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Carlos Madeiro

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Reportagem

Jogo do Tigrinho: como plataformas aliciam e pagam influencers em 7 etapas

A Polícia Civil de Alagoas descobriu e mapeou um esquema montado por plataformas de jogos online, como o Tigrinho, que usava influenciadores famosos no Brasil e que pagava valores milionários para que eles divulgassem jogos, proibidos no país, que seriam programados para o usuário perder.

A polícia descobriu que, em apenas nove meses, quatro influenciadores de Alagoas movimentaram R$ 38 milhões. "Temos casos de pessoas que estão nisso há dois anos, então esse valor é bem maior", conta o delegado de Estelionatos, Lucimério Campos.

Nesta segunda-feira (17), a polícia deflagrou a Operação Game Over, que mirou 12 alvos, entre influenciadores, agenciadores e intermediárias da fraude. Os mandados foram expedidos pela 17ª Vara Criminal, que determinou a busca e apreensão de bens.

Policiais na porta de um dos suspeitos durante operação Game Over
Policiais na porta de um dos suspeitos durante operação Game Over Imagem: Polícia Civil de Alagoas/Divulgação

Segundo o delegado, as investigações avançaram após a autorização para fazer quebras de sigilo telefônico, que apontaram para um esquema sofisticado para lesar pessoas que acreditavam na veracidade desses jogos.

No começo da investigação, vimos que havia um fluxo financeiro interessante, com muito dinheiro devolvido para a plataforma. Isso chamou a atenção.
Lucimério Campos

A partir daí, a polícia montou um quebra-cabeça, que a levou a descobrir um golpe executado em sete fases. Veja como era:

Etapa 1: o primeiro contato

Nessa primeira etapa, as plataformas (sempre registradas fora do país) contatam intermediadores no Brasil, explicando as formas de contratação e como eles devem cooptar pessoas para divulgação dos jogos.

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O delegado explica que, como os donos das plataformas não ficam no Brasil, eles abrem aqui uma fintech (abreviação de financial technology), que são bancos digitais.

Eles criaram isso para agenciar os pagamentos e receber dinheiro no país. Com elas, existe a facilidade para operacionalizar o sistema aqui.
Lucimério Campos

Carros de luxo apreendidos na operação Game Over, em Alagoas
Carros de luxo apreendidos na operação Game Over, em Alagoas Imagem: Polícia Civil de Alagoas/Divulgação

Etapa 2: chegando aos influenciadores

Em um segundo momento, os assessores dos influenciadores são contatados por agenciadores dessas plataformas, que apresentam as formas possíveis de publicidade e detalhes dos contratos.

Em uma das gravações capturadas pela polícia, um dos agenciadores conversa e explica que o contrato é feito sempre de modo "informal" —já que esse tipo de jogo é uma atividade ilícita.

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Inicialmente, os influenciadores recebiam valores extremamente altos, de até R$ 300 mil por sete dias de divulgação em suas redes sociais. Depois, o esquema foi se descentralizando, com pessoas menos influentes divulgando e com valores menores.

Em uma das conversas grampeadas, uma influenciadora oferece seus serviços por R$ 80 mil por cinco dias. "Eles faziam a divulgação por meio da conta deles, mas hoje a coisa banalizou mais, e as plataformas estão cooptando qualquer um [influencer]."

Além do famoso Jogo do Tigrinho, esses influenciadores divulgam outros jogos similares, como o do Touro e do Coelho. "Mas é o mesmo esquema: recebem o link programado na conta demo, que sempre consegue ganhar. A gente testou ele aqui na polícia, e viu que sempre ganha", explicou o delegado.

Etapa 3: as contas programadas

Na terceira etapa, quando os detalhes são acertados, os influenciadores recebem das plataformas o link de uma conta demo, programada para sempre ganhar. "Só que eles divulgam o link real da aposta, e a pessoa abre uma conta diferente, programada para perder.

Nesses jogos, diz o delegado, o apostador sempre leva desvantagem. "Existe até aqueles que ganham alguma vez, mas nunca nem perto do dinheiro que esses [influenciadores] mostram, é sempre a bancarrota. Não tem ninguém que ficou rico com esses jogos, só os influenciadores.

