Milei faz um ano de governo com desaceleração da inflação, mas pobreza alta
Javier Milei completa hoje um ano como presidente da Argentina com uma gestão marcada por redução de políticas públicas, desaceleração da inflação, fortalecimento da moeda nacional, guerra cultural, repressão policial e aumento da pobreza.
Veja as promessas cumpridas e não cumpridas por Milei no seu primeiro ano de Governo
O que Milei não cumpiu:
1 - Fim do Cepo, a maior promessa não cumprida por Milei
Uma das maiores queixas dos argentinos é a restrição na compra e venda de dólares. Milei colocou o fim do Cepo como promessa-chave na campanha. O termo é usado na Argentina em referência a uma série de políticas e regulamentos governamentais implementados para restringir a compra e a venda da moeda estrangeira para pessoas e empresas como meio de restringir a fuga de capitais e manutenção do dólar no país.
O presidente diminuiu restrições e permitiu parcelamentos de viagens a Europa em até três vezes, mas não cumpriu a promessa de levantar a política do Cepo e praticamente acabar com ela. Segundo especialistas, isso só seria possível se a Argentina vivesse um equilíbrio monetário.
O governo tenta estabilizar a taxa de câmbio, evitando a flutuação livre e impondo uma intervenção para evitar movimentos bruscos. O presidente argentino acredita que com a inflação reduzida, será possível retirar as restrições sobre a compra e venda de dólares, mas analistas discordam.
2 - Dolarização não chegou
Um das promessas mais enfáticas da campanha presidencial de Milei, a dolarização da economia argentina ainda não aconteceu. Analistas políticos afirmam que o presidente sabe que falta reserva suficiente no Banco Central, o que dificulta ainda mais o enfrentamento da rejeição de políticos que não apoiam a ideia
O presidente também ainda não colocou em curso seu plano de multimoedas, que está no programa de governo.
3 - Argentina não saiu do Mercosul
Uma das promessas de campanha de Milei que causou muita polêmica na época foi afirmar que a Argentina romperia com o Mercosul. O libertário não só não cumpriu a promessa, como participou pela primeira vez de uma cúpula do bloco no último dia 6 de dezembro, no Uruguai.
Apesar de não ter saído do Mercosul, Milei insiste na crítica em relação ao bloco. Ele chegou a afirmar que o mesmo é uma prisão por restringir, segundo ele, os acordos bilaterais comerciais de países que queiram negociar fora do bloco.
Milei chegou a dizer que romperia com a China, o que não cumpriu. Ao contrário. Milei teve uma bilateral com os chineses no contexto do G20 e chegou a mudar o discurso de ofensas contra o país oriental, bem como moderou suas ofensas em relação a outros líderes, como o presidente Lula, quem chegou a chamar de comunista durante a campanha eleitoral.
4 - Ideia de fechar o Banco Central segue de pé
Apesar do governo não ter cumprido a promessa de fechar o Banco Central, o desejo continua. "Ainda está absolutamente de pé", disse o presidente em uma entrevista recente. "A medida que a dolarização avance, haverá um momento em que a operação em dólares será maior. Quando isso ocorrer, estaremos em condição de fechar o Banco Central", afirmou Milei.
Em contrapartida, o governo fechou a Fábrica de Notas e anunciou uma reestruturação da Casa de Moedas.
O que Milei cumpriu
1 - Redução do Estado está em andamento
O presidente argentino prometeu a redução do Estado, o que ele chama de "casta política". E tem cumprido.
Em seu discurso de posse, no dia 10 de dezembro do ano passado, Milei anunciou um plano de choque para reduzir os gastos públicos, inclusive investimentos em áreas cruciais, como saúde e educação. O presidente também prometeu privatizações e abertura ao mercado internacional.
Por meio de um super decreto nos primeiros dias de governo e de projeto de lei inicialmente conhecido como "Lei onibus" - Lei de Bases - por causa da extensão do texto e por mudar diversas leis de uma só vez, o presidente argentino iniciou sua batalha pelo déficit zero e seu desejo de privatização de empresas estatais.
2 - Déficit zero está a caminho
Em menos de um ano, o governo de extrema direita tem cumprido a promessa de reduzir o déficit fiscal por meio de um ajuste nos gastos, cortando subsídios de transporte, energia elétrica, gás e a redução de mais de 30 mil postos de trabalhos.
O governo comemorou a conquista do déficit zero e o prometido equilíbrio fiscal. O superávit financeiro acumulado até agora este ano (janeiro-outubro) atingiu US$ 2,96 milhões, o equivalente a 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB).
Em 12 meses, Milei também eliminou ou reduziu programas sociais. O governo bloqueou o envio de alimentos a restaurantes comunitários nos bairros pobres da Argentina, com o argumento de que os mesmos só poderiam ser liberados após auditoria sobre esses programas, gerando protestos, manifestações e uma turbulência social.
