PIB, comércio e indicadores sociais confirmam maior crise em gerações
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Resumo da notícia
- ONU reúne informações de diversos órgãos para um raio-X mundial
- Sociedade é impactada pela covid-19 em praticamente todos os aspectos
- Serviços, mercado de trabalho, escolas e comércio mundial são afetados
- Retrocesso devido à crise ameaça anular uma década de avanços sociais
"A covid-19 virou o mundo de cabeça para baixo". É de uma forma pouco ortodoxa que começa o informe de mais de 30 entidades internacionais que, juntas, tentam desenhar a atual situação e fazer um raio-X de um paciente: o mundo.
Alguns números econômicos surpreendentes publicados nesta quarta-feira incluem uma queda anual de 9% na produção global a e perdas de US$ 8,5 trilhões em dois anos para a economia mundial, algo inédito desde 1929.
Para o segundo trimestre, a queda do comércio deve ser de 27%, algo inédito em gerações. Também se estima que haverá a maior queda nos preços globais de commodities, de 20,4%, o que deve gerar um impacto negativo para o Brasil.
No lado social, a constatação é de uma "chocante perda de empregos — uma queda de quase 10,5% no total de horas de trabalho, o equivalente a 305 milhões de trabalhadores em tempo integral".
Cerca de 1,6 bilhão de estudantes foram afetados pelo fechamento de escolas e a crise vai empurrar até 60 milhões de pessoas para a pobreza extrema, um cenário jamais visto em apenas um ano e revertendo uma década de avanços sociais.
A crise é maior que o colapso dos bancos em 2008, que o impacto do terrorismo em 2001 ou que a quebra dos mercados asiáticos em 1998.
"Tudo foi impactado", diz o informe produzido pela ONU (Organização das Nações Unidas), FAO (ONU para Agricultura e Alimentação), OMS (Organização Mundial da Saúde), OMC (Organização Mundial do Comércio), Banco Mundial e vários outros organismos. "Cada aspecto de nossas vidas tem sido afetado", diz.
Para eles, as decisões tomadas agora e nos próximos meses serão algumas das mais importantes tomadas em gerações. "Elas afetarão as pessoas em todo o mundo nos próximos anos", alertam.
O que as entidades descobriram ao reunir os dados é que, de fato, a crise é sem precedentes. "As estatísticas apresentadas neste relatório são inéditas. Estamos testemunhando pontos de dados e inflexões de tendências que teriam sido inimagináveis há apenas alguns meses", admitem.
E as entidades alertam: os dados que seguem abaixo são apenas a "ponta de um iceberg" de uma verdadeira revolução com consequências ainda desconhecidas.
Produção
Pelo mundo, o fechamento de fronteiras, o impacto da doença e mortes, além da quarentena transformaram economias. A China, no primeiro trimestre, registrou uma contração de 6,8%, o pior resultado desde 1992, quando os dados começaram a ser publicados. No Reino Unido, a projeção é de uma queda de 14% no PIB em 2020, algo inédito desde 1706. Há 300 anos, a contração recorde havia sido de 15%.
Nos EUA, o consumo privado registrou a maior queda desde 1980, enquanto a previsão do PIB para o segundo trimestre é de que uma contração inédita de 39%, a maior desde 1947 quando os dados começaram a ser calculados.
Aviação
Com cerca de 90% da frota imobilizada e a demanda de viagens atingindo quase zero, a redução do tráfego ultrapassou tudo o que se conhecia. E as perspectivas para abril devem se deteriorar ainda mais. A análise de impacto econômico da covid-19 da Organização Internacional de Aviação Civil (ICAO) indicava já em março uma queda de 54% no número de passageiros. Ou seja: 198 milhões de pessoas. Somente em março, estima-se que as companhias aéreas perderam US$ 28 bilhões em receitas, e os aeroportos e prestadores de serviços de navegação aérea perderam cerca de US$ 8 bilhões e US$ 824 milhões, respectivamente.
No início de abril, a IATA - entidade que reúne as 200 maiores empresas aéreas do mundo - indicou que as perdas no setor poderiam chegar a US$ 300 bilhões.
Turismo
Depois de aumentar quase ininterruptamente e mais do que duplicar desde 2000, o turismo em 2020 deve diminuir entre 60% e 80% em relação a 2019. Os dados disponíveis mostram que as viagens no mês de março caíram 60% em relação ao mesmo mês em 2019. O impacto será particularmente crítico em territórios que dependem fortemente do turismo internacional e a previsão apenas para 1,1 bilhão de desembarques a menos em 2020, em comparação a 2019. No auge da crise econômica de 2008, a queda foi de 36 milhões de viagens.
Emprego
Os dados do desemprego também são inéditos. No início de abril, 81% da força de trabalho global vivia em países com confinamentos obrigatórios. O resultado é que as horas trabalhadas em todo o mundo podem cair no trimestre atual em cerca de 10,5%. Isto equivale a 305 milhões de trabalhadores em tempo integral. Para a OIT (Organização Internacional do Trabalho), essa é já a pior crise global desde a Segunda Guerra Mundial. A queda em horas trabalhadas já superou a da crise financeira de 2008-2009 e sequer ainda se conhece todos os impactos da crise.
Comércio e Commodities
Os valores do comércio global caíram 3% no primeiro trimestre de 2020. Mas, para o segundo trimestre, a queda deve ser de 27%, algo inédito. Os preços das commodities também estão caindo. Segundo o relatório, a queda no comércio global é acompanhada por acentuadas quedas nos preços das commodities. Depois de uma contração de 1,2% de seu valor em janeiro, 8,5% em fevereiro e 20,4% em março, a previsão é de um tombo ainda maior a partir de abril.
