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Fila, sapato rasgado e sonho: fãs enfrentam saga para ver Lula em Garanhuns
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Edilza Francisco de Lima, 59, se arrumou e saiu cedo de sua casa em Alagoinha, no semiárido pernambucano, para uma viagem de mais de uma hora de ônibus até Garanhuns (a 78 km de distância). Apesar de ela estar acostumada com o trajeto, não foi um dia comum, porque ela ia realizar um antigo desejo: "Era o meu sonho na vida ver Lula", conta.
Ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esteve em sua terra natal e, conforme tem repetido em suas visitas pelo Nordeste, atraiu um grande público, com caravanas de várias cidades. Não houve número de presentes estimado pela polícia nem pelo PT.
Mesmo depois de uma hora na fila na porta da Arena 177 e mais três horas para Lula falar, ela não desanimou. Repetindo gritos com o público, como o tradicional "olê, olê, olê, olá" e "Lula lá", ela esperou pacientemente até as 14h, quando o ex-presidente foi anunciado para discursar.
Das 10h até a fala de Lula, sol e a chuva se intercalaram: até o fim do ato choveu por cinco vezes. Mas a instabilidade do clima ou o local sem cobertura não atrapalharam a empolgação do público.
"Meu pai era ferroviário e sempre falava: é Lula quem pode consertar esse país. E ele estava certo. Não só consertou como vai consertar de novo", diz.
Ela justifica a paixão por Lula com a mudança na vida dela e das pessoas pobres em seu governo. "Minha filha se formou como enfermeira em Jaboatão dos Guararapes [onde a família morava, no Grande Recife] pelo Prouni, graças a Lula. Meu filho se formou em biologia aqui, em Garanhuns, e hoje é funcionário público", afirma.
"Antes de Lula, meus filhos não tinham uma cama para dormir. Depois de Lula, comprei cama, comprei sofá. Hoje sou aposentada, graças a Deus."
Segundo ela, o ônibus que levou a caravana foi cedido pela prefeitura. Aliás, na área destinada aos veículos com eleitores, muitos ônibus eram escolares, mas nenhum foi identificado pela coluna com logotipo de prefeituras ou outro ente público.
Com ela, estava Edilma do Nascimento, que, ao final, contou como a amiga recebeu a fala de Lula. "Ela ficou muito emocionada, foi uma maravilha", diz.
Fernando Gomes da Silva, 74, veio da vizinha São João e, apesar da saúde debilitada, fez questão de pegar a fila e esperar para ver aquele que, para ele, foi o "melhor presidente que o Brasil já teve".
"A vida toda votei em Lula, nunca a gente teve tanta coisa no país e vim para dizer que voto e apoio ele de novo", diz. "Nunca tinha visto ele, mas hoje vejo", afirmou, na longa fila para entrada.
Saga para entrar e atrasos
Na entrada, todos os presentes tiveram de passar por uma revista com detectores de metal. Muita gente não entrou porque o local lotou. A saída foi ver as falas pelo telão montado no meio da área destinada ao público.
A fala de Lula ocorreu cinco horas após o horário marcado, às 9h. Por conta disso, muita gente acabou desistindo e deixarando o local. Antes de Garanhuns, ele foi até Caetés —cidade vizinha, onde nasceu e à época era um distrito de Garanhuns—, causando uma longa demora.
Pela quantidade de gente, aconteceram alguns imprevistos. "Ficamos quase uma hora na fila e, quando fui entrar, meu sapato quebrou: pisaram no meu pé. Era muita gente, mas faz parte", conta Edileuza Santos, 67, que veio de Cabo do Santo Agostinho (a 205 km), na região metropolitana do Recife.
Hoje Lula vai ao Recife, onde Edileuza disse que pretende ir também. "Eu vi Lula todas as vezes que pude em Pernambuco. Eu estava lá quando ele lançou a pedra fundamental em [complexo portuário e industrial] Suape [entre os municípios de Cabo de Santo Agostinho e Ipojuca]. Foi Lula quem trouxe aquelas empresas e esse [Jair] Bolsonaro acabou com tudo", reclama.