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Etapa 4 começam os jogos

Com as contas demo ativadas, os influenciadores começam a jogar e a divulgar em suas redes sociais supostas atividades com esses jogos, e sempre mostrando "ganhos" com eles.

Em uma conversa grampeada, uma agenciadora pede que uma influenciadora coloque o "despertador do celular" para não esquecer o horário. Além disso, pede que sempre faça postagens "feliz" e ensina como fazer para ludibriar pessoas: que terceiros façam as gravações, parecendo sempre algo registrado por acaso.

Além de receber pela divulgação, a gente descobriu que esses influenciadores também recebem um percentual em cima das pessoas que começaram a gastar nesses cassinos virtuais.
Lucimério Campos

Ela diz como quer que a pessoa faça, e a obrigação do influenciador é simular que está ganhando. "Eles lucram também com a fraude, só quem não ganha é quem está apostando", destacou.

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Para conseguir isso, os influenciadores ficam divulgando falsos ganhos, com intuito de cooptar mais pessoas para jogar nessas plataformas.

Etapa 5: os "saques"

Após divulgarem os vídeos com as "vitórias" nos jogos, os influenciadores começam a divulgar saques fraudulentos.

Segundo apurou a polícia, eles simulam sacar valores que, na verdade, são comissões de captação de usuários ou pagamento feito pelas plataformas pela publicidade.

jogo do tigrinho
jogo do tigrinho Imagem: Reprodução

Etapa 6: persuasão

Em uma nova fase, após ganharem muito dinheiro com o jogo, os influencers começam a contar histórias de que viviam em dificuldades e a citar que estão conseguindo melhorar de vida graças ao ganho dos jogos.

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Nesse momento, a polícia percebeu que eles usam sempre uma argumentação pessoal e persuasiva para que os usuários acreditem que é possível superar as dificuldades financeiras de forma rápida e fácil.

As gravações mostram, de forma muito clara, como eles simulam jogos que viciam. Eles divulgam sabendo que as pessoas vão perder.
Lucimério Campos

Etapa 7: a ostentação

Por fim, para tornar tudo ainda mais verossímil, os influenciadores começam a postar fotos de viagens, carros de luxo, por exemplo.

Nesse período em que prestavam serviços, os influenciadores ganharam dinheiro fruto da fraude, que justifica o salto de ostentação.

Eles tinham ganhos altos porque estamos falando de pessoas com engajamento alto, com mais de 1 milhão de seguidores. Então, quando ele coloca o link, o potencial de retorno é muito grande, dava um lucro vertiginoso.
Lucimério Campos

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Lancha apreendida na operação Game Over, em Alagoas
Lancha apreendida na operação Game Over, em Alagoas Imagem: Polícia Civil de Alagoas/Divulgação

Uma prova do alto lucro é que a operação apreendeu três carros de luxo (um Corvette avaliado em R$ 1,4 milhão), uma lancha, além de celulares e dinheiro. Além disso, a polícia pediu bloqueio de um terreno à beira-mar avaliado em R$ 3 milhões.

Operação serve de alerta, diz delegado

Para Lucimério Campos, mais do que desbaratar uma organização, a operação tem um caráter didático. "A gente não quer só a despatrimonialização dos envolvidos, mas deixar um recado de um órgão confiável, como a polícia"

Os investigados estão sendo indiciados por estelionato, contravenção de jogo de azar, lavagem de dinheiro e organização criminosa.

Ele ainda faz um alerta a pessoas com muitos seguidores que estão recebendo contato de agenciadores dessas plataformas para divulgar esse tipo de jogo.

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A pessoa que aceita e faz está no risco: basta uma vítima dizer, ou a polícia mesmo descobrir ao investigar. Temos aí um grupo de 40 influenciadores mapeados que serão alvo de ações em breve aqui em Alagoas.
Lucimério Campos

Como os nomes dos investigados e das plataformas não foram divulgados, o UOL não teve como procurar os suspeitos investigados.

Reportagem

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