A queda acentuada dos preços dos combustíveis foi o principal motor da queda, 33,2% em março, enquanto os preços de minérios, metais, alimentos e matérias-primas agrícolas caíram menos de 4%. A queda de mais de 20% nos preços das commodities em março foi um recorde na história.
Restrição de movimento
Outro impacto da pandemia foi o freio brusco na capacidade de imigrantes e refugiados em encontrar proteção. Até 10 de março deste ano, 5430 restrições de movimentos foram adotadas por 105 países. Em 23 de março, já eram 33.712 restrições impostas por 164 países. Pelo menos 73 países passaram a ter um acesso parcial ou totalmente restrito aos procedimentos nacionais de asilo.
Pobreza
A covid-19 ainda causará "o primeiro aumento da pobreza global desde 1998". "Com as novas previsões, a pobreza global - a parcela da população mundial que vive com menos de US$ 1,90 por dia - deverá aumentar de 8,2% em 2019 para 8,6% em 2020, ou de 632 milhões para 665 milhões de pessoas", indica o informe. Antes da pandemia, a projeção era de uma queda para 7,8%
O FMI (Fundo Monetário Internacional) projeta que as economias avançadas se contrairão em cerca de 6% em 2020. No entanto, com mais pessoas vivendo perto da linha de pobreza internacional, os países em desenvolvimento, de baixa e média renda, sofrerão as maiores consequências em termos de pobreza extrema.
23 milhões das pessoas empurradas para a pobreza estão previstas na África Sub-Sahariana e 16 milhões no Sul da Ásia. Na América Latina, 2,7 milhões de pessoas passarão a viver na pobreza extrema.
Se considerar o número de pessoas que vivem com menos de 5,50 dólares por dia, mais de 100 milhões de pessoas também serão empurradas para a pobreza no mundo.
Droga e violência
Dados preliminares sobre as tendências de violência sugerem que as medidas de confinamento dificilmente impactaram a violência em países com altos níveis de homicídios. As tendências de homicídios em dois países da América Central, por exemplo, se mantiveram estáveis nas quatro semanas após a implementação das medidas de quarentena.
Em contrapartida, em países com baixo índice de homicídios, a intensidade das medidas de bloqueio parece ter reduzido drasticamente a violência, assaltos e crimes. Um dos países que registrou essa queda foi a Itália. O que registrou um forte aumento, porém, foi a taxa de violência doméstica.
O impacto da covid-19 no tráfico de drogas também foi identificado, obrigando o transporte de heroína a buscar novos caminhos para cruzar fronteiras. As grandes apreensões relativamente recentes de cocaína em portos europeus demonstram o contínuo tráfico internacional de cocaína, que passou a usar as rotas marítimas diante do fechamento de fronteiras e aeroportos.
Correio
Já há também um sério abalo nos serviços de correio. 50% das cartas ou pacotes enviados estão parados. Os volumes de novos envios caíram já em 23%, enquanto o tempo gasto para um pacote ser liberado por uma aduana aumentou 32 vezes.
Crianças
Um dos impactos mais profundos tem sido sentido entre as crianças, especialmente aquelas das famílias mais pobres e das partes mais pobres do mundo. A constatação é de que, confinadas ou em situação de risco, podem perder a vida devido a pneumonia, malária, HIV e outras doenças evitáveis, "Qualquer outra interrupção dos serviços de imunização resultará em mais crianças morrendo de pneumonia, o que já mata cerca de 800.000 crianças menores de cinco anos a cada ano -- cerca de 2.200 por dia", alerta.
"Quase três quartos da população da África Subsaariana não têm instalações básicas de lavagem de mãos em casa, um mecanismo fundamental para prevenir a covid-19, deixando as pessoas já vulneráveis em maior desvantagem. Cerca de 3 bilhões de pessoas não têm instalações de lavagem de mãos com água e sabão disponíveis: 1,6 bilhões têm instalações sem sabão ou água, e 1,4 bilhões não têm nenhuma instalação. Em resumo, para muitas pessoas, o método mais básico e eficaz para prevenir a disseminação da covid-19 está fora do alcance de muitas pessoas", indicam.
Já a Unicef estima que se tratamentos para outras doenças forem afetados, seis mil crianças podem morrer por dia nos próximos seis meses por falta de acesso a remédios e centros de saúde.
Escola
Em meados de fevereiro, 300 milhões de alunos foram afetados pelo fechamento de escolas e universidades. Dois meses depois, este número cresceu para quase 1,6 bilhão de estudantes em 192 países, representando 90% da população estudantil global.
Globalmente, o fechamento de escolas afeta aproximadamente 155 milhões de crianças no ensino pré-primário, 691 milhões de alunos do ensino fundamental, 537 milhões de alunos do ensino médio e 191 milhões de alunos do ensino superior. Na América Latina, 244 milhões de alunos foram impactados.
"Quando o fechamento de escolas é instituído como medida de contenção, alternativas como a educação à distância (por exemplo, programa de TV ou rádio) e o aprendizado online são implantados como alternativas em alguns países", apontam. "Entretanto, menos da metade dos lares na maioria dos países do mundo tem acesso à Internet. Enquanto 73% dos lares urbanos possuem televisão, apenas 38% dos lares rurais o fazem em 60 países em desenvolvimento. A pandemia corre o risco de agravar a "crise do aprendizado" e deixar para trás as crianças mais carentes", alertam.
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