Jamil Chade

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Itamaraty: Sindicato cobra apuração contra diplomatas em reunião golpista

O Sinditamaraty — sindicato que reúne funcionários e diplomatas do Ministério de Relações Exteriores — cobra investigações sobre o papel de diplomatas brasileiros em atos golpistas.

O UOL revelou nesta semana o mal estar que vive a chancelaria, diante das revelações de que pelo menos três diplomatas estavam na reunião de julho de 2022, na qual o então presidente Jair Bolsonaro e seus aliados falam abertamente em medidas que poderiam levar a uma ruptura do estado democrático.

Em nota publicada nesta sexta (16), o sindicato expressa "sua mais profunda indignação diante dos indícios de que diplomatas participaram ou tomaram conhecimento do teor da reunião ministerial de julho de 2022, que teve o propósito de estruturar um ataque contra o Estado Democrático de Direito".

É inaceitável que membros do corpo diplomático brasileiro possam ter se envolvido em atividades que minam os princípios fundamentais da democracia brasileira.

O grupo, portanto, "exige investigação imediata sobre a conduta desses servidores durante a referida reunião, bem como a apuração rigorosa do envolvimento do então chanceler (Carlos França) e demais diplomatas pelas autoridades competentes".

França esteve na reunião entre Bolsonaro e os embaixadores estrangeiros, também em julho de 2022, ainda que o Itamaraty tenha recomendado que o encontro não fosse realizado. O ato levou à inegibilidade do ex-presidente até 2030.

Segundo fontes do Itamaraty, o embaixador Fernando Simas, naquele momento o secretário-geral do Itamaraty, teria sido uma das vozes dentro da chancelaria que alertaram contra a ideia de Bolsonaro realizar a reunião com embaixadores estrangeiros. Sua postura contrária foi confirmada por dois outros diplomatas consultados pelo UOL. O ministério de fato não participou da organização do encontro, ainda que o então chanceler, Carlos França, tenha estado no dia da reunião.

A aparente omissão de servidores em denunciar uma tentativa de golpe de Estado é inaceitável e pode manchar a reputação e valores da diplomacia brasileira.

O sindicato diz ainda que "permanece firme em seu compromisso com a democracia e o respeito às instituições republicanas, e continuará a exigir responsabilidade e transparência de todos os seus servidores".

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Nesta quinta (15), a Presidência da República vetou a transferência de um diplomata que estava na reunião de julho de 2022, na qual o então presidente Jair Bolsonaro e seus aliados falaram abertamente sobre a possibilidade de uma ruptura democrática.

Comarci Nunes Filho, que atualmente estava na assessoria de comunicação do Itamaraty, seria transferido para trabalhar na equipe de comunicação do G20, presidida pelo Brasil em 2024.

Paulo Pimenta, ministro de Comunicações, afirmou ao UOL que a transferência não chegou a ser efetivada e que mandou suspender qualquer medida neste sentido.

Quem são os diplomatas que estavam na reunião

A reunião aconteceu em de julho de 2022. O vídeo do encontro estava no computador do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro. Agora, seu conteúdo faz parte das investigações sobre a tentativa de golpe de Estado. Em vários momentos do encontro, Bolsonaro pede a seus ministros que atuem para impedir a vitória do adversário, o presidente Lula.

Além de Comarci Nunes Filho, estava no local o embaixador Fernando Simas, naquele momento o secretário-geral do Itamaraty. O encontro deveria ter contado com a presença do chanceler Carlos França. Mas o ministro estava em reuniões do G20. No encontro ainda estava presente o embaixador André Chermont de Lima, chefe do cerimonial da presidência.

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Simas acabou sendo transferido e hoje é o representante do Brasil em Haia, inclusive para os debates e processos no Tribunal Penal Internacional. Chermont é, hoje, cônsul-geral em Tóquio.

Numa nota publicada nesta semana, a Associação e Sindicato dos Diplomatas Brasileiros afirmou seu "repúdio a movimentos destinados a subverter a ordem democrática e os princípios do Estado de Direitos".

O grupo diz ainda estar acompanhando a investigação e a apuração de "possível utilização de estruturas de Estado para o planejamento de atos antidemocráticos, em cumprimento aos precedentes constitucionais e observado o devido processo legal".

Entre os diplomatas, foi iniciado ainda um movimento para reforçar um código de ética para que esse tipo de situação não seja mais aceita dentro da instituição.

O Itamaraty, como instituição, não se pronunciou oficialmente sobre o caso.

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