Denúncias passam de cem após Milei minimizar crise de criptomoeda na TV
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Após uma polêmica entrevista ao canal argentino TN, divulgada ontem (17), as denúncias contra o presidente Javier Milei no caso da criptomoeda $Libra aumentaram ao longo desta terça-feira (18).
Ao menos seis denúncias foram ratificadas pela juíza María Servini, em meio a mais de cem realizadas desde a última sexta-feira (14), de acordo com números divulgados por jornais argentinos. A validação das denúncias é o primeiro passo em todo o processo criminal. Após serem ratificadas, são encaminhadas ao promotor que decidirá se as aceita ou não. O presidente corre o risco de responder por fraude e associação ilícita.
As denúncias se multiplicaram depois que Milei desdenhou de quem investiu na cripto $Libra. "Se você vai a um cassino e perde dinheiro, qual é a reclamação?", afirmou. Ele disse ainda que quem investiu "sabia muito bem o que estava fazendo".
"Eu não promovi [o ativo], apenas divulguei", reiterou, em tom despreocupado.
O ativo afundou logo após o presidente divulgá-lo nas redes sociais na sexta-feira (14), gerando prejuízo a milhares de investidores influenciados por ele.
Milei diz não ter medo
O ultradireitista também declarou que não tem medo de um possível processo jurídico e político. Milei se diz perseguido por promover o maior ajuste fiscal da história do país e cumprir promessas de campanha, como diminuir a inflação.
O presidente alega que fez a publicação nas redes sociais como pessoa física, porque sua conta é "pessoal". No entanto, afirmou que será orientado como presidente da República por seu ministro da Justiça, Mariano Cúneo Libarona.
Vídeo sem edição pressiona governo Milei
Logo após a entrevista ir ao ar, um vídeo sem edição foi difundido pela imprensa argentina e viralizou nas redes sociais.
Na gravação, o jornalista que conduz a entrevista pergunta a Milei como será a estratégia judicial do Executivo em um processo que já tem mais de cem denúncias. Nesse momento, o assessor político do presidente, Santiago Caputo, interrompe a entrevista para falar ao pé do ouvido de Milei. A entrevista continuou, mas sem mencionar a estratégia jurídica do presidente.
A Casa Rosada respondeu sobre a polêmica do vídeo. O porta-voz Manuel Adorni afirmou que a interrupção foi equivocada e que o próprio Milei a classificou como desnecessária. "Santiago não sabe que a dinâmica é não cortar as entrevistas em nenhum aspecto, por nada. Quando vimos os três minutos de interrupção dentro do contexto foi para isso, para não confundir [o presidente]'", explicou Adorni.
Denúncias e divergências
Milei foi denunciado à Justiça argentina por suposta associação ilícita que teria gerado perdas para mais de 40 mil investidores e fraude. As denúncias também apontam que ele descumpriu os seus deveres como funcionário do estado, violando, portanto, a lei de ética pública. Também surgiram acusações de suspeitas de operações criminosas.
Caso o Ministério Público aceite as denúncias, será o primeiro processo por atos de corrupção que Milei enfrentaria como presidente. Contudo, a promotoria também poderia considerar que as denúncias apresentadas não têm base legal que validem uma investigação.
Entre os especialistas, há muitas divergências. Há quem diga que Milei poderia ser investigado por ter cometido uma manobra que implica a violação de normas penais, como a lei de ética pública. No entanto, há quem defenda que a postagem de Milei não constitui crime, ainda que possa ser politicamente questionável.
Relembre o caso
Na sexta-feira (14), Milei, que tem mais de 3,8 milhões de seguidores no X, fez um post convocando os internautas a investirem na criptomeda $Libra.
A publicação dizia que "este projeto privado incentivará o crescimento da economia argentina, ancorando pequenas empresas e empreendimentos argentinos. O mundo quer investir na Argentina". De acordo com jornais locais, a cotação chegou a subir de zero para 4,5 euros em poucos minutos e seu valor global chegou a US$ 4,5 bilhões.
Contudo, de repente, a criptomoeda entrou em colapso. O presidente apagou o post três horas depois.
A estratégia, conhecida como "puxão de tapete", consiste em promover artificialmente um ativo para atrair investidores e esvair com os lucros. Para ser eficiente, é preciso que uma pessoa de grande influência, como é o caso do presidente argentino, decida promovê-lo.
O argumento do presidente da Argentina para ter apagado o post foi que ele não estava "a par do projeto". Em entrevistas aos jornais locais, negou que cometeu um erro e transferiu a responsabilidade aos investidores que, segundo ele, sabiam que estavam "se metendo em um negócio de alto risco".
Pedido de impeachment
Além das denúncias jurídicas, o presidente argentino pode enfrentar um processo político de impeachment. O pedido está sendo gestado por deputados da oposição, do partido peronista União pela Pátria, e outros partidos de esquerda. A medida necessita aprovação de dois terços dos votos da Câmara dos Deputados para avançar —uma quantidade de votantes considerada alta e difícil de ser alcançada.
A Argentina nunca retirou um presidente por meio de um julgamento político, o que seria algo inédito para o país.
Por outro lado, outro grupo de deputados pretende apresentar um pedido de investigação sobre a conduta do presidente e apresentar a uma Comissão Especial de Investigação. Neste caso, o caminho pode ser mais factível, já que é necessária uma minoria simples para avançar.
Segundo a Constituição Argentina, três razões podem levar um presidente a ser impedido:
- Mau desempenho nas funções,
- Crimes cometidos no exercício da função pública ou
- Crimes comuns.
A carta magna estabelece que os funcionários sujeitos a esse tipo de investigação são o presidente, vice-presidente, chefe de gabinete, ministros e juízes da Suprema Corte. O julgamento público está a cargo do Congresso Nacional.
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