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MoÏse sofreu no Brasil barbárie que pensava existir só na guerra do Congo
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Existem dores que não podem ser traduzidas pelas palavras. Em momentos mais trágicos, o sofrimento se expressa também em gestos, em tremores, em movimentos aleatórios do corpo, como se a angústia provocasse uma espécie de convulsão.
Foi o que se viu na entrevista de um dos parentes do jovem congolês MoÏse Kabamgabe, de 24 anos, que morreu nas areias da Barra da Tijuca depois de ser espancado por pelo menos três homens que usaram até um taco de beisebol.
O rapaz que deu entrevista ao telejornal do SBT, também nascido no Congo e não identificado, tinha o corpo todo tomado pela dor ao falar do assassinato. Moïse foi a um quiosque para cobrar o pagamento de três dias de trabalho. Acabou dominado, torturado, teve os braços amarrados e continuou sendo agredido mesmo depois que desfaleceu.
"Ele trabalhava! A gente trabalha duro!", gritou à câmera o parente de Moïse, aos prantos, inquieto com tanta dor. "Fugimos da África. Aqui foi acolhido no Brasil, o Brasil é uma mãe, abraça todo mundo! É uma mãe, segunda casa? E como vai matar um irmão trabalhando? Justiça vai ter que ser feita!".
Na imagem que viralizou nas redes sociais, o rapaz consegue expressar todo o desespero da família e dos amigos de Moïse, que fugiram do Congo. Se refugiaram no Brasil para não serem aniquilados por combatentes que matam uns aos outros na guerra civil.
Não deu certo. "Mataram meu filho aqui como matam em meu país", disse a mãe de Moïse, Ivana Lay, ao jornalista Rafael Nascimento de Souza, do jornal O Globo.
A diferença entre o Brasil e o Congo é que no país africano a guerra étnica é declarada. Lá, a tribo hema é inimiga da tribo lendu. Aqui, sob aparência paradisíaca, dizem que não há guerra.
Na estranha paz brasileira, na grande maioria dos episódios de violência as vítimas são principalmente os pretos e os pobres - se for imigrante africano, há um risco a mais.
Infelizmente, a família de Moïse aprendeu de forma trágica que, para pessoas como eles, o Brasil pode ser tão bárbaro quanto a guerra congolesa, da qual fugiram.
Com um fator a mais de crueldade: chamamos de paraíso um lugar onde pessoas pobres e negras frequentemente são mortas a tiros ou trucidadas a golpes de beisebol, sem que os assassinos respondam por seus crimes.
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