Amanda Cotrim

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Reportagem

Dengue: Sem repelente, comércio de Buenos Aires importa produto do Brasil

Andar pelas ruas de Buenos Aires se tornou estressante para muita gente que tenta se proteger de uma invasão de mosquitos. "Tem mosquito em todo o lado", disse Lúcia, decepcionada por não encontrar um repelente em um supermercado no bairro de Balvanera, na capital. Em Villa Crespo, a atendente de outro supermercado avisa que não há repelente e que os que chegam desaparecem em poucos minutos.

A reportagem percorreu ao menos dez estabelecimentos em distintos bairros de Buenos Aires na última quinta-feira (4) e não encontrou nenhum repelente. Em uma farmácia no bairro de Chacarita, a atendente riu quando perguntada se havia previsão de chegada de repelentes. "Não temos ideia. Há dias não chegam. Da última vez chegaram 12 unidades, que acabaram em 10 minutos'', contou.

A brasileira Luaniza Braz, que vive em Buenos Aires, disse que está com dificuldade de encontrar repelente em farmácias, supermercados e lojas de itens diversos. "Não encontro nada. Meus colegas estão buscando em alguns mercadinhos brasileiros que já estão aceitando pedido para trazer do Brasil — claro, com preço superfaturado. Já procurei perto de casa e em outros bairros e não encontrei repelente".

O atendente do mercadinho brasileiro diz que serão trazidos repelentes do Brasil na semana que vem, mas que "a lista de pedidos já está grande".

Em alguns sites, como o Mercado Livre, pacotes com 12 e seis repelentes são vendidos a 133 mil e 92 mil, respectivamente (R$ 665 e R$ 460 reais, no câmbio paralelo), com entrega em sete dias.

Um vídeo divulgado pela rede de televisão argentina TN mostra confusão na compra por repelentes em mercados de vendas por atacado. "Loucura em um atacadista para conseguir repelentes para os mosquitos: desespero, correria e empurra-empurra", disse a nota.

O governo argentino informou que vai agilizar os trâmites para a importação de repelentes devido ao aumento dos mosquitos e da dengue no país, suspendendo por 30 dias a intervenção da Anmat (Administração Nacional de Medicamentos, Alimentos e Tecnologia Médica) ao que se refere a compra de insumos no exterior.

A medida é uma ação emergencial, afirmou o governo, devido ao surto de dengue, transmitida pelo mosquito Aedes aegypti — conhecido dos brasileiros e também alvo de preocupação.

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Surto de dengue na Argentina

Os registros da dengue na Argentina não param de subir. De acordo com o Ministério da Saúde, os casos da doença subiram 86% em relação a 2023. Pelo menos 129 pessoas morreram por dengue e o país registrou 163.419 casos.

O governo de Javier Milei não autorizou a vacina no calendário nacional por alegar que não há evidências científicas de eficácia e que o imunizante usado só tem efeito quatro meses depois da aplicação — tempo em que o país não terá mais a circulação do vírus devido ao inverno.

No Brasil, a vacina Qdenga foi aprovada pela Anvisa e já está sendo aplicada em grupos prioritários. Para a BBC, a fabricante afirmou que a eficácia do imunizante varia de 95,1% a 48,9% em três subtipos. Além disso, o laboratório responsável, Takeda, observou que para apenas um sorotipo — do tipo 4 — não se chegou a uma conclusão sobre a eficácia.

Hoje apenas quatro províncias da Argentina oferecem a vacina gratuitamente: Missiones, Formosa, Salta e Corrientes (norte do país), além de uma cidade de Córdoba. No restante do país, a população que quer se vacinar precisa pagar.

O governo também afirmou que não fará campanhas publicitárias de conscientização, pois o objetivo é reduzir gastos. Por outro lado, há poucos serviços de dedetização em espaços de possíveis criadores, afirmam especialistas.

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De acordo com o epidemiologista argentino Hugo Pizze o pico da dengue será em abril. Além disso, segundo ele, "o peso dos acontecimentos em algum momento fará que o governo adote medidas, como fizeram outros países", referindo-se a campanhas de conscientização, vacina e prevenção. Para ele, a ideia de que a dengue só incide em regiões tropicais não é verdade, uma vez que a dengue chegou até a Patagônia argentina, uma região fria praticamente o ano inteiro.

O governo está fazendo pouco. É preciso que a dedetização seja constante, porque a primeira passada mata os mosquitos adultos, mas nas demais, matam os mais jovens e os filhotes e os ovos. Se passar só uma vez, não terá efeito. Enquanto isso, os habitantes têm que ter a casa limpa, tela de proteção nas janelas e o uso de repelente permanente e não só uma vez ao dia.
Hugo Pizze, epidemiologista argentino

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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