3- Desregulação da economia
O governo determinou por meio de um decreto que o mercado teria autonomia para se auto regular. Um dos efeitos foi a explosão dos preços, principalmente no ramo da saúde, com aumentos de mais de 300% dos convênios médicos.
4 - Repressão policial à tona
Para manter a política do déficit, Milei congelou o investimento em saúde e educação, produzindo como efeito colateral dezenas de protestos e greves em todo o país. A maior universidade da Argentina chegou a desligar o elevador para economizar energia e médicos denunciaram receber salários abaixo da linha da pobreza.
Javier Milei cumpriu a promessa de que coibiria os protestos de rua, conhecidos na Argentina "piquetes". Por meio de um protocolo chamado de "Protocolo anti protesto", o governo reprimiu dezenas de manifestações que tomaram as ruas de Buenos Aires e de outras cidades argentinas em resistência à política de ajuste fiscal. "Quem corta (as ruas), paga", diz o slogan do governo.
5 - Desaceleração da inflação foi possível com queda do poder aquisitivo
Uma das promessas mais marcantes do presidente argentino quando tomou posse foi baixar a inflação do país e evitar a hiperinflação. Milei afirmou que desacelerar a inflação era sua maior promessa de campanha. O então candidato à presidência chegou a chamar a política inflacionária da Argentina de "câncer".
Apesar do pico inflacionário nos primeiros meses de governo, a promessa está sendo cumprida. A Argentina desacelerou a inflação nos últimos meses. Em fevereiro, a inflação mensal foi de 13,2%. Em outubro, o índice chegou a 2,7%.
No início de 2024, o Banco Central estimou um aumento no Índice de Preços ao Consumidor (IPC) anual de 227%. Mas, em novembro a projeção foi de 120%. Para o ano que vem, há uma perspectiva entre analistas econômicos de que a inflação anual seja de 31,4%, um dos níveis mais baixos dos últimos anos.
Analistas econômicos, no entanto, apontam que a inflação baixa só foi possível por causa da queda no poder de compra. De acordo com consultorias especializadas, a Argentina registrou uma redução de 20,4% em comparação ao mês de outubro do ano passado, se tornando a maior baixa no consumo em dez anos.
Os argentinos deixaram de comer carne e passaram a comer pizza e macarrão. A redução do consumo de carne foi a maior desde 1914.
Economistas justificam que uma das razões para a redução do consumo em geral é o fim das políticas de congelamento de preços dos governos anteriores, que usavam esse mecanismo para tentar "ganhar da inflação e da desvalorização do peso argentino.
6 - Pobreza aumentou, como previu Milei
O país que tinha uma espécie de contenção do Estado em governos anteriores, viu o novo governo impor uma política de austeridade que jogou milhões de argentinos para baixo da linha da pobreza. De acordo com dados estatísticos do país de setembro, a pobreza na Argentina em 2024 aumentou 11,2% em relação ao segundo semestre de 2023, quando era de 41,7%. O aumento significa que quase três milhões e meio de pessoas estão mais pobres no país de 46 milhões de pessoas.
O aumento da pobreza foi uma promessa do novo governo, que desde o primeiro dia afirmou que a situação iria piorar para depois melhorar. Milei chegou a dizer que seriam meses de muito sofrimento. O presidente acertou.
Como efeito colateral, mais de um milhão de crianças vão dormir sem jantar na Argentina, revelou um estudo da UNICEF no segundo semestre. Famílias deixaram de comprar pão e passaram a alimentar suas crianças com "torta de farinha e água", porque "rende mais".
7 - Política de desarticulação dos direitos humanos
A batalha cultural do governo é uma das marcas desta gestão, cumprindo o que disse durante a campanha. Milei desarticulou o INCA (Instituto Nacional de Cinema da Argentina) e o INAD (Instituto Nacional contra a Xenofobia, Racismo e Discriminação).
O governo fechou ministérios, como o de gênero, proibiu a linguagem inclusiva em documentos da gestão pública e, atualmente, o governo estuda eliminar o documento de identidade não binária, que impulsionou a gestão anterior. O governo também censurou um dos seminários internacionais sobre direitos humanos mais importantes do país.
8 - Discurso contra estrangeiros
Uma marca da campanha de Milei foi seu discurso contra estrangeiros, sob o argumento de que "alguns estrangeiros" são vampiros, porque sugam a saúde e a educação gratuita do país e vão embora. O presidente prometeu que privatizaria a educação universitária e também cobraria mensalidade de estrangeiros. Apesar de não ter conseguido privatizar a educação, o governo já impulsionou uma lei para que as universidades e hospitais possam cobrar uma taxa de estrangeiros sem residência.
O governo também mudou a forma como atua nas fronteiras. No início do ano, o UOL revelou que a gestão Milei impediu dezenas de estrangeiros, entre eles brasileiros, de entrarem no país com o argumento de serem falsos turistas. Uma mulher chegou a morar duas semanas no aeroporto impedida de entrar na Argentina.
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