Collor zera contas, mas Justiça tira R$ 478 mil de esposa para pagar dívida
A esposa do ex-presidente Fernando Collor teve R$ 478 mil retirados de suas contas bancárias para pagar um débito trabalhista a uma ex-funcionária da TV Gazeta, afiliada à Globo em Alagoas. A jornalista, que está com câncer, recebeu o dinheiro na última quinta-feira (4), exatos cinco anos após sua demissão.
O valor havia sido penhorado das contas de Caroline Serejo Medeiros Collor de Mello em setembro de 2023 por decisão da juíza substituta da 5ª Vara do Trabalho de Maceió, Natália Azevedo Sena. O bloqueio foi confirmado, após recurso, pelo TRT (Tribunal Regional do Trabalho) de Alagoas.
Casada com Collor há 19 anos, Caroline foi acionada no processo por conta do não pagamento de valores devidos a ex-trabalhadores da TV Gazeta, a qual Collor é sócio majoritário. Isso levou a desconsideração da personalidade jurídica da empresa.
Na prática, isso faz com que os débitos passem a ser cobrados diretamente às pessoas que são proprietárias da empresa, gerando assim bloqueio de bens pessoais.
Caroline, no caso, foi acionada porque é sócia da TV Mar, uma emissora local que também pertence à OAM (Organizações Arnon de Mello). A Justiça a incluiu porque reconheceu a TV como parte do mesmo grupo econômico.
Antes do bloqueio, houve tentativa de bloquear valores nas contas de algum sócio da TV Gazeta, mas como não houve sucesso, a Justiça expandiu as buscas a bens de sócios das outras empresas da organização.
No caso, a Justiça foi até as contas de Fernando Collor, mas achou apenas R$ 14,97 —o que indicou uma possível retirada de valores para não ter bens confiscados.
Constatado o esvaziamento patrimonial praticado pelo sócio Fernando Affonso Collor de Mello, como também de blindagem patrimonial, entendo devidamente justificada a medida cautelar requerida.
Decisão da juíza Natália Azevedo Sena
Caroline recorreu do bloqueio pedindo a nulidade do processo, alegando que não foi citada nominalmente. Após reforma da decisão, ela foi citada no dia 16 de maio, mas não fez o depósito voluntário em juízo no prazo de cinco dias, e o dinheiro acabou sendo retirado das contas bloqueadas.
Procurada, a advogada de Caroline não respondeu as mensagens.
Luta pelo dinheiro
A funcionária em questão foi demitida em julho de 2019, junto com outros profissionais, logo após uma histórica greve dos jornalistas de Alagoas em protesto à ideia de reduzir em 40% o piso da categoria no estado.
Em 2021, ela obteve a condenação da Justiça do Trabalho à TV para ter direito não só a verbas rescisórias não pagas, mas danos morais por prática de assédio moral. A sentença trouxe palavras duras.
Da conduta perpetrada pela reclamada, extrai-se que, muito embora pareça se constituir um conglomerado econômico relevante, dada a tradição e a difusão que possui em todo Estado de Alagoas, também possui traços imanentes de uma cultura retrógrada, com nítidos resquícios escravocratas, que buscam castigar seus trabalhadores, quando, por meio da paralisação parcial dos serviços, eles postulam algo a mais do que já lhe é retribuído.
Nilton Beltrão de Albuquerque Junior, juiz do Trabalho
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Quero receberA jornalista pediu para não ter o nome revelado, mas se disse aliviada com o recebimento.
Eu fui uma das poucas credoras que decidiu não fazer acordo, porque eu estava lutando pelos meus direitos e por questão de dignidade. Eu queria levar esse processo até o final, principalmente por conta do assédio moral. Eu não fui a única pessoa a sofrer isso, mas nem todo mundo denunciou por medo de represália porque a gente vive num num estado onde o poder político ainda fala mais alto.
Jornalista indenizada
No caso, ela cita que parte dos ex-funcionários receberam parte dos valores após aceitarem acordos dentro do processo de recuperação judicial que a OAM está desde 2019. Quem fez acordo, no caso, abriu mão de parte da dívida.
Segundo o advogado Marcos Rolemberg, que defende 30 ex-funcionários da OAM que ainda têm dinheiro a receber e não aceitaram acordos, seis já tiveram sentença transitada em julgado para receber valores e esperam agora o bloqueio de bens dos sócios para receber as verbas devidas.
Esses trabalhadores já foram muito castigados com o tempo sem receber absolutamente nada. Temos a convicção de que o dinheiro existe, o que não existe é vontade de pagar. Que essa vitória agora sirva de esperança para que os trabalhadores sigam. Não importa se o empregador é um comerciante ou um ex-presidente.
Marcos Rolemberg
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