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Carlos Madeiro

REPORTAGEM

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Fazenda de senador bolsonarista invade Terra Indígena em RO, diz ONG

Empresário Jaime Bagattoli (PL-RO), senador por Rondônia - Divulgação
Empresário Jaime Bagattoli (PL-RO), senador por Rondônia Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

15/06/2023 04h00Atualizada em 15/06/2023 12h54

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O senador bolsonarista Jaime Bagattoli (PL-RO) é sócio-proprietário de uma empresa que detém uma fazenda que invade à área da TI (Terra Indígena) Rio Omerê, em Corumbiara (RO), segundo um dossiê divulgado ontem pelo observatório De Olho nos Ruralistas.

O que aconteceu

Bagattoli é sócio com o irmão na Transportadora Giomila, que integra o Grupo Bagattoli. A empresa possui a fazenda São José, que se sobrepõe à terra indígena. A informação está no levantamento "Os Invasores - Parte 2", que analisou parlamentares e seus financiadores donos de propriedades que invadem TIs. A ONG cruzou bases de dados fundiários do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).

A TI Rio Omerê tem 26 mil hectares, está homologada desde abril de 2006 e abriga os sobreviventes dos povos akuntsu e kanoê. Invasões a partir dos anos 1970 quase dizimaram as etnias.

A invasão do território ocorreu em novembro de 2007, um ano após a homologação da TI e antes de a empresa dona da fazenda à época passar a posse à família do senador. Segundo o observatório, à época, a São José Jacuri Agropecuária, então titular da área, protocolou um registro do imóvel que invadiu 2.591 hectares da terra indígena (o equivalente a 3.628 campos de futebol). Essa área aparece até hoje nos registros do Incra.

Mapa terra indígena Rio Omerê - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

O imóvel, cita o observatório, possui um "histórico suspeito, com dois pedidos de registro em sequência, logo após a homologação da TI." A suspeita é que tenha havido grilagem antes de o senador adquirir a fazenda.

O UOL tentou por dois dias contato com o senador por meio de sua assessoria, mas não obteve resposta. Também não conseguiu localizar os representantes do Grupo Bagattoli.

Ainda segundo o relatório, outros 41 políticos e familiares de primeiro grau são titulares de fazendas que ficam dentro de terras indígenas, o que constitui uma irregularidade do ponto de vista legal.

Imagem da área da fazenda que teria sobreposição a TI - Reprodução - Reprodução
Imagem da área da fazenda que teria sobreposição a TI
Imagem: Reprodução

Registros oficiais apontam área irregular divergente

O observatório De Olho nos Ruralistas afirma que a fazenda foi adquirida pelos Bagattoli em 2011, por meio da penhora de uma dívida contraída pelos antigos proprietários.

Os dados consultados pela ONG no CAR (Cadastro Ambiental Rural), um registro autodeclaratório, informa que a área irregular dentro da TI é bem menor (de 0,5 hectare ou 5.000 m²) que a informada ao Incra (2.591 hectares).

Criado com o Código Florestal, o CAR é um registro público obrigatório para todos os imóveis rurais, mas não tem valor fundiário, como o Incra. A finalidade dele é integrar as informações ambientais dessas posses rurais com o controle e monitoramento ambiental.

Jaime Bagattoli discursa no Senado - Jefferson Rudy/Agência Senado  - Jefferson Rudy/Agência Senado
Jaime Bagattoli discursa no Senado
Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Quem é Jaime Bagattoli

Ele é um empresário catarinense do agronegócio e foi eleito senador por Rondônia em 2022 pela primeira vez (em 2018 ficou em terceiro lugar). Tem se destacado com projetos de interesse da bancada ruralista da qual faz parte.

Apoiador de Jair Bolsonaro, Bagatolli tem patrimônio declarado de mais de R$ 55 milhões e é dono do Grupo Bagattoli, com sede em Vilhena (RO).

Em 19 de abril de 2023, Dia dos Povos Indígenas, Bagattoli propôs dois projetos de lei: o primeiro pretende garantir ao fazendeiro o direito de 'solicitar diretamente o uso de força policial para a retirada dos invasores, independentemente de ordem judicial'; o segundo altera o Código Penal para incluir na seção de crimes contra o patrimônio a invasão de propriedades rurais."
Relatório do Observatório

Quem são os povos ameaçados

Os povos indígenas akuntsu e kanoê pertencem ao tronco linguístico Tupi-Guarani, mas são etnias diferentes.

Os akuntsus, até meados da década de 1990, viveram isolados, até que no final daquela década o contato com fazendeiros e madeireiros resultou em um violento conflito que levou à morte de grande parte da tribo. Apenas cinco akuntsus sobreviveram: um casal mais velho e três irmãos.

Já os kanoê são um grupo um pouco maior, com cerca de 60 membros. No final da década de 1970, eles também sofreram com a invasão de suas terras e conflitos com madeireiros.