Fragilizada e fragmentada, UE amplia instabilidade global após eleição
Os resultados da eleição europeia, a decisão de Emmanuel Macron de dissolver o Parlamento, a derrota de Olaf Scholz na Alemanha e a fragmentação das forças políticas no Velho Continente ampliam o cenário de incerteza mundial.
Neste fim de semana, a votação para escolher um novo Parlamento Europeu foi concluída com a vitória da centro-direita. Mas foi o avanço de movimentos populistas e de extrema direita que chamou a atenção.
Pela primeira vez existem vozes contrárias ao projeto europeu de integração com um espaço suficiente para influenciar no futuro da agenda do bloco. Para analistas, os resultados revelaram uma crise existencial na UE, com repercussões que serão sentidas pelos próximos cinco anos.
A isso se soma o risco de uma vitória de Donald Trump, nos EUA em novembro.
O cenário de um arco conservador no Atlântico Norte seria, para diplomatas, um terremoto na ordem internacional.
Ao comemorar a vitória, Marine Le Pen afirmou que seu movimento está pronto a assumir o governo francês e retomar ideias nacionalistas.
Lula levará para Europa mensagem de alerta contra extrema direita
Nesta quinta-feira, de fato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fará um discurso na sede da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no qual ele deve alertar para os riscos da extrema direita global e apontará para a necessidade de respostas por parte das democracias.
No dia seguinte, estará na cúpula do G7, ao lado da vencedora da eleição na Itália, Giorgia Meloni. Mas também de Emmanuel Macron e Scholz, ambos derrotados.
Em seu primeiro discurso após a eleição, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, confirmou a preocupação com a estabilidade e deixou claro que tem consciência de que será sua missão garantir a coesão e a viabilidade do projeto europeu.
Na esquerda, a mensagem é semelhante. "Embora haja ganhos a serem comemorados em muitos países, a esquerda está atenta às perigosas correntes políticas que alimentam a divisão e influenciam a política europeia", afirmou um comunicado do grupo que reúne os partidos de esquerda da UE e liderado por Manon Aubry.
"A esquerda continua sendo uma força significativa em um contexto de ascendência da extrema direita", defendeu a copresidente da esquerda, Manon Aubry. "Reafirmamos nosso compromisso de ser a voz firme das pessoas, do planeta e da paz", insistiu.
Mas, para diplomatas ouvidos pelo UOL, não existem dúvidas de que essa estabilidade hoje já está ameaçada. E, junto com ela, o risco é de uma incerteza global ainda maior.
Ucrânia x Rússia
Um primeiro aspecto será a reação dos europeus diante da guerra na Ucrânia. A nova composição do Parlamento pode trazer para o coração da UE aliados de Vladimir Putin. Alegações de corrupção e de espionagem envolvendo o eurodeputado Maximilian Krah, da extrema direita alemã, seriam a ponta do iceberg.
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JAMIL CHADE
Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente.
Quero receberEle é acusado na Justiça alemã de receber dinheiro de chineses e russos por seu trabalho no Parlamento. Seu principal assessor foi preso, enquanto outros membros do partido também estão sob a mira da Justiça.
Alguns dos principais vencedores do pleito deste fim de semana não escondem uma certa simpatia por Putin. Em 2014, Marine Le Pen recebeu recursos do russo para sua campanha eleitoral.
Na Áustria, o movimento de extrema direita Partido da Liberdade tem sido uma força ativa em evitar críticas contra o Kremlin. Nesta eleição, eles saíram pela primeira vez como os grandes vencedores em seu país.
Para Kiev, o risco é de que isso signifique que haverá uma pressão sobre os ucranianos para que aceitem um acordo no qual o conflito é encerrado com um novo mapa do país e a perda de províncias ocupadas pelos russos.
Agenda climática congelada
Um outro impacto sendo acompanhado de perto por potências internacionais é o impacto da eleição para a agenda de mudanças climáticas, em especial tendo em vista a COP30 no Brasil em 2025.
O temor de ambientalistas é de que a maior presença da extrema direita e mesmo do grupo conservador atrase qualquer tomada de decisão da UE no que se refere à descarbonização da produção.
Revelador para observadores foi ver a queda significativa dos partidos ecologistas que, em 2019, tinham se consolidado como uma voz importante na eleição. Agora, perderam quase 20 assentos.
Na Alemanha, por exemplo, o voto dos jovens que tinha ido para os ecologistas em 2019 migrou, desta vez, para a extrema direita.
"O resultado pode ser a paralisia da Europa no debate sobre como lidar com mudanças climáticas", admitiu um negociador do Itamaraty.
Esforço pela paz em Gaza paralisado
Um impacto de paralisia semelhante pode ser registrado com relação ao papel europeu na guerra em Gaza e um eventual esforço diplomático para que um acordo possa ser fechado.
Com o governo de Emmanuel Macron lutando para sobreviver e eleições marcadas para final de junho, e diante de forças próximas a Israel saindo vitoriosas, um vácuo pode ser deixado na agenda europeia no Oriente Médio.
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