Em carta, indígenas e ambientalistas pedem que Lula vete marco temporal
Numa carta entregue nesta sexta-feira ao Itamaraty, indígenas e ambientalistas fazem um apelo para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vete a lei que estabelece o marco temporal, aprovado no início da semana no Senado.
Assinam o apelo entidades como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Aty Guasu Guarani Kaiowá, Conectas Direitos Humanos, Instituto Socioambiental, Kunhangue Jeroky Guase Marangatu, Observatório do Clima, a Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas - FIAN Internacional e Retomada Aty Jovem Guarani Kaiowá.
A carta foi entregue ao embaixador do Brasil na ONU, Tovar da Silva Nunes, e será ainda enviada ao presidente Lula e diferentes ministérios.
De acordo com o grupo de entidades, apesar de o STF (Supremo Tribunal Federal) tenha vetado o marco temporal, na semana passada, a aprovação do projeto de lei no Senado é uma "ameaça que inviabilização as demarcações de terras indígenas" e promove "destruição de direitos fundamentais e humanos dos povos indígenas no Brasil".
Para o grupo, a aprovação é uma de uma "flagrante inconstitucionalidade", "um atentado à democracia e separação dos poderes e pode impor, se promulgado, sérias violações de direitos fundamentais e humanos aos povos indígenas do Brasil".
Os indígenas e ambientalistas destacaram que, na ONU em 2022, ficou estabelecida a "necessidade de demarcar territórios indígenas e rejeitar a tese do marco temporal" em recomendações por 25 países. Segundo eles, o estado brasileiro aceitou a sugestão.
Segundo eles, além da questão do marco temporal, "o projeto apresenta uma série de retrocessos que destituem direitos constitucionais e levariam a danos ambientais irreparáveis, inviabilizando o compromisso feito pelo governo de zerar o desmatamento até 2030".
São estes:
Estabelece que a demarcação poderá ser contestada em todas as fases do processo administrativo, o que dificultaria sua finalização;
Dispensa atividades altamente impactantes (construção de estradas, hidrelétricas, linhas de transmissão, outros) da realização de consulta livre, prévia e informada às comunidades indígenas afetadas, contrariando determinação da Constituição Federal e de legislação internacional ratificada pelo Estado brasileiro;
Legaliza o arrendamento de terras indígenas ("parcerias rurais") para o plantio de grandes extensões de monocultura, sem qualquer regra de proteção ambiental, estimulando um aumento significativo do desmatamento no país, sobretudo na Amazônia, onde se concentra 98% dos territórios indígenas;
Abre brechas para o fim da política de não contato com indígenas isolados, permitindo o contato em casos de "interesse público", que poderia ser realizado por empresas e, inclusive, por associações de missionários.
Permite a retirada das terras dos indígenas caso se considere que houve "alteração de seus traços culturais" ou por "outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo".
"Em síntese, além de inconstitucional em razão da decisão do Supremo Tribunal Federal, o PL 2903 destitui direitos constitucionais; inviabiliza demarcações de terras indígenas; ameaça os territórios homologados; ignora a consulta e o consentimento livre, prévio e informado; e contraria os esforços de proteção ambiental e enfrentamento às mudanças climáticas", disseram os grupos.
"Ao proceder ao veto integral do texto, o Presidente estaria cumprindo seus deveres constitucionais e garantindo o reestabelecimento dos direitos fundamentais e humanos dos povos indígenas", completam.
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