Josias de Souza

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Opinião

Com Bolsonaro, Ricardo Nunes faz Bruno Covas revirar na cova

É fácil falar em nome um morto, pois ele não tem voz. Neste sábado, Ricardo Nunes prometeu, em discurso lacrimoso, dar "continuidade ao legado" do tucano Bruno Covas, de quem herdou a poltrona de prefeito de São Paulo. Assumiu o compromisso durante a convenção em o MDB formalizou sua candidatura à reeleição. Estava ao lado de Bolsonaro, um político que espezinhou a memória de Bruno, sepultado em 2021, após ser derrotado por um câncer.

O tucano Bruno Covas comandou a prefeitura no auge da pandemia da Covid, época em que Bolsonaro era o inquilino do Planalto. Apostou no isolamento social numa época em que o então presidente combatia a vacina e exaltava a cloroquina. Repetiu à saciedade que preferia "acreditar na ciência" a se render ao "ilusionismo da Terra plana."

Em 30 de janeiro de 2021, quando oscilava entre a vida e a morte, Bruno foi ao Maracanã, no Rio de Janeiro, para assistir com o filho Tomás Covas à vitória por 1 a 0 do Palmeiras sobre o Santos, na final da Taça Libertadores da América. Bruno morreria três meses e meio depois, no hospital Sírio Libanês, em São Paulo.

Decorridos menos de dois meses, Bolsonaro como que deu de ombros para o o luto da família do prefeito morto. "Ele fecha São Paulo e vai assistir a Palmeiras e Santos no Maracanã", declarou, no cercadinho do Alvorada. Abespinhado, Tomás Covas reagiu em timbre ácido.

"Lamento a fala dita pelo incompetente e negacionista presidente Bolsonaro", disse o filho de Bruno. "Em uma fala covarde, ele atacou quem não está mais aqui conosco, não dando o direito de resposta ao meu pai. Além disso, cumprimos com todos os protocolos no estádio do Maracanã, utilizando a máscara e sentando apenas nas cadeiras permitidas."

Neste sábado, numa evidência de que a vida é uma moléstia incurável, Tomás Covas dividiu a cena com Bolsonaro. Contratado por Ricardo Nunes em junho passado como coordenador de Políticas para Juventude da prefeitura, com salário de R$ 10 mil, o filho do desafeto de Bolsonaro declarou que é "honra enorme" participar da frente ampla para "derrotar mais uma vez o radicalismo em São Paulo".

Bruno Covas não foi o único vulto incluído involuntariamente na "frente ampla" de Ricardo Nunes. Candidato do MDB, o prefeito fez uma inusitada defesa da democracia. Citou Ulysses Guimarães, um ícone do partido, que traz inscrito na biografia o discurso da promulgação da Constituição de 1988. Nele, disse que nutria "ódio e nojo à ditadura." Uma ditadura que Bolsonaro enaltece e cultua.

Ulysses morreu num acidente de helicóptero, em 1992, nos mares de Angra dos Reis. Seu corpo jamais foi encontrado. O barulhinho que se ouve ao fundo é o som do cadáver de Bruno Covas se revirando no túmulo.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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