Araújo diz que aproximação do Brasil é com EUA, não com Trump. Será?
Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, negou nesta quinta-feira (24), ao responder a uma pergunta da senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) na Comissão de Relações Exteriores do Senado, que a política externa do governo de Jair Bolsonaro para os Estados Unidos seja dependente de um alinhamento com o presidente americano Donald Trump. Será mesmo?
Araújo foi convidado a explicar na comissão o motivo da visita do secretário de Estado americano Mike Pompeu a Roraima, na semana passada, que foi interpretada por opositores e por ex-chanceleres como um ato político com o objetivo de influenciar as eleições presidenciais deste ano nos Estados Unidos.
"Não é fato que a proximidade do Brasil seja com Trump e não com os Estados Unidos", disse Araújo. "É o contrário, tudo que estamos fazendo com os Estados Unidos é de interesse permanente para os dois países. E um governo democrata provavelmente manteria esse mesmo enfoque, a menos que queiram trabalhar contra seus próprios interesses, o que tenho certeza que não seria o caso."
O chanceler brasileiro se referiu à possibilidade de que Trump não consiga se reeleger este ano e que a Casa Branca passe a ser ocupada pelo democrata Joe Biden, que está em vantagem nas pesquisas de intenção de voto.
É de se esperar que as palavras do chanceler nesse ponto se confirmem na prática. O mínimo que se deseja da política externa brasileira é que adote uma postura pragmática em relação aos Estados Unidos caso a presidência do país venha a ser ocupada por um democrata — já que, com o republicano Trump, o pragmatismo foi muitas vezes deixado de lado por veleidades ideológicas.
O governo Bolsonaro, é bom lembrar, rompeu com sua tradição diplomática para copiar a política externa de Trump em diversos episódios, desde a ideia de transferir a embaixada em Israel de Tel Aviv para Jerusalém até os esforços para enfraquecer instituições multilaterais, como a Organização Mundial de Saúde (OMS).
O presidente Jair Bolsonaro também se amparou na atitude negacionista de Trump em relação à pandemia do novo coronavírus para eximir-se de responsabilidades na gestão da crise de saúde pública e beneficiou-se com o fato de o republicano não se ter juntado ao coro internacional de críticas ao desmatamento na Amazônia.
Joe Biden, se eleito, não servirá como modelo para as políticas bolsonaristas e possivelmente não se calará na questão ambiental. Sua candidata a vice, Kamala Harris, já fez duras críticas, ainda que por vezes mal embasadas, às queimadas na Amazônia.
Chama a atenção na fala de Ernesto Araújo a noção de que a manutenção de uma boa relação entre Brasil e Estados Unidos dependa mais de quem venha a ocupar a Casa Branca do que do governo Bolsonaro. O chanceler diz que só haverá um distanciamento entre Brasil e Estados Unidos se um futuro governo democrata assim o quiser.
"A menos que queiram trabalhar contra seus próprios interesses", disse Araújo. O que isso significa? Que o governo brasileiro reagiria a críticas de Biden pela gestão ambiental como reagiu, por exemplo, Bolsonaro em discurso na ONU em setembro do ano passado, chamando a França de Emannuel Macron de "colonialista"?
A frase de Araújo soou como uma ameaça velada: não se metam conosco que isso é pior para vocês.
As discussões dos grandes temas de interesse global — e a questão ambiental é um deles — podem conter críticas e desavenças entre os países. Isso não necessariamente representa uma violação da soberania nacional e tampouco precisa levar a um esfriamento de relações bilaterais.
Espera-se que, caso Biden seja eleito nos Estados Unidos, a política externa brasileira realmente passe a ser pautada pelo pragmatismo — deixando de lado a postura de subserviência que existe hoje.
Se for assim, o Brasil terá mais a ganhar com um presidente democrata no comando da maior potência mundial do que ganha, atualmente, com um republicano, que entrega apenas migalhas ideológicas ao seu "aliado" brasileiro.
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