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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Lula rompe oferta de Bolsonaro de abertura para economias ricas

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva - Juan Medina/Reuters
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva Imagem: Juan Medina/Reuters

Colunista do UOL

30/05/2023 12h52

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Numa das medidas de maior impacto do governo de Luiz Inácio Lula da Silva no comércio exterior, o Itamaraty retira oferta apresentada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro de abertura de seu mercado às economias ricas. A proposta do governo anterior previa a abertura do mercado nacional para empresas estrangeiras participarem de licitações públicas, praticamente nas mesmas condições de companhias locais.

Documentos obtidos pelo UOL revelam que a missão do Brasil junto à OMC (Organização Mundial do Comércio) informou aos demais governos que a proposta que existia para a adesão do país ao Acordo de Compras Governamentais seja retirada.

"De acordo com seus direitos reservados, o Brasil informa às partes do Acordo de Compras Governamentais que retira sua oferta de acesso ao mercado", diz o documento, datado de 30 de maio e qualificado como "restrito".

O acordo é composto por cerca de 40 países, praticamente todos eles ricos. Fazem parte as economias dos EUA, Europa, Canadá, Austrália e Japão, entre outros.

Nenhum país latino-americano faz parte do entendimento, que tampouco conta com outros emergentes de peso. A iniciativa é vista como uma ofensiva dos países ricos para abrir mercados entre as economias em desenvolvimento.

Se por décadas o Brasil se recusou a fazer parte da iniciativa, Jair Bolsonaro modificou a tradição do Itamaraty e, num esforço para se aproximar dos EUA de Donald Trump, ofereceu abrir seu mercado de compras públicas.

Ao fazer parte do tratado, o Brasil se comprometeria a abrir suas licitações para empresas estrangeiras, num mercado potencial de US$ 150 bilhões. Para ser aceito, o governo Bolsonaro apresentou ofertas sobre os setores que seriam alvos de liberalização.

A retirada da oferta brasileira, agora, frustrará governos de países ricos, que buscavam ampliar a presença de suas empresas na economia nacional.

Documentos obtidos pela reportagem apontam que, ainda em 2022 e depois de vencer as eleições presidenciais, assessores de Lula recomendaram que a proposta de Bolsonaro fosse de fato reavaliada.

O motivo: ao abrir o setor de licitação pública à concorrência estrangeira, o Brasil estaria abrindo mão de um espaço importante para promover determinados setores da indústria nacional.

Ainda no âmbito da OMC, cabe ressaltar necessidade de revisão da oferta ao Acordo de Compras Governamentais, pouco debatida internamente, dizia o documento do final de 2022 e que serviu para orientar a nova política externa.

Um movimento similar de preocupação já havia ocorrido internamente no governo Lula nos debates sobre o acordo entre Mercosul e União Europeia. Para um setor do governo, o tratado entre os dois blocos permitiria que os europeus possam participar com posição de força de licitações públicas no setor da saúde, aumentando ainda mais a vulnerabilidade do SUS e sua dependência de fornecedores estrangeiros.

Sobre a situação na OMC, a percepção segue a mesma linha de preocupação. O acordo jamais entrou em vigor no Brasil. O governo Bolsonaro apenas havia apresentado sua oferta e uma negociação ocorria, principalmente com países ricos que almejavam ter maior acesso ao mercado de compras públicas do Brasil.

Agora, com a retirada de sua oferta, o governo Lula paralisa qualquer negociação, pelo menos por enquanto.

Exame sugeriu que oferta fosse reavaliada

De fato, documentos preparados pela equipe de transição do governo Lula, ainda no final de 2022, sinalizavam que essa revisão era urgente.

O país realizou negociações de maneira apressada e com pouca transparência. Descartou antigos parceiros guiando-se por ideologias que prometem resultados que nunca chegam. É preciso reavaliar o conjunto de medidas tomadas ao longo dos últimos quatro anos enquanto o governo Lula reorienta a presença brasileira no mundo", alerta o documento.

O exame deixava ainda explícita a necessidade de um reposicionamento do Brasil em organismos internacionais relacionados ao comércio.

"Na OMC, deve-se trabalhar para destravar a Organização e reverter o isolamento brasileiro, revendo prioridades temáticas e parceiros. No governo Bolsonaro, o Brasil optou por atuar, em diversos casos, alinhado aos países da OCDE, destoando das posições de países em desenvolvimento, a exemplo da proposta de "waiver" de normativas do acordo de TRIPS para equipamentos e medicamentos de combate à COVID", alertou.

No que se refere ao posicionamento sobre remédios, as mudanças já ficaram evidenciadas em diferentes fóruns internacionais.

Agora, é o mercado de compras governamentais que passará por mudanças.