Brasil tem mais de 800 municípios com mais eleitores que habitantes em 2024
O Brasil tem 849 municípios com mais eleitores para votação de 2024 que habitantes, ou 15,2% do total. O dado foi obtido pela coluna após cruzar os números mais recentes da população estimada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e com o de pessoas aptas a votar em outubro.
O IBGE divulgou, nesta quinta-feira, a nova população estimada de todos os 5.570 municípios brasileiros, com o país alcançando 212,6 milhões de moradores. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) divulgou em julho que 155,9 milhões(73,3%) dessas pessoas são eleitores aptos para ir às urnas em outubro.
O número de municípios com mais eleitores que habitantes é maior que o de 2022, quando a estimativa do IBGE estava defasada e era feita com base no Censo de 2010. Naquela eleição, eram 579 cidades nessa condição, pouco mais de 10% do total.
Apesar da diferença, especialistas, TSE e IBGE afirmam que a diferença é normal, já que existem migrações e diferenças no conceito de domicílio civil e eleitoral (leia mais abaixo).
Casos que chamam a atenção
A cidade com maior diferença em termos absolutos é Tibau do Sul (RN), cidade litorânea que é uma das 53 do país que têm mais residências vazias que ocupadas, segundo dados do Censo 2022.
O município se caracteriza por ter uma intensa atividade de veraneio, e muitas casas são ocupadas apenas ocasionalmente em períodos de férias ou feriados, por exemplo.
Em termos proporcionais, a cidade com maior diferença é Davinópolis (GO), que tem 1.901 moradores e 4.405 eleitores — ou seja, 131% mais pessoas aptas a votar que habitantes, segundo dados do IBGE e do TSE.
Cidades de menos de 20 mil habitantes
A pedido do UOL, os dados foram analisados por Járvis Campos, do Programa de Pós-Graduação em Demografia da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e coordenador do Comitê de Projeções e Estimativas Demográficas da Associação Brasileira de Estudos Populacionais.
Ele afirma que o percentual elevado não ocorre por problemas nas estimativas. "Muitas pessoas podem eventualmente ter a zona eleitoral nessas cidades, sendo residentes de outros municípios", explica.
Campos chama atenção para o fato de que isso ocorre em municípios de menor população, já que apenas seis dos 849 da lista possuem mais de 20 mil habitantes.
"São em grande parte municípios com potencial turístico ou que possuem uma dinâmica específica, com uma elevada proporção de domicílios de veraneio", pontua.
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Quero receberEntre os municípios, Campos ainda cita que 74% possuem até 5 mil habitantes. "Uma parcela significativa desses municípios é marcada por perdas de população, principalmente de jovens que emigram em busca de trabalho", diz.
São municípios marcados por um contexto de estagnação econômica, e uma parcela desses emigrantes mantém o município como local de votação, pois, normalmente, leva-se um tempo para a mudança do registro.
Járvis Campos (UFRN)
IBGE cita diferença de fontes
O coordenador técnico do Censo Demográfico, Gustavo Junger Silva, afirma ao UOL que as metodologias utilizadas por IBGE e TSE são "substancialmente" diferentes: o IBGE conta da população residente utilizando métodos censitários rigorosos, enquanto o número de eleitores é baseado em registros administrativos mantidos pelo TSE. Por isso, diz, "é natural que existam discrepâncias entre os dados populacionais e os números de eleitores".
Embora importantes do ponto de vista da gestão de serviços públicos, esses registros não foram criados para contar pessoas residentes em determinada localidade, em um ponto específico no tempo, o que inviabiliza sua utilização para esses fins.
Gustavo Junger Silva (IBGE)
Segundo ele, o conceito de domicílio para o direito eleitoral não é o mesmo com o de domicílio para o direito civil, nem com o conceito de domicílio utilizado pelo IBGE. Silva ainda alega que, além disso, a legislação não exige que o eleitor atualize o domicílio eleitoral ao mudar de município.
"Enquanto o domicílio civil é mais restrito e atrelado ao local onde a pessoa reside de fato, o domicílio eleitoral é mais amplo, permitindo que o eleitor escolha seu local de votação com base em vínculos afetivos, familiares ou de trabalho, mesmo que não resida mais naquele município", diz.
Essa diferenciação traz uma série de consequências benéficas aos eleitores e aos candidatos, pois permite uma flexibilidade que não seria possível caso a legislação eleitoral fosse estritamente vinculada ao conceito de domicílio civil.
Gustavo Junger Silva
TSE só averigua em casos de suspeita de fraude
Em nota, o TSE explicou que o tema é tratado em resolução de 2021, que se estabelece que o vínculo de um eleitor com a cidade que vota "pode ser afetivo, familiar, profissional, comunitário ou de outra natureza que justifique a escolha do município".
"Devido a essa flexibilidade da legislação, é possível que o local onde o eleitor ou a eleitora vota não seja obrigatoriamente onde mora", diz a nota.
Ainda segundo o TSE, uma revisão do eleitorado pode ser determinada apenas "caso haja denúncia fundamentada de fraude" no alistamento de zona ou município ou em hipótese extra para análise "com base em dados estatísticos, cuja competência é exclusiva do TSE".
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