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Credores apontam irregularidades em recuperação judicial do grupo Collor
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O futuro do grupo de comunicação da família Collor em Alagoas —a OAM (Organização Arnon de Mello)— será decidido a partir do próximo dia 12, quando os mais de 500 credores, entre pessoas físicas e empresas, se reúnem para decidir se aceitam ou não o plano de recuperação judicial para quitação de um débito estipulado em R$ 64 milhões —que é apenas uma parte da dívida do grupo.
Após dois anos e meio da aprovação da recuperação judicial, a assembleia geral de credores foi marcada, mas corre risco de ter seu resultado questionado porque um grupo de credores alega irregularidades no processo, que corre na 10ª Vara Cível de Maceió.
O motivo é que o plano de pagamento apresentado prevê uma série de vantagens para a OAM, o que acaba dificultando o cálculo do valor a ser recebido pelos credores trabalhistas.
Além disso, dez credores questionam a razão pela qual alguns trabalhadores receberam parte dos valores antecipadamente e mesmo assim terão direito a voto na assembleia que pode resultar na falência no grupo de comunicação —que inclui a afiliada TV Globo no estado. O senador Fernando Collor (Pros) é o sócio majoritário da OAM.
As denúncias serão apuradas pelo MPT (Ministério Público do Trabalho), que recebeu o relato dos credores na quinta-feira (7) e determinou a instauração de notícia de fato para investigar as supostas irregularidades durante a recuperação judicial. O procurador Victor Hugo Fonseca Carvalho foi nomeado para o caso.
Ao UOL, a OAM afirmou que "está amparada" pela legislação que regula recuperação judicial. O senador não quis comentar (leia mais abaixo).
O administrador judicial da recuperação judicial, José Luiz Lindoso da Silva, afirma que o debate deveria ter sido feito antes —quando a proposta foi divulgada, em maio de 2021.
Crédito antecipado por voto
De maio do ano passado até sexta-feira (8), cem dos 291 credores trabalhistas fizeram acordo com a empresa e receberam a dívida com um deságio de 50% —uma espécie de desconto do valor total devido. A primeira parcela, com 80% do total, já foi paga. Os 20% restantes só serão encaminhados após a eventual aprovação do plano.
"Isso fere completamente a isonomia de credores. Quem já recebeu não vai ter olhar imparcial e tem interesse de aprovação porque já recebeu parte do que é devido, e o restante está condicionado à aprovação do plano", diz o advogado que representa os dez credores que reclamam das supostas irregularidades, Marcelo Andreatta.
Para um dos credores, que conversou com a coluna, faltou união e orientação jurídica para que esses trabalhadores não aceitassem a proposta com tamanho deságio. "Muitos não sabiam o que fazer e acabaram aceitando algo extremamente desvantajoso não só para eles, mas para todos", diz.
Nesses mais de dois anos de processo, o MPAL (Ministério Público de Alagoas) não atuou. O promotor natural do caso declarou suspeição, e um segundo indicado declarou-se impedido. Até agora, nenhum parecer foi emitido.
A coluna procurou o MP, que informou que recebeu esta semana uma representação dos credores, que será enviada ao gabinete da Procuradoria-Geral de Justiça. "A documentação será avaliada pela assessoria técnica e, em sequência, o caso distribuído para o promotor designado", afirmou.
Os débitos trabalhistas são devidos a uma das três classes que votam pela aprovação ou não do plano.
Tipo de débitos e classe que vão à assembleia:
Trabalhistas (ex-funcionários):
- 291 credores
- R$ 36.150.866,36 devidos
Quirografários (formado por aqueles que têm de provar o direito a crédito):
- 189 credores
- R$ 26.740.998,36 devidos
Microempresas e empresas de pequeno porte:
- 79 credores
- R$ 1.630.428,06 devidos
Segundo o advogado, uma empresa em recuperação pode até negociar valores antecipados extrajudicialmente, mas o pagamento só poderia ser efetuado com a aprovação de todos e nos termos do plano —que vai decidir uma regra de pagamento uniforme para todos.
"Eu acompanho recuperação judicial desde 2014 e nunca vi credor recebendo antes da aprovação do plano por mediação. Isso criou uma condição privilegiada", afirma.
Sem valores definidos
Marcelo Andreatta diz que a proposta traz uma "armadilha" porque a maioria dos trabalhadores fez acordo para receber valores menores na Justiça do Trabalho. Por exemplo: um trabalhador que entrou com ação cobrando R$ 600 mil, na audiência aceitou um acordo de R$ 250 mil em 25 parcelas.
