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O que explica a onda de mortes e colapso funerário pela covid em Hong Kong?
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O recente avanço da covid-19 em Hong Kong elevou o número de casos e mortes a tal ponto que não há espaço sequer para armazenar corpos em necrotérios. A taxa de mortalidade pela doença na região se tornou a mais alta do planeta após chegada da variante ômicron. Desde quarta-feira (16), os mortos passaram a ser armazenados em contêineres refrigerados.
A cobertura vacinal, especialmente entre os idosos, é a principal explicação para o pico da pandemia no território chinês de 7,4 milhões de habitantes, segundo especialistas ouvidos pela coluna.
Duas cada 3 pessoas com 80 anos ou mais ainda não foram imunizadas com duas doses.
"Idosos não têm um sistema imunológico como o de um jovem, precisam dessa proteção extra", afirma Alexandre Naime, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia e chefe da infectologia Unesp (Universidade Estadual Paulista). "É o contrário do que a gente indica e vê em outros países", diz Naime, apontando que Israel aplica a 4ª dose desde dezembro, com bons resultados. O estado de São Paulo também anunciou que vai oferecer a 4ª dose.
No boletim de ontem, o Centro de Proteção à Saúde de Hong Kong contabiliza 21.650 novos casos e 289 mortes pela covid-19 nas últimas 24 horas. Desde o início da quinta e mais forte onda da epidemia, já morreram 4.923 pacientes.
Curva de óbitos pela covid por 100 mil habitantes em Hong Kong:
Para se ter ideia do tamanho da tragédia, até 2021 a região havia registrado apenas 12.650 casos e 220 mortes.
O detalhe que mais chama a atenção no caso de Hong Kong é como a ômicron —apontada como mais branda que as demais variantes— causou uma taxa de mortes muito acima da média mundial, justamente em um local considerado exemplo na prevenção da covid-19.
Quando a onda chegou, a cobertura vacinal de idosos com mais de 80 anos em Hong Kong era de apenas 34%. O percentual foi informado pelo jornalista de dados do "Financial Times", John Burn-Murdoch, no Twitter.
Em um gráfico, ele compara a evolução da pandemia após a chegada da ômicron em Hong Kong e na Nova Zelândia (onde só 2% dos idosos com mais de 80 anos não se vacinaram).
Murdoch alerta ainda que a maioria dos idosos imunizados em Hong Kong tomou a vacina da Sinovac, com vírus inativado, inclusive a dose de reforço. O aconselhado, no entanto, é receber uma dose extra de vacina de mRNA —como Pfizer ou Moderna. "No geral isso provavelmente contribuiu para os resultados ruins", diz o jornalista.
Para incentivar a população, o Food & Health Bureau (a Anvisa deles) anunciou que vai iniciar a vacinação com Pfizer em um dos centros de saúde distrital a partir da quarta-feira da semana que vem, dia 23.
"As pessoas elegíveis com 12 anos ou mais podem marcar uma consulta online para receber sua primeira, segunda ou terceira dose da vacina", diz o comunicado, citando que a medida visa "aumentar ainda mais a taxa de vacinação". A previsão inicial é que o serviço seja oferecido por quatro semanas.
Segundo dados do sistema Our World Data, até ontem 72% da população de Hong Kong estava vacinada com duas doses. Se considerada a dose de reforço, esse percentual cai para menos de 30% —índice abaixo do Brasil, por exemplo, que já superou a marca.
"Houve muito pouca covid em Hong Kong esse tempo todo, então pouquíssima gente conhecia alguém que teve covid ou morreu da doença. Automaticamente, desapareceu um incentivo muito importante para a vacinação", afirmou Siddharth Sridhar, virologista da Universidade de Hong Kong, à BBC.
Um outro ponto que explica a baixa adesão é a histórica desconfiança dos moradores de Hong Kong (especialmente os mais velhos) com o governo chinês (que é quem manda as vacinas).
O poder da ômicron
O caso de Hong Kong exemplifica como a ômicron tem um poder letal quando avança em populações não vacinadas, especialmente os mais idosos, afirma Antônio Lima Neto, epidemiologista e professor da Unifor (Universidade de Fortaleza).
"A gente tem que investir em cobertura vacinal. Hong Kong só comprova que a ômicron faz o pico de casos da pandemia, e não tem como evitar porque ela é muito transmissível, é uma forma perfeita viral de transmissibilidade. Mas óbito e hospitalização você só vai ter em população não vacinada completamente ou que não tenha feito uma dose de reforço", explica.
Ele afirma que não há outra explicação para o colapso além dos baixos índices de vacinação. "Independente da ômicron ser menos agressiva, ela está encontrando em Hong Kong bolsões de não vacinados justamente no público mais vulnerável. São idosos sem nenhuma dose", pontua.
Lima Neto explica que, assim como foi visto em países como Brasil, o aumento de casos foi rápido, mas a queda do número de doentes em Hong Kong já é observada. "O número de casos está caindo, mas o de óbitos está em ascensão. Ela leva um tempo maior para cair, é natural", finaliza.
Para conter o surto, o governo anunciou o fechamento da maioria das praias de Hong Kong. Já a cidade chinesa de Shenzhen, um polo tecnológico de 17,5 milhões de habitantes que faz fronteira com Hong Kong, entrou em lockdown na segunda-feira, após a alta de casos.
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