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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Professores são essenciais somente para enfrentar a covid-19?

Aula na pandemia - iStock
Aula na pandemia Imagem: iStock

Colunista do UOL

19/04/2021 15h31

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Nesses meses trágicos de pandemia, o que antes era conhecido como rotina virou de pernas para o ar. Quase tudo ganhou novo significado: o trabalho, a vida social. Até algumas palavras.

Antes, classificar algo como "essencial" era uma referência positiva. Hoje, pode ser muito ruim.

É o caso da Educação. Há muitas décadas, professores, pedagogos e todos aqueles interessados em construir um país decente reivindicam para o ensino o status de atividade essencial.

O objetivo com isso é conseguir condições mais favoráveis de aprendizado, melhor remuneração para os professores, aperfeiçoamento profissional, mais recursos pedagógicos.

Ao invés disso, o ofício de ensinar vem sendo desvalorizado.

Professores temporários tomam o lugar dos concursados, a PEC Emergencial permitirá que os mestres fiquem sem aumento por até 15 anos, a autonomia dos profissionais de educação é frequentemente colocada à prova e por aí vai.

Talvez isso explique resultado da pesquisa feita pela OCDE há dois anos, na qual apenas 2,4% dos alunos brasileiros de 15 anos manifestam interesse em ingressar na profissão. Dez anos antes, o porcentual era de 7,5%.

Na semana passada, deputados se movimentam para transformar a Educação em atividade essencial. Justamente agora, na pior fase da pandemia de covid-19, eles aprovaram regime de urgência para votar projeto que classifica várias profissões como essenciais. Entre elas está o magistério.

A preocupação não é melhorar a vida do professor, mas dar base legal aos governantes que querem reabrir escolas, apesar de todo risco da transmissão de coronavirus.

A argumentação desses parlamentares e de alguns especialistas é a de que tentam reduzir o prejuízo dos alunos, que já perderam muitas aulas. A gravidade da situação dos estudantes pobres, que sem poder ir ao colégio ficam em situação de vulnerabilidade ainda maior, é mais um peso nessa balança.

No entanto, como se sabe, não há perda maior que a vida.

Nada justifica colocar em risco profissionais do ensino — além dos próprios alunos e seus parentes — nesse momento crucial da pandemia, no país com maior número de mortes diárias em todo o mundo.

Fatos recentes desmentem a pregação de que as salas de aulas são locais seguros. Segundo dados analisados pelo grupo Rede Escola Pública e Universidade (Repu), a ocorrência de casos de covid-19 entre professores que voltaram ao trabalho presencial é três vezes maior que a média da população em geral na mesma faixa etária.

Há um mês, o sindicato paulista denunciou que 20 professores morreram depois de voltar às escolas.

Empurrar profissionais para um ambiente de alta taxa de contaminação antes que todos estejam vacinados não é uma forma sincera de considerá-los essenciais.

Diante das escolas fechadas, o prejuízo dos alunos é inegável. Mas o maior prejuízo, único reversível, é a covid-19 que pode causar.

Quem realmente considera os professores como essenciais, no sentido original da palavra, deveria se preocupar seriamente com isso