Sangria no Bolsa Família provocou enxurrada de projetos para conter Bets
Deputados e senadores apresentaram, desde setembro, 109 projetos para regulamentar Bets. A enxurrada ocorre após o Banco Central divulgar relatório, em 23 de setembro, mostrando que beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões apostando em jogos on-line em um único mês.
São 92 projetos na Câmara e 17 no Senado, conforme levantamento feito pelo escritório Campos & Antonioli Advogados Associados ao qual a coluna teve acesso. Os dados mostram que, após o estudo do BC, houve uma mudança no enfoque do Congresso.
Entre 25 de setembro e 4 de dezembro, foram protocolados 59 projetos de lei na Câmara sobre os jogos de apostas. Desses, 20 propostas buscam impedir/excluir/vedar/proibir ou restringir o uso dos benefícios sociais para pagamento de apostas on-line. Parlamentares também se mostram preocupados com o marketing agressivo das casas de apostas — são 14 propostas para limitar a publicidade.
Em apenas um único dia, o deputado Helio Lopes (PL-RJ) apresentou seis projetos de lei para regulamentar as casas de apostas que vão do combate à ludopatia (transtorno do jogo patológico) a restrições de publicidade para menores de 18 anos.
A maioria dos partidos apresentou propostas para impor regras e punir as bets - apenas o União Brasil registrou 15 projetos de lei; na sequência, o PL se destaca com nove propostas e, o PSD, com oito proposições.
"A opção pela legalização do jogo no país é evidentemente política", diz Sérgio Rosenthal, mestre em Direito Penal pela USP e especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra. As proposições, observa, mostram uma disposição do Congresso (a partir do relatório do BC) em alterar o entendimento de que a liberação dessa prática não é deletéria, especialmente para a parcela menos instruída da população.
"O movimento do Congresso é bem-vindo, em todos os aspectos, para preservar a sociedade, principalmente de baixa renda da ameaça que é o jogo irresponsável", complementa o advogado Dinovan Dumas, especialista em Direito Penal Empresarial pela Universidade de Coimbra.
De janeiro a 24 de setembro, antes do estudo do BC, a Câmara registrava apenas 16 propostas sobre o tema. Em 2023, eram 14 projetos de lei. Em 2022, duas e, em 2019, apenas uma.
Das 16 propostas apresentadas na Câmara antes de o Banco Central apontar as apostas dos beneficiários de programas assistenciais, nove delas restringem a publicidade das bets; três pretendem dar destino aos recursos oriundos da arrecadação das casas de apostas e, apenas quatro buscam vedar a participação de inscritos em programas sociais nas apostas.
Em 2023, foram registradas 14 propostas para regular as apostas por quota fixa. Naquele momento, o legislador estava mais preocupado com a manipulação dos resultados das apostas, foram três propostas neste sentido. Apenas um projeto daquele ano visou restringir as apostas pelos beneficiários de programas assistenciais.
Em 2022, a Câmara não estava atenta ao crescimento das bets no país. Naquele ano, foram autuados apenas dois projetos: o primeiro deles, de autoria da policial Katia Sastre (PL-SP), pretende destinar recursos da arrecadação das bets para suprir o FNSP (Fundo Nacional de Segurança Pública); o segundo projeto, de autoria de Paulo Folletto (PSB-ES), estipula a criação do Dia Nacional de Combate à Ludopatia.
Senado também fez movimento
Após o estudo do BC, foram protocoladas pelos senadores nove propostas e um requerimento de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito.
Desses, dois restringem a publicidade; dois proíbem a realização de apostas de quota fixa por beneficiários de programas sociais; dois colocam limites para realização das apostas e um propõe a restrição de horários para realização de jogos. O senador Eduardo Girão apresentou outro proibindo os jogos on-line no Brasil.
Antes de 23 de setembro, o Senado havia registrado a entrada de apenas três projetos: Randolfe Rodrigues (PT-AP), para restringir a publicidade; Cleitinho (Republicanos-MG), para determinar a obrigatoriedade de as casas de apostas terem representante legal no país e Jorge Kajuru (PSB-GO), para vedar a exploração de apostas em resultados eleitorais.
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Quero receberNo diagnóstico do criminalista Philip Antonioli, sócio do escritório Campos & Antonioli Advogados Associados, que realizou o levantamento, tentar impedir os jogos é inviável. "Temos um governo que precisa desesperadamente de arrecadação, e o jogo é, sim, um fato fiscal gerador bilionário. Junte-se a isso uma sociedade que, inspirada no mundo virtual criado pelas celebridades nas redes sociais, quer ascender a qualquer preço", afirma.
Bets na mira de duas CPIs
O Senado mantém em funcionamento, desde 10 de abril, a CPI das Apostas Esportivas. A comissão investiga denúncias de manipulação dos resultados dos jogos pelas casas de apostas online.
Em paralelo, uma outra CPI investiga a atuação dos sites de apostas (bets) no Brasil. Segundo o texto do requerimento, a CPI foi criada para "investigar a crescente influência dos jogos virtuais de apostas online no orçamento das famílias brasileiras".
Histórico das Bets
Em dezembro de 2018, o então presidente Michel Temer assinou a lei nº 13.756, que liberava as apostas com quota fixa, com a previsão de que a regulamentação fosse feita em no máximo quatro anos. Os jogos on-line já eram acessados no país desde o ínicio dos anos 2000.
Com essa nova legislação, as apostas esportivas passaram a funcionar de forma totalmente legalizada.
Empresas de apostas proliferaram pelo país, mas foi depois da Copa do Mundo de futebol de 2022 que o investimento do setor realmente começou a crescer no Brasil. De acordo com uma pesquisa realizada pela PwC Brasil, as bets registraram um crescimento de 89% entre 2020 e 2024.
Em 2023, o Congresso aprovou uma primeira parte da regulação enviada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e uma segunda etapa com regras de operação definidas pelo Ministério da Fazenda entrará em vigor a partir de outubro. A regulamentação está prevista para ser finalizada até 2025.
Em 31 de dezembro de 2023, o presidente Lula sancionou parcialmente o Projeto de Lei nº 3.626, de 2023, transformado na Lei Nº 14.790, de 29 de dezembro de 2023.
A lei estabelece critérios sobre tributação, normas para a exploração desse serviço, define a distribuição da receita arrecadada, fixa sanções e estabelece as competências do Ministério da Fazenda na regulamentação, autorização, monitoramento e fiscalização da atividade. Abrange apostas virtuais, apostas físicas, eventos esportivos reais, jogos on-line e eventos virtuais de jogos on-line.
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