, informou através de sua assessoria que não comentaria o impacto da medida.

O que dizem os blocos

Leia abaixo a nota pública divulgada ontem à noite pelas ligas Sebastiana e Zé Pereira:

NOTA PÚBLICA

Seis milhões de pessoas esperam que a PMRJ reveja sua posição!

As ligas carnavalescas Sebastiana e Zé Pereira vêm tornar público sua indignação com o que pode se tornar o cancelamento dos desfiles de muitos dos mais tradicionais blocos da cidade do Rio de Janeiro.

Apesar de termos nos esforçado arduamente para tentar cumprir as regras impostas a partir da publicação da portaria 229 de 02/01/2019, chegamos ao esgotamento de todas as possibilidades razoáveis para cumprir o que se tornou uma "gincana do impossível". Estamos diante da inexequibilidade de algumas exigências feitas de forma intempestiva, e a menos de uma semana do carnaval. 

Passamos os últimos dias nos revezando em diferentes batalhões, quartéis e salas de reuniões. Estivemos também no Ministério Púbico do Rio de Janeiro, que muito nos tem ajudado na tentativa de interlocução com os representantes do Estado. No entanto, quando acreditávamos que tínhamos vencido todos os obstáculos, surge um fato novo que pode jogar por terra os esforços empreendidos até agora e retirar das ruas diversos dos blocos já anunciados. 

O indeferimento e a não entrega do documento de nada a opor por parte da Polícia Militar, com a alegação de que os blocos estão fora do prazo, não pode ser motivo para que agremiações com 10, 20 e até 30 anos sejam impedidas de desfilar. Lembramos que até 2018 havia apenas a necessidade de uma comunicação para ciência da PMERJ. E que os blocos que assinam esta nota já fazem parte do calendário oficial da cidade, amplamente divulgado.

Estamos nos deparando com controversas interpretações dos próprios batalhões sobre a necessidade de um nada a opor da corporação. Há blocos sendo deferidos enquanto outros não, segundo interpretações de cada unidade da PM. Ou seja, estamos vendo que não há isonomia nas decisões apresentadas.

Por isto, não podemos aceitar que haja favorecimento de alguns grupos em detrimento de outros. O tratamento terá que ser igual para todos, considerando que vários blocos inclusive já desfilaram nos fins de semana passados com acompanhamento e ciência da própria PM. Cabe ao poder público prover a estrutura para todos, igualmente. O princípio da igualdade de tratamento e democracia nas decisões deve ser mantido para que o carnaval de 2019 se realize.

Esperamos que a PMERJ reveja sua posição e agilize os processos ainda pendentes e indeferidos para que o carnaval de rua possa acontecer como sempre foi: como o mais importante marco do calendário da cidade.

Assinam este documento os seguintes blocos:

A Rocha

Ansiedade

Barbas

Carmelitas

Céu Na Terra

Escravos da Mauá

Gigantes da Lira

Imprensa que eu gamo

Laranjada

Meu Bem Volto Já

Que Merda É Essa

Quizomba

Orquestra Voadora

Simpatia é quase amor

Suvaco do Cristo

Toca Rauuul!

Último Gole

Vagalume, o Verde

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