Nesse caso, por se tratar de um acordo para encerrar um litígio, não há especificação de quanto é devido como indenização, multa, hora extra e outros itens a serem cobrados.
Ou seja, eles consolidaram um acordo judicial, não pagaram nada, e agora eles estão retirando o valor definido na Justiça. No plano, o trabalhador não sabe quanto vai receber. Isso é uma sacanagem porque fará com que eles votem sem clareza. Qualquer plano normal diz quanto cada pessoa vai receber."
Marcelo Andreatta, advogado
Além disso, diz Andreatta, se o plano for aprovado com esses termos, os trabalhadores correm o risco de não receberem nada.
"Como o crédito não é líquido [não se sabe o valor exato para cada credor trabalhista], como que vão liquidar? Onde vou apurar quanto cada um vai receber? Se for na Justiça comum, vão dizer que tem de apurar na justiça especializada [do Trabalho], que não vai fazer porque o mérito do cumprimento é da justiça comum. Ou seja, cria um conflito de competência", alega.
Se o plano não for aprovado pelos credores, será decretada falência. O juiz nomeará uma pessoa como responsável pela massa falida —todos os diretores e sócios são afastados. Esse admistrador vai decidir se mantém a empresa funcionando para efetuar os pagamentos ou se vende os bens para pagar os credores.
Problemas antigos
O presidente do Sindicato dos Jornalistas de Alagoas, Izaías Barbosa, afirma que já acompanhou outros processos trabalhistas contra a OAM.
"Nós tivemos que entrar com vários processos contra a empresa para pagamento do FGTS, e ela fazia acordo, mas não cumpria, parava de pagar parcela e fazia um novo acordo. Como a legislação permite reclamar apenas os cinco últimos anos, a cada quatro anos e meio a gente entra com um novo processo", afirma.
Segundo a PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), duas empresas do grupo —a TV Gazeta de Alagoas e a Gazeta de Alagoas— devem, juntas, R$ 13,5 milhões de FGTS. Ao todo, o grupo tem uma dívida ativa de R$ 363 milhões.
Reclamação "fora do prazo"
O administrador judicial da recuperação judicial, José Luiz Lindoso da Silva, afirma que o debate para revisão dos termos do acordo poderia até ser feito, mas não às vésperas da votação dos credores.
"Nesse momento, como essas questões estão nos autos há mais de um ano, não é mais adequado esse debate. Acho que até tem alguma base [os argumentos], mas era para ter sido feito no primeiro momento. Agora a empresa já fez os acordos", diz.
O mesmo entendimento teve o juiz da 10ª Vara Cível, Erick Costa de Oliveira Filho, que negou na sexta pedido liminar dos credores para suspender a assembleia. Ele alegou que a reclamação deveria ter sido feito até 30 dias após a publicação da proposta, no primeiro semestre de 2021.
Porém, diz que se os credores "acreditam que existem indícios de ocorrência de crime falimentar" podem fazer a denúncia, mas cita que "a competência para processar crimes falimentares é do Juízo Criminal".
Segundo José Lindoso, apesar de terem recebido 80% dos valores, os credores são livres para votarem contra ou a favor do plano. "Não há, nem pode haver, nenhuma obrigação ao voto positivo. A proposta foi para todos dentro dos termos, e alguns fecharam", alega.
De acordo com ele, a assembleia acontece em primeira convocação no dia 12, quando será necessário ter pelo menos 50% dos credores das três classes presentes. Caso não haja quórum, a assembleia será instalada com qualquer número no dia 19.
Para que o plano seja aprovado, é preciso que metade mais um dos credores de todas as três classes o aprovem. Caso rejeitem o plano, a empresa vai à falência, e a Justiça nomeia um administrador para tomar conta da massa falida.
Caso não haja acordo, a assembleia pode ser suspensa por até 90 dias.
Ali haverá o debate dos termos. O que for aprovado no final valerá para todos porque todos estão vinculados ao plano. Por isso ele tem de ser aprovado por maioria qualificada."
José Luiz Lindoso da Silva
À coluna, a OAM afirmou que está confiante na aprovação do plano de recuperação judicial.
Sobre os acordos e pagamentos extrajudiciais a credores, a organização diz que ela "foi autorizada pelo juízo da recuperação judicial e está amparada pela Lei n. 11.101/2005, que regula a Recuperação Judicial".
"Ademais, a petição dos credores foi protocolada após o prazo de objeções", completa.
O senador Fernando Collor foi procurado, mas disse que não comenta sobre o processo de recuperação judicial.
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