Ao lado do marido, Maurício Vicente, 69, ela usava um adesivo da pré-candidata Marília Arraes (SD), que não tem o apoio oficial de Lula. "Apoiar Danilo Cabral [do PSB]? Deus me livre, ele está com [o governador] Paulo Câmara, que foi péssimo para Pernambuco", diz.
Com a presença de Lula e grande público de eleitores, muitos pré-candidatos aproveitaram para divulgarem seus nomes. A ação de Marília Arraes foi, sem dúvida, a que mais mobilizou pessoas e chamou a atenção do lado de fora.
Com um megafone, um cabo eleitoral dela gritava "é Lula lá, Marília cá". Adesivos foram distribuídos, com boa aceitação de eleitores que descartavam o apoio a Danilo Cabral. "Voto nela porque conheço conheço desde o avô [o ex-governador] Miguel Arraes", conta Kleber Gutemberg, 22.
Segundo Jefeton Monteiro, ex-vereador de Jupi e integrante do comitê de campanha Marília no Agreste de Pernambuco, foram 2.000 adesivos levados para o ato. Uma hora antes de o evento começar, eles estavam acabando. "Já mandei pegar mais, porque não deu conta", conta.
Dentro da arena, a maioria dos eleitores presentes apoiava Marília, e não o candidato de Lula. Bastava sair o nome de Danilo Cabral no palco para que as vaias surgissem e predominassem. Um grupo ligado a ele ficou na parte de frente ao palco e tentava abafar as manifestações contrárias.
Na transmissão oficial, isso foi imperceptível, mas, em vários momentos, além das vaias a Danilo e a integrantes do PSB, ecoaram gritos em prol de Marília.
Lula, porém, foi incisivo em sua fala, dizendo logo no começo que o motivo de estar em Pernambuco era seu candidato. "E esse candidato é Danilo Cabral", afirmou para um misto de aplausos, vaias e silêncio da plateia. Em seguida, o coro de Marília ecoou de novo.
Foi o único momento, porém, que Lula foi contestado —minoritariamente neste momento— pelos seus conterrâneos do interior pernambucano. No mais, citou Ariano Suassuna e repetiu críticas a Jair Bolsonaro e pela defesa de legados do seu governo como o programa Minha Casa, Minha Vida.
Vendedores fazem a festa
Entre os eleitores, muitos vendedores aproveitaram para emplacar produtos com a imagem ou inscrição de Lula. Até isqueiros eram vendidos. O boné do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) custava R$ 10; mas bastava um pedido de desconto que saía negócio.
"Faz por cinco?", perguntou Maria de Lourdes Sobral, 64. Sem titubear, o vendedor do movimento tira um e dá a ela pelo valor reduzido. "Não tinha o dinheiro todo, mas aqui a gente se ajuda. Comprei porque sou agricultora aposentada e quero chegar com algo lá", conta, ainda na longa fila.
Mário Soares, 22, vendia toalhas, bonés e isqueiro. "Estou vendendo muito, está bom o negócio", conta ele, que veio de Caruaru, a 100 km de Garanhuns.
A camisa custava de R$ 20 a R$ 40. A bandeira não saia por menos de R$ 20, e o boné, R$ 10.
Cibele Kaillany, 16, foi ao evento com a mãe e compraram boné e toalha de Lula. "Hoje é o aniversário dela. Tem presente melhor do que trazer para ver Lula?", diz a mãe, a cabeleireira Julianore de Araújo, 36, que comprou um boné e uma camisa. "Sou aqui de Garanhuns e é um orgulho imenso recebê-lo aqui de novo", conta.
Lula encerra hoje sua passagem por Pernambuco e se encontra com integrantes da cultura popular do estado, no Recife. À noite, pode participar da convenção do PT que vai homologar sua candidatura à Presidência.
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