Carlos Madeiro

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Juiz usa nova lei e manda INSS pagar pensão a criança órfã por feminicídio

A Justiça Federal concedeu a uma criança de 7 anos que vive em Ipubi, no sertão pernambucano, o direito de pensão especial de um salário mínimo (R$ 1.412 no valor atual) a ser paga pelo INSS. A mãe dela foi morta a tiros em 2020 pelo então marido e pai.

A sentença, dada no último domingo (18), teve como base a lei 14.717/2023, sancionada por Lula em 31 de outubro de 2023, que garante o benefício a filhos ou dependentes órfãos em razão do crime de feminicídio e cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a um quarto do salário mínimo.

O Estado brasileiro deve cumprir concretamente suas obrigações, motivo pelo qual não pode se esconder atrás da desculpa da falta de regulamentação da legislação. Pensar em sentido contrário é dar o poder para o devedor escolher arbitrariamente quando pagará aquilo que deve.
Henrique Jorge Dantas da Cruz, juiz federal substituto da 27ª Vara Federal, na sentença

À coluna, a Superintendência Regional do INSS no Nordeste informou que ainda não recebeu a intimação referente ao processo e que a Procuradoria-Geral Federal é quem vai avaliar a possibilidade de recurso.

O pai da criança está preso desde o crime e foi condenado pelo assassinato da ex-companheira a uma pena de 34 anos pelo feminicídio e 2 anos e 3 meses pelo porte ilegal de arma.

Entenda o caso

O pedido de pensão foi feito pela avó materna da criança, que é agricultora e ficou responsável pela guarda após o assassinato da mãe.

Antes de procurar a Justiça, ela fez o pedido de pensão diretamente ao INSS, mas teve a solicitação negada porque a mãe não teria feito as contribuições devidas para se tornar segurada do RGPS (Regime Geral de Previdência Social).

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Inicialmente, o pedido também foi negado pela Justiça Federal pelo mesmo motivo.

Segundo o advogado da criança, Aracildo Feitoza, a mãe prestava serviço à administração pública, mas recebia um valor menor do que salário mínimo e o empregador não repassava as contribuições para o INSS.

Inicialmente, diz, a ação foi proposta para questionar o não repasse das contribuições e para que a família tivesse direito a complementar o valor recolhido — a fim de viabilizar o direito ao benefício.

Nós estávamos questionando porque o INSS não deu a oportunidade para a menor ou sua representante legal complementar os valores das contribuições, já que caberia ao INSS fiscalizar o empregador.
Aracildo Feitoza, advogado

Durante o trâmite do processo, os advogados da criança decidiram mudar o pedido de pensão por morte para a pensão especial prevista na nova lei.

Com isso, a Justiça determinou que o INSS deve incluir a criança na lista de beneficiários até 15 de março, com pagamento retroativo do benefício de um salário mínimo a 31 de outubro de 2023.

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Em razão dessa tragédia, ela está privada, de forma sempiterna [pepétua], da companhia e do afeto de sua mãe. É uma situação de vulnerabilidade interseccional, pois a autora sofre como criança órfã, como pessoa de baixa renda e como vítima indireta de feminicídio e direta do esfacelamento da sua família.
Henrique Jorge Dantas da Cruz, em sentença

O que diz a nova lei

A lei, de autoria da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), foi aprovada pelo Senado no início de outubro. O texto sancionado por Lula em 31 de outubro do ano passado institui pensão especial aos filhos e dependentes menores de 18 anos de idade, órfãos em razão do crime de feminicídio, cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a um quarto do salário mínimo.

O benefício, no valor de um salário mínimo, vai ser pago ao conjunto dos filhos e dependentes, mediante solicitação, a partir da data do óbito da mulher, sempre que houver "fundados indícios de materialidade" do crime. Fica vedado ao autor, coautor ou partícipe do crime representar as crianças ou adolescentes.

Caso seja verificado durante o processo judicial, com trânsito em julgado (quando não há mais possibilidade de recorrer), que não houve o crime de feminicídio, o pagamento do benefício cessará imediatamente. O beneficiário, porém, não será obrigado a ressarcir o valor, exceto em caso de má-fé.

*(com informações de Giovanna Galvani, do UOL)

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