Perdão a Moraes e oração: o protesto de fugitivos do 8/1 em Buenos Aires
Cerca de 50 militantes bolsonaristas — a maioria foragidos na Argentina por envolvimento nos ataques golpistas do 8 de Janeiro — protestaram hoje (7) em frente ao Obelisco, cartão postal de Buenos Aires.
O ato fez coro às manifestações ocorridas no Brasil contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal). Na avenida Paulista, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados pediram anistia aos condenados e investigados pelo 8/1.
Moraes é relator dos processos relativos aos ataques às sedes dos Três Poderes.
Com bandeiras de Jair Bolsonaro e cartazes com pedido de "liberdade aos presos políticos", a maioria dos manifestantes é condenada ou investigada por crimes como tentativa de golpe de Estado.
Eles recusam o rótulo de foragidos da Justiça e se identificam como "exilados políticos". A fuga dos foragidos do Brasil foi revelada em maio pelo UOL. Ao menos 119 brasileiros já pediram neste ano refúgio ao governo de Javier Milei.
O ato na capital portenha — que durou cerca de duas horas — teve orações e, apesar das fortes críticas, uma inusitada declaração de perdão a Moraes. O protesto teve também a participação de crianças, identificadas como filhos de foragidos, e de amigos do grupo.
A manifestação foi acompanhada de perto pela polícia, já que não poderia sair do espaço da praça onde está o Obelisco, cumprindo o protocolo antiprotesto de rua do governo argentino.
Durante o ato, os bolsonaristas fizeram uma oração e cantaram o Hino Nacional, além de pedirem o impeachment de Moraes.
Entre os participantes do ato, alguns foram hostis e evitaram falar com a reportagem.
"Eu não admito que você publique minha foto"; "se o UOL publicar algo sobre mim, vocês vão ver" e "você que está deletando os patriotas" foram algumas das frases ditas pelos manifestantes.
Em um momento, um dos organizadores do ato precisou intervir e dizer que a reportagem estava fazendo o seu trabalho.
"Se você não quiser falar com a imprensa, você não fala. Dará entrevista quem quiser", intermediou Symon de Castro, foragido que está pedindo refúgio na Argentina e conduziu o protesto em Buenos Aires.
Bandeira brasileira queimada
Ana Claudia Rodrigues, 58, que tem mandado de prisão em aberto e fugiu para Argentina, onde também busca refúgio político, segurava uma bandeira do Brasil rasgada e aparentemente queimada.
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Quero receberSegundo seu relato, é a bandeira que ela portava no dia 8 de janeiro de 2023 e que foi "destruída" por bombas da polícia.
Ela conversava com a reportagem quando foi interrompida e avisada que "não era pra falar com o UOL". Rodrigues chegou a gravar entrevista em vídeo, mas depois voltou atrás e pediu para o material não ser publicado.
"Eles não querem que eu fale com vocês. Me desculpe", disse, referindo-se a alguns militantes bolsonaristas que inflamaram os manifestantes contra a reportagem.
Pastor conduz oração e diz perdoar Moraes
"Não é o Alexandre de Moraes, mas todo um sistema. Então eu perdoo o Alexandre de Moraes", disse Oziel Lara dos Santos, conhecido como Pastor Oziel ou Pastor Todinho.
Ele fugiu para a Argentina neste ano e está pedindo refúgio político após ser condenado a 14 anos de prisão por envolvimento nos ataques do 8/1.
Oziel — que portava bandeiras de Israel, do Brasil e da Argentina — conduziu uma oração junto aos outros foragidos durante o ato.
Em uma rede social, pastor Oziel afirmou, em dezembro de 2022, que "o PT perdeu" as eleições: "Não vão assumir".
Ao UOL, ele afirmou que é inocente e fugiu para a Argentina em abril.
Disse que se mantém no país "com trabalhos como pastor, levando a Palavra a todos os patriotas, em suas casas, orando, chorando junto".
Perguntado se pede dinheiro aos fiéis, Oziel afirmou que o suficiente para comprar materiais para a igreja, como "cadeiras...coisas assim".
Ele não quis dar detalhes sobre os seus ganhos como pastor na Argentina, mas revelou que os cultos ocorrem em sua casa, em La Plata, capital da província de Buenos Aires.
Oziel não soube dizer a quantidade de fiéis que frequentam os cultos que ele realiza em sua casa. Além dos trabalhos como pastor, revelou que recebe ajuda financeira da família.
"Queremos as imagens"
"A gente quer que as imagens que dizem que são as provas de que depredamos os Três Poderes apareçam. Cadê as provas?", questionou o foragido Djalma Silvino dos Reis, da cidade de Itaporã (MS), que também pede refúgio na Argentina.
Ele contou que fugiu para Buenos Aires pela fronteira de Foz do Iguaçu depois de "se dar conta de que não teria um julgamento justo".
"Eu estava disposto a aguardar o julgamento no Brasil e a não fugir, mas depois do que vimos com outro patriota, que foi condenado sem direito a recurso, eu entendi que era um julgamento político", disse Reis.
Bíblia, Deus e o diabo
O ato foi conduzido por Symon Filipe de Castro Albino, conhecido como Symon Patriota, de Vinhedo (SP), um dos organizadores do protesto contra Moraes.
Ele esteve foragido no Brasil por um ano e quatro meses e depois fugiu para a Argentina, em maio, segundo relatou ao UOL.
Symon é investigado pela Polícia Federal e seu processo está em segredo de justiça. Segundo a Abin (Agência Brasileira de Inteligência), ele foi um dos incitadores e organizadores dos atos de vandalismo contra os Três Poderes no 8/1. Albino se diz inocente.
Em discurso no ato, afirmou que Deus muitas vezes se utiliza do diabo para poder revelar a verdade, ao se referir à imprensa denominada por ele como "de esquerda".
De acordo com o mandado de prisão, Symon Patriota é suspeito de organização terrorista, atos preparatórios para terrorismo, viabilizar ato terrorista, ameaça, incitação ao crime, dano, incêndio, perseguição "mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas, ou com o emprego de arma", associação criminosa, pichação, destruição de bem público.
Outro foragido relatou ao UOL, sob condição de anonimato, ter chegado à Argentina em maio.
Ele afirmou que voltará ao Brasil em breve e que vai trabalhar por uma paralisação de caminhoneiros. "Eu vou orar para que os caminhoneiros nos apoiem. Eu conheço a categoria, sou empresário e é a única forma de o Brasil parar", afirmou.
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