Josias de Souza

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Opinião

Medo que Bolsonaro diz não ter está refletido nas suas palavras

Em novo encontro com o microfone, neste sábado, Bolsonaro esquivou-se de responder às acusações que constam dos depoimentos colecionados pela Polícia Federal no inquérito sobre a tentativa de golpe. Esperando na fila do Supremo por uma condenação criminal, preferiu declarar que nada teme. O diabo é que o medo que o investigado diz não ter está refletido nas declarações.

"Eu poderia muito bem estar em outro país", disse Bolsonaro. "Preferi voltar para cá com todos os riscos que ainda corro. Não tenho medo de qualquer julgamento, desde que os juízes sejam isentos." Nesse ponto, o orador sinalizou que o algoz Alexandre de Moraes fez bem em confiscar-lhe o passaporte. Fará ainda melhor se indeferir pedido de Bolsonaro para realizar uma viagem a Israel. Convém manter a coragem do capitão aprisionada no território nacional.

O discurso de Bolsonaro soou num ato de lançamento da candidatura do deputado Alexandre Ramagem à prefeitura do Rio de Janeiro. O orador tentou compartilhar o manto de perseguido com o pupilo, um ex-chefe da Abin investigado sob a acusação de monitorar ilegalmente desafetos de Bolsonaro. "Ramagem trabalhou comigo, fez um excelente trabalho, deixou sua marca. E obviamente, quando se lança pré-candidato, o mundo cai na cabeça dele, como vem caindo na minha, porque sou um paralelepípedo no sapato da esquerda."

Quem tem tantos calos deveria ter uma noção mais precisa dos seus apertos. No momento, o cabo eleitoral do PL faria um bem a si mesmo se esquecesse momentaneamente a esquerda para se concentrar em dois personagens conservadores: os ex-comandantes Freire Gomes (Exército) e Batista Júnior (Aeronáutica). Os depoimentos da dupla à PF, liberados na véspera por Xandão, têm o peso de dois paralelepípedos pendurados por um fiapo sobre a cabeça de Bolsonaro.

Submetida às investigações sobre o golpe, a coragem de Bolsonaro revela-se uma virtude fugidia. Some nos momentos em que seria mais necessária. Poucos espelhos refletem melhor a imagem de um homem do que as suas palavras. Bolsonaro passou a medir suas declarações na escala dos milímetros. Apresenta-se como vítima e ataca espantalhos. Mas se abstém de fornecer algo que se pareça com uma defesa crível. Aos poucos, sem que o capitão perceba, vai surgindo na imagem do espelho um culpado apavorado com a perspectiva de prisão.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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