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Balaio do Kotscho

"O presidente sou eu!": Bolsonaro declara guerra ao Brasil e ao mundo

Colunista do UOL

27/03/2020 12h07

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Com o "discurso da morte" de terça-feira e o vídeo suicida que prega o fim do confinamento contra a pandemia, lançado hoje nas redes sociais, em confronto aberto com o Congresso, os governadores, a OMS e a ONU, cada vez mais isolado em seus palácios, cercado de generais por todos os lados, mas ouvindo só os filhos Zero Um, Zero Dois e Zero Três, o presidente Zero Zero encerra a semana declarando guerra ao Brasil e ao mundo.

É tudo tão louco que, ao mesmo tempo em que lança a campanha #obrasilnãopodeparar, para todo mundo sair de casa, Bolsonaro apoia caminhoneiros que ameaçam parar o país, como aconteceu na última greve.

Diverte-se divulgando vídeos de carreatas de carrões promovidos pela seita, que fecham as ruas desertas e pregam o negacionismo radical.

Faz isso na mesma semana em que o Brasil bate recordes de infectados e mortos pelo coronavírus, mesmo com grande parte da população em suas casas, respeitando as recomendações da OMS e do seu próprio Ministério da Saúde.

Para Bolsonaro, a pandemia de coronavírus, que se alastra pelo mundo em progressão geométrica, simplesmente não existe _ assim como garante que nunca houve ditadura militar no Brasil.

Em seu mundo particular, a realidade é uma fantasia e seus delírios são reais. Não tem limites, não tem noção do que está fazendo, não pensa nos outros.

Só ele, os filhos e o guru Olavo de Carvalho estão certos. E o mundo inteiro está errado.

Bolsonaro debocha dos riscos da pandemia, dá risada quando fala barbaridades, como essa numa entrevista na quinta-feira:

"Até porque o brasileiro tem que ser estudado. Ele não pega nada. Você vê o cara pulando em esgoto ali. Ele sai, mergulha e não acontece nada com ele".

Se alguém o contraria, como fez o seu vice, general Mourão, que defendeu o isolamento, limita-se a repetir:

"O presidente sou eu!"

Se Bolsonaro tem instintos suicidas, problema dele. Mas estão em jogo as vidas de 210 milhões de brasileiros, ameaçados de morrer de coronavírus, de fome ou de raiva.

Inimigo declarado da ciência e da cultura, orgulhoso da sua ignorância abissal, esta semana mandou incluir na lista de serviços essenciais os templos, para agradar os bispos da grana, e as lotéricas, para o povo continuar vivendo na ilusão.

Como diz que não lê jornal, não deve ter visto a manchete da Folha de hoje: "Explode número de internações por problemas respiratórios, diz Fiocruz".

Na semana passada, havia 2.250 pacientes internados com insuficiência respiratória grave.

"É um número dez vezes maior do que a média histórica de cerca de 250 casos de hospitalização nos meses de fevereiro e março nos meses anteriores", diz o coordenador do sistema de monitoramento da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), Marcelo Ferreira da Costa Gomes.

Na cabeça doente do ainda presidente da República, a Fiocruz deve ser apenas mais um antro de comunistas que querem desestabilizar o seu governo.

Algum assessor não aloprado, se ainda houver, poderia mostrar a Bolsonaro a notícia que saiu hoje sobre o prefeito de Milão, em que ele agora, após 4.400 mortes, admite ter errado ao apoiar campanha para a cidade não parar, preocupado apenas com a economia. Ontem, ele pediu desculpas aos mortos.

Exatamente a mesma campanha que o capitão está bancando agora, para atender aos empresários amigos, que choram a perda da freguesia, sem se importar com o resto.

Ao trocar o "gabinete de crise" do Planalto, montado para o enfrentamento da pandemia, pelo "gabinete do ódio", comandado pelos filhos para declarar guerra ao Brasil e ao mundo, Bolsonaro tomou um caminho sem volta.

Ou Bolsonaro acaba com o Brasil ou o Brasil acaba com essa praga do boçalnarismo, mais letal do que o coronavírus.

Antes que seja tarde. Depois, não adianta pedir desculpas.

Vida que segue.