No blábláblá de Rui Costa, culpa pelas queimadas é dos outros
A fumaça das queimadas deixou o governo zonzo. Tonto, o ministro Rui Costa desenvolveu um blábláblá que pode levar a desconversa sobre a inépcia do governo para qualquer lugar, desde que os culpados pelas labaredas sejam os outros. Em entrevista ao Globo, o chefão da Casa Civil percorreu três caminhos diferentes para chegar sempre ao mesmo destino.
Numa trilha, questionado sobre a lentidão do governo, Rui Costa disse que "temos que olhar o que acontece no mundo em incêndios florestais", pois "em países muito mais ricos, como os Estados Unidos e Portugal [heimmm?!?], é difícil o controle com um período muito longo de estiagem." Culpa do planeta.
Noutra vereda, o ministro afirmou que, "no caso do Brasil, os incêndios ocorrem de maneira capilarizada e nitidamente orquestrada criminalmente. Não necessariamente por uma única organização." Aqui, os culpados são os criminosos.
No terceiro caminho, Rui Costa polarizou as queimadas. "Quando tem uma pregação, como houve no ato de 7 de Setembro, com a retórica 'vamos tocar fogo no Brasil', começam a acontecer incêndios. O sentimento de impunidade é que estimula. É preciso estabelecer uma pena que as pessoas cumpram." Maldito bolsonarismo!
Lula deu a volta ao mundo para trombetear que "o Brasil voltou". Na sexta-feira, levou a fumaça para passear em Nova York. Neste domingo, falou sobre fracassos alheios. Na terça-feira, discursará na abertura da Assembleia Geral da ONU. Ao usar o incêndio de "países ricos" como álibi para as cinzas nacionais, Rui Costa submete o chefe ao risco de trombar no estrangeiro com uma pergunta incômoda: O Brasil voltou para quê?
Antes do boom de queimadas, havia três dezenas de investigações abertas na Polícia Federal contra piromaníacos. Hoje, há 85 inquéritos. As penas previstas em lei são mesmo mixurucas. Mas o que ajuda a potencializar o "sentimento de impunidade" é o fato de que a PF não levou à fogueira um mísero incendiário.
Rui Costa poderia requisitar a abertura do 86º inquérito, dessa vez contra um alvo específico: o pastor Silas Malafaia. Foi ele quem publicou no X a frase "Vai pergar fogo", tendo como pano de fundo uma bandeira do Brasil. Fez isso a pretexto de convocar os devotos bolsonaristas para escutar o "mito", na Avenida Paulista, no último 7 de Setembro.
Se o chefe da Casa Civil acredita que Malafaia pretendeu riscar fósforos com a língua, tem a obrigação de chamar a polícia. Do contrário, seu palavrório não passará de conversa mole de quem demora a se dar conta de que a herança maldita virou uma muleta gasta.
Niguém ignora que Bolsonaro, com seu negacionismo climático, firmou uma aliança de sua Presidência com a criminalidade ambiental. Mas os 60,3 milhões de eleitores que mandaram o capitão para casa mais cedo não votaram em Lula para que ele e seus operadores desperdiçassem quatro anos falando mal do antecessor.
Dias atrás, de passagem pelo Amazonas, Lula anunciou a criação da Autoridade Nacional Climática. Coisa prometida na campanha e esmiuçada no gabinete de transição. Na entrevista publicada neste domingo, Rui Costa detonou a iniciativa: "Não é isso que vai resolver. Se fosse assim, a Europa e os Estados Unidos já tinham resolvido. Bastava criar a Autoridade Climática e não tinha mais incêndio florestal no mundo."
Torpedeou também o Ministério do Meio Ambiente. Desmentindo a equipe de Marina Silva, negou ter recebido há 60 dias uma proposta capaz de tirar a Autoridade Climática do papel. Disse que o texto só chegou à sua mesa na última quinta-feira.
"O que tinha sido apresentado há dois meses era um PowerPoint", declarou Rui Costa. "Na proposta que veio, está subordinada ao Meio Ambiente. Autoridade Climática subordinada ao ministro, [como cargo de] segundo escalão... Então, ou é autoridade ou é um departamento. Eu não sei."
De duas, uma: ou Rui Costa para de culpar os outros, contribuindo para levar à vitrine algo que se pareça com solução, ou ajudará a solidificar a impressão de que o Gabinete Civil de Lula é guiado pela Lei de Murphy, aquela que diz que se uma coisa pode dar errado, errado dará.
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