Barrado no TSE após vencer em 2020, cacique prova inocência e vira prefeito
Há quatro anos, após comemorar a eleição para prefeito de Pesqueira, agreste de Pernambuco, o cacique Marcos Xukuru (Republicanos) foi declarado inelegível pela Lei da Ficha Limpa. Ele havia sido condenado em segunda instância por crime contra o patrimônio privado, por incendiar uma casa em 2003 — acusação que sempre negou.
Mas, no ano passado, a condenação foi anulada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça). E, este ano, Xukuru decidiu disputar novamente a prefeitura.
Venceu outra vez, com o mesmo percentual de 2020 — 51% dos votos válidos. Dessa vez, com a condenação anulada, Xukuru vai poder assumir o cargo. Será o primeiro indígena prefeito de Pesqueira, onde três de cada dez habitantes são indígenas. Sua prioridade, diz, é calçar ruas, ampliar o saneamento básico e gerar emprego e renda.
Para aqueles e aquelas que não queriam ver o índio, ver a agricultora na prefeitura, estão vendo e vão ver por quatro anos, porque agora não tem essa questão. Eu sou prefeito dessa cidade! Eu sou prefeito dessa cidade, eu sou prefeito do meu povo!
Cacique Marcos Xukuru, em discurso após ser eleito prefeito, no domingo (6)
Eu me sinto com sensação de dever cumprido. Esse tempo todo estive respeitando as instituições, aguardando as decisões da justiça -- tanto eleitoral como criminal. O povo de Pesqueira refez o caminho de quatro anos atrás, cumprindo seu papel de fazer justiça.
Cacique Marcos Xukuru, em entrevista ao UOL
Essa eleição veio com enfrentamento a tudo e todos dessa elite política, que não queriam me ver sentar na cadeira de prefeito. Rompemos barreiras, e essa eleição é histórica, aumenta minha responsabilidade. Meu desafio é mostrar capacidade de gestão e política.
Cacique Marcos Xukuru, em entrevista ao UOL
Cidade teve novas eleições em 2022
Após as eleições de 2020, com Xukuru inelegível, o presidente da Câmara, Bal de Mimoso (Republicanos), aliado do cacique, assumiu a Prefeitura.
Xukuru recorreu da inelegibilidade, mas perdeu. Em agosto de 2022, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) negou o último recurso do cacique. E determinou que uma nova eleição fosse feita na cidade.
O novo pleito ocorreu em outubro de 2023, junto com as votações federal e estadual. Bal de Mimoso venceu e concluiu o mandato.
Já em agosto de 2023, o STJ reconheceu que o cacique foi vítima de erro judiciário e anulou a sentença por incendiar uma casa. Segundo a decisão, faltaram provas e foram usados depoimentos de pessoas que tinham interesse na condenação do cacique.
Naquela época, houve um conflito dentro da etnia. O próprio cacique foi vítima de um atentado e quase foi morto. Na ocasião, casas foram incendiadas.
O candidato compara sua situação à de Lula, que teve as condenações anuladas e pode voltar a disputar as eleições em 2022. Apesar de ser filiado ao republicano, o prefeito eleito de Pesqueira é aliado do presidente.
Não só eu, mas várias pessoas que compõem nosso grupo fizeram a mesma leitura, de que eram muito semelhantes os acontecimentos [do cacique Marcos Xukuru e Lula].
Cacique Marcos Xukuru
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Quero receberBrasil foi condenado por violar direitos do povo Xukuru
Cacique Marcos Xukuru foi uma das lideranças do processo de reconhecimento e demarcação do território da etnia em Pesqueira.
A demora no processo levou a uma condenação histórica do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos, ligada à OEA (Organização dos Estados Americanos).
A sentença, publicada em 2018, obrigou o Brasil a pagar US$ 1 milhão ao povo Xukuru — o que ocorreu no mesmo ano.
"Foi um processo de longos anos, com ameaças e descaso. Entramos com ação na OEA, que acabou chegando até a Corte, e o Brasil se tornou réu. Foi uma decisão que contribuiu para outros povos pelo Brasil e na América Latina", afirma o cacique. "Nós, xukurus, saímos de uma condição sub-humana, recuperamos nosso território, nossa autoestima".
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