Conselho da ONU aprova missão ao Haiti e Brasil pode treinar policiais

Depois de meses de debates e polêmicas, o Conselho de Segurança da ONU aprovou nesta segunda-feira a criação de uma missão internacional para restabelecer a segurança no Haiti. O encontro foi o primeiro a ser presidido pelo Brasil, que ocupa o cargo durante o mês de outubro.
A votação terminou com 13 votos a favor, inclusive com o apoio do Brasil e dos EUA. Já a China e a Rússia optaram por se abster.
O Brasil, diferentemente o que fez na última missão criada pela ONU, não enviará homens. O UOL apurou que o governo considera treinar policiais haitianos para que possam assumir a segurança do país.
Num primeiro momento, a missão terá a duração de um ano e não contará com os tradicionais capacetes azuis. O mandato será o de garantir a segurança da infraestrutura do país, incluindo aeroportos, escolas, hospitais e estradas.
Operações específicas também poderão ser realizadas, desde que ocorram ao lado da polícia local.
O embate sobre a resolução envolvia dois aspectos. O primeiro era sobre quem iria liderar a missão. Países como Canadá e Brasil foram consultados para enviar tropas. Mas se recusaram.
Entre os problemas alegados pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está a situação ainda delicada entre o Executivo e as Forças Armadas, depois de quatro anos do governo de Jair Bolsonaro (PL).
O Brasil também insiste que apenas uma missão de segurança não será suficiente para restabelecer a paz no Haiti e defende que um plano de desenvolvimento seja considerado.
Num discurso, o embaixador do Brasil na ONU, Sergio Danese, explicou que o governo Lula optou por apoiar a resolução. Mas alertou que a nova missão apenas terá êxito se alguns aspectos forem considerados. Eles são:
O estabelecimento de um embargo de armas e desarmar as gangues
A negociação de um acordo político
A realização de eleições livres, uma vez garantida a segurança.
Ajuda humanitária e apoio internacional para o desenvolvimento
Segundo o embaixador, essa é a "única forma" para que a nova missão internacional tenha sucesso desta vez. O Brasil já liderou uma das missões internacionais enviadas ao Haiti, por mais de dez anos. Mas, hoje, aquele esforço foi desfeito.
"É preciso aprender as lições do passado", disse o diplomata, indicando que o governo ainda aguarda detalhes da missão para definir seu envolvimento.
Para Danese, a missão precisa respeitar a soberania do Haiti e defendeu que as "causas estruturais" da crise sejam lidadas. Na visão do diplomata brasileira, uma solução política cabe exclusivamente aos haitianos.
O governo americano indicou que também poderia apoiar a missão com US$ 200 milhões, mas que não iria disponibilizar soldados.
A solução veio da África, com o governo do Quênia aceitando liderando a missão com o envio de mil homens e com o apoio da Jamaica, Barbados, Antigua e Barbuda.
A operação era um pedido do próprio governo do Haiti, que lida há meses com a violência de gangues e a impossibilidade de garantir serviços básicos.
Resistência de China e Rússia
O segundo problema era a resistência da China e da Rússia a uma nova missão, insistindo que a ONU não deveria agir com uma intervenção militar. Para Pequim, a questão de segurança é apenas uma parte do problema no Haiti e instrumentos reais de desenvolvimento precisam ser estabelecidos para que a crise seja superada.
Os dois países defendiam uma missão mais curta, de apenas seis meses. Durante o debate, o governo russo alertou que não estava de acordo com a falta de transparência sobre como ocorreria a missão e pediu que o contrabando de armas fosse elucidado.
Mas o fato de a missão ser liderada por africanos acabou convencendo os dois países a não vetar a iniciativa. Outro fator que acabou destravando a negociação foi a inclusão de ações concretas para lidar com o contrabando de armas para o Haiti. Parte significativa desse abastecimento vem de grupos com base nos EUA.
Ainda assim, a reunião marcou um raro momento em que o Conselho conseguiu, de fato, chegar a um acordo. Com a guerra na Ucrânia, as principais potências passaram a divergir sobre todos os temas internacionais.
De acordo com a ONU, a violência no Haiti já fez quase 3.000 mortos desde outubro do ano passado. Enquanto isso, milhares de famílias abandonaram as regiões mais perigosas do país, onde o estado havia deixado de atuar.
Dúvidas sobre a missão
Mas a nova missão também é vista com suspeitas por parte de grupos da sociedade civil haitiana. Segundo eles, as gangues fecharam acordos com partidos políticos, desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em 2021.
Desde então, nenhuma eleição ocorreu, criando uma disputa de poder por meio de armas. Por isso, o pedido do primeiro-ministro haitiano, Ariel Henry, é visto pela oposição como uma forma de se estabelecer no poder, apesar de ter sua legitimidade questionada.
Já outros grupos escreveram para o governo de Joe Biden alertando que o plano de uma nova missão apenas ampliaria a crise política e lembraram como missões anteriores da ONU não trouxeram nem paz e nem estabilidade ao país.
Se não bastasse, as forças quenianas são acusadas de corrupção e abusos em países para onde foram enviadas.
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