Resistência de parlamentos europeus ameaça travar acordo do Mercosul com UE
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Os acordos comerciais fechados pelo governo brasileiro com a Europa em 2019 enfrentam resistências nos parlamentos regionais pelo Velho Continente e podem se transformar em impasses políticos sérios em diferentes países.
No ano passado, o Parlamento da Áustria já aprovou uma moção contra a iniciativa. Agora, foi o governo da região belga da Valônia que anunciou que é "totalmente" contrário à abertura comercial com o Mercosul.
"Somos totalmente contrários a esse tratado. Para o governo da Valônia, é não", disse Elio Di Rupo, presidente do governo regional da Valônia. Ele foi o primeiro-ministro belga entre 2011 e 2014.
Sem o sinal verde da Valônia, a Bélgica não pode aprovar o tratado, o que criaria um impasse na UE. Um texto agora seguirá para ser aprovado pelo parlamento regional e que instrui o governo da Valônia a comunicar oficialmente à Bruxelas seu veto.
No texto, a proposta aponta que o acordo com o Mercosul terá "um impacto negativo no respeito às metas climáticas do Acordo de Paris, ao meio ambiente, à saúde e ao desenvolvimento de um modelo agroalimentar sustentável na Valônia".
Mas Di Rupo também aponta para o risco que a abertura comercial representaria para o setor agropecuário da região.
"Não daremos ao governo federal plenos poderes para negociar, por várias razões. Primeiro, as importações de carne vão ser enormes", alertou. "Na Valónia, existem cerca de 9.000 criadores e a carne de bovina é um dos elementos essenciais no mundo da agricultura e da pecuária. Nós representamos 43% da produção de carne do nosso país. O segundo problema é o aspecto da saúde. Haverá produtos químicos e antibióticos, enquanto as nossas regras europeias são rigorosas. Exigimos que as regras nos países do Mercosul sejam as mesmas que as regras europeias", insistiu.
O presidente regional, porém, não deixou de citar a atitude de Bolsonaro em assuntos ambientais. Segundo ele, o comportamento do presidente brasileiro em relação à Amazônia "mostra que ele não pretende cumprir os acordos de Paris sobre mudanças climáticas".
"Nós somos a favor do comércio internacional, mas não sob quaisquer condições", insistiu. "Queremos que os critérios ambientais, sociais e de saúde, válidos a nível europeu e na Bélgica, se apliquem também a estes países".
Essa não é a primeira vez que a Valônia bloqueia um acordo comercial. Em 2016, a região obrigou o Canadá a ver seu acordo com a UE ser adiado por semanas.
Na Comissão Europeia, a esperança é de que governos nacionais possam dar seu sinal verde para o acordo até o final de 2020.
Popular
Mas o acordo Mercosul-UE não é o único que sofre golpes. Nesta quarta-feira, o Legislativo da região de Neuchatel, na Suíça, aprovou uma iniciativa para solicitar que um referendo popular seja organizado para consultar a população sobre o acordo de livre comércio com o Mercosul.
O bloco sul-americano estabeleceu um entendimento com o EFTA, o agrupamento de países como Suíça e Noruega. Mas o tratado precisa ser ratificado.
Além de Neuchatel, os parlamentos de Vaud e de Genebra também fizeram a mesma demanda ao governo federal.
Se aprovada, a ideia de uma votação popular pode colocar o acordo em risco e adia por meses qualquer tipo de tratado. Na Suíça, as últimas eleições mostraram um forte avanço dos ambientalistas. O Partido Verde, por exemplo, já anunciou que irá fazer uma campanha contra o acordo com o Brasil, caso o projeto de um voto popular se transforme em realidade.
Se a questão ambiental e a posição do governo de Jair Bolsonaro é um dos argumentos utilizados contra o tratado, políticos europeus não negam que o motivo também é econômico: proteger seus agricultores das exportações brasileiras.
No cantão do Jura, o Parlamento foi além e aprovou um pedido para que o governo federal retire do tratado com o Mercosul todos os itens relacionados à agricultura. Na Comissão de Relações Exteriores do Parlamento Nacional, porém, a proposta do Jura foi barrada.
Protecionismo dissimulado
À coluna, o ex-presidente da Comissão, José Manuel Durão Barroso, defendeu que haja uma separação entre a lógica do acordo com o Mercosul e as questões ambientais.
"Essas questões (ambientais) não podem ser usadas como pretexto para não fazer um acordo", disse o português e que por anos liderou a UE nas negociações com o Mercosul. "As vezes, há formas dissimuladas de protecionismo, que é lançando novas questões para evitar de fato o acordo", alertou, numa insinuação de que governos ou partidos estariam usando o tema ambiental para dissimular uma meta comercial de evitar a concorrência.
"O acordo deve ser fechado o mais rápido possível", disse. "Será o acordo mais importante, inclusive para a economia mundial. Num momento que temos tantas ameaças de protecionismo, era muito importante que a UE e o Brasil dessem um sinal oposto", completou.
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