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Diogo Schelp

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Politizadas, Forças Armadas deveriam fazer nota de repúdio contra si mesmas

O presidente da república, Jair Bolsonaro, e Walter Braga Netto, ministro da Defesa - Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo
O presidente da república, Jair Bolsonaro, e Walter Braga Netto, ministro da Defesa Imagem: Mateus Bonomi/Agif/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

08/07/2021 13h05

Os verdadeiros responsáveis pela dilapidação da credibilidade e da boa imagem das Forças Armadas são os integrantes de sua cúpula que, ao longo dos últimos dois anos e meio, foram coniventes com a politização da instituição, não quem critica os resultados dessa conivência.

Uma dessas críticas partiu do senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI da Covid, durante o depoimento do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, nesta quarta-feira (7).

Aziz disse que "os bons das Forças Armadas devem estar muito envergonhados" com as suspeitas de falcatruas que recaem sobre alguns integrantes da instituição que atuam em cargos civis no governo.

Ora, qualquer um com a mínima capacidade de interpretação de texto percebe que Aziz não fez um ataque às Forças Armadas, e sim a uma parte de seus integrantes, o que ele chamou de "membros do lado podre" da instituição.

A nota de repúdio divulgada horas depois pelo ministro da Defesa, o general Walter Braga Netto, e assinada também pelos comandantes do Exército, da Aeronáutica e da Marinha, contudo, afirma ter havido um ataque vil, com uma "acusação grave, infundada e, sobretudo, leviana". Uma conclusão tão descabida e descolada da fala do senador Aziz que pode ser tranquilamente classificada como "mimimi".

Mas o "mimimi" dos comandantes é perigoso, pois contém a ameaça de uma instituição do Estado que detém as armas e poder de repressão. Uma instituição do Estado, diga-se, que cada vez mais tem permitido ser tratada como instituição de governo, ou seja, subordinada a um projeto político — e não à Constituição, como deveria ser.

O episódio da não punição, pelo comando do Exército, do general Eduardo Pazuello, que violou o regramento que proíbe a militares da ativa a participação em atos políticos, foi um desses momentos em que a cúpula das Forças Armadas cedeu à politização de suas fileiras.

Se agora a instituição se vê como vidraça, isso não ocorre por acaso, mas pela disposição de seus comandantes em permitir que o governo Bolsonaro absorvesse em funções civis milhares de militares, muitos da ativa.

Segundo levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU), o número de militares da ativa e da reserva em cargos civis no Poder Executivo mais do que dobrou no mandato de Jair Bolsonaro, chegando a mais de 6.000 em julho do ano passado.

Enquanto isso, a credibilidade das instituições militares junto à população foi desmoronando. Segundo pesquisa de opinião XP/Ipespe divulgada no mês passado, a confiança dos brasileiros nas Forças Armadas caiu 12 pontos percentuais desde o final de 2018.

Os comandantes das Forças Armadas deveriam divulgar uma nota de repúdio contra si próprios por permitir a politização da instituição, subordinando-a ao projeto de poder bolsonarista e transformando-a em vidraça.