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OPINIÃO

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Tem que interditar: Bolsonaro solto é uma ameaça à saúde pública

Presidente Jair Bolsonaro à frente de grande manifestação de motoqueiros por São Paulo: qualquer semelhança não é coincidência - ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO
Presidente Jair Bolsonaro à frente de grande manifestação de motoqueiros por São Paulo: qualquer semelhança não é coincidência Imagem: ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

Colunista do UOL

12/06/2021 16h51

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Depois de liderar uma manifestação com milhares de motoqueiros até Jundiaí, que fez lembrar cenas e discursos da ascensão de Adolf Hitler na Alemanha e de Benito Mussolini na Itália nos anos 1930, Jair Bolsonaro subiu no palanque do carro de som montado em frente ao Parque do Ibirapuera para fazer o discurso mais assustador dos seus dois anos e meio de mandato.

Confesso que fiquei espantado ao ouvi-lo se esgoelar no microfone contra todas as medidas de contenção do coronavírus, mentir compulsivamente sobre as vacinas, a supernotificação do número de mortos e o uso de máscaras, defender de novo o "tratamento precoce", que não cura mas pode matar, e louvar Deus, os militares e a PM, aos gritos, como se estivéssemos em guerra.

Bolsonaro continua ameaçando a saúde pública, na contramão da ciência e da OMS, dobrando a sua aposta no negacionismo doentio que já deixou quase 500 mil mortos no país. Tem que ser interditado urgentemente.

Os alvos principais do seu discurso delirante foram o isolamento social, o governador paulista João Doria e a CPI da Pandemia, que investiga, e já tem centenas de provas da responsabilidade do governo federal no enfrentamento da pandemia. Milhares de brasileiros não precisavam ter morrido, vai ser a conclusão.

O tempo todo sem máscara, aglomerando e acenando para os seguidores, o presidente ainda teve a coragem de dizer que não está em campanha eleitoral. Qual foi, então, a finalidade do novo rolê de motos, que congestionou o trânsito na cidade e interditou rodovias?

Em seu discurso, Bolsonaro amitiu que estamos com um problema sério do vírus, o que já é um avanço, mas se mostrou mais preocupado com a economia, o desemprego e a fome, e garantiu que o Brasil estará entre os cinco países com maior crescimento econômico no mundo este ano, sem citar a fonte de onde tirou esta afirmação. Foi o Paulo Guedes quem lhe falou?

A manifestação motorizada sobre duas rodas foi batizada de "Acelera para Cristo", mais uma vez misturando política com religião . Para homenagear os devotos, o capitão levou na garupa da sua moto o deputado Cezinha de Madureira, líder da Frente Parlamentar Evangélica.

"Eu nunca mandei fechar igrejas", proclamou, como se alguém o tivesse acusado disso. Era a senha para os apoiadores gritarem "Fora Doria".

Como se estivessem bem ensaiados, quando falou que quem já foi vacinado não precisa mais usar máscaras, o que é uma mentira, a massa de motoqueiros exultou: "Eu autorizo".

Pulando de um assunto a outro, cada vez mais empolgado, só faltava atacar a imprensa. Lá pelas tantas, mirou na Folha _ "jornal que não serve nem para limpar chiqueiro" _ para dizer que o país "não está despiorando, mas melhorando".

Em sua campanha para desmoralizar o quarto ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, defendeu novamente um decreto para "flexibilizar" o uso de máscaras, a única defesa de quem não pode manter o isolamento social porque precisa trabalhar.

Em resumo, ao dizer que nunca se curvou à pandemia, o discurso do presidente da República foi todo dirigido à CPI, para justificar as ações e omissões do seu governo, que estão sendo reveladas nos depoimentos, e provar que ele sempre esteve certo, ao boicotar as vacinas e receitar cloroquina.

"Eu peguei Covid, tomei cloroquina e, no dia seguinte, estava curado", voltou a repetir, para os aplausos da plateia.

Quem sabe, poderia também ter tomado um suco de laranja, que teria o mesmo efeito. Mas assim como acontece com seus devotos, não há argumento científico capaz de faze-los mudar de ideia. Eles têm ideia fixa.

No meio do passeio do Dia dos Namorados, o governador Doria multou Bolsonaro em R$ 500 por não usar máscara, o que é troco perto do que custou ao governo do Estado a montagem do esquema de segurança do presidente.

Para protegê-lo, foram mobilizados 1.433 policiais, cinco aeronaves, 10 drones e 600 viaturas, sem contar os agentes da Polícia Federal, do GSI e da PRF, requisitados para garantir o sucesso do passeio presidencial. Custo total: 1,2 milhão.

Se ninguém contiver e interditar esta insanidade, milhares de brasileiros continuarão a morrer e ser contaminados todos os dias pelo coronavírus, superlotando hospitais e cemitérios.

E eles continuarão alegremente passeando e se divertindo pelas ruas e rodovias deste país, com direito a um discurso do grande líder no final.

Qualquer semelhança com imagens do passado não é mera coincidência.

Vida que segue.