Bolsonaro conhece, finalmente, a verdade, mas ela não o libertará
Noutros tempos, sempre que estava em apuros, Bolsonaro recorria a um versículo multiuso extraído do Evangelho de João: "Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." O avanço da investigação sobre a trama golpista proporcionou, finalmente, o encontro do capitão com a verdade, e a verdade não o libertará. Ao contrário, os achados da Polícia Federal pavimentaram o caminho que conduz o "mito" à cadeia.
Dois espetáculos não cabem ao mesmo tempo num só palco. Ou num único golpe. Estavam em cartaz duas apresentações. Numa, vitaminado pela vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, Bolsonaro concedia entrevistas em série pregando uma "pacificação" extemporânea escorada numa "anistia" inusitada. Noutra, a Polícia Federal apertava o certo ao alto-comando do golpe.
Ao revelar na Operação Contragolpe que a virada de mesa incluía o extermínio de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes, a PF como que unificou o espetáculo. Do ponto e vista judicial, Bolsonaro foi condenado a providenciar explicações. Seu silêncio sinaliza a inexistência de esclarecimentos críveis. Sob uma ótica política, o capitão assiste, impotente, à erosão do poder que imaginava ter.
Bolsonaro havia perdido o controle sobre a direita. Perdeu a eleição presidencial para Lula em 2022. Nas praças em que desafiou aliados nas eleições municipais de 2024, colecionou derrotas. Abre-se a perspectiva de emergirem novas lideranças também na extrema direita.
A inelegibilidade já havia excluído o grotesco da cédula de 2026. A consolidação da perspectiva de condenação criminal compromete o plano do capitão de controlar a sucessão no seu próprio campo político.
Em público, o PL de Valdemar Costa Neto já não nega a tentativa de golpe. Mas insiste na fantasia segundo a qual Bolsonaro não tem nada a ver com nada. Nos bastidores, a cúpula do partido já admite que foi para o beleléu a pretensão de Bolsonaro de mimetizar o Lula de 2018, registrando uma candidatura presidencial legalmente inviável na antessala da disputa de 2026.
A direita e o centrão renderam-se à evidência de que terão que construir uma chapa sem o veneno golpista de Bolsonaro. Longe dos refletores, começam a ser desobstruídas as articulações na seara conservadora. Bolsonaro tende a ser distanciado dos entendimentos na proporção direta da sua aproximação com os indiciamentos pelos crimes de tentativa de golpe, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e formação de organização criminosa.
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