Josias de Souza

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Opinião

Visto a partir do ponto de ônibus, o pacote de cortes é uma afronta

Nos últimos dias, ministros e parlamentares bem-postos gastaram saliva em conversas com bambambãs do sistema financeiro. Queriam compreender os humores do dólar. Ninguém se animou a procurar o banco do ponto de ônibus. Ali, trabalhadores que esperam pelo transporte teriam dificuldade para compreender determinadas contradições.

Por exemplo: o Congresso autorizou o governo a arrochar a regra de reajuste do salário mínimo, mas afastou a tesoura dos supersalários do serviço público. Mexeu em benefícios sociais, mas salvou as emendas parlamentares. Reduziu o fundo nacional de educação, mas cuidou para que o fundão eleitoral cresça acima da inflação.

O Planalto esqueceu de enviar duas propostas que o Congresso não se lembrou de cobrar. Numa, seriam cortados privilégios de militares. Noutra, os pobres seriam liberados do Imposto de Renda e os ricos amargariam uma sobretaxa. Ficou tudo para depois do Carnaval.

Para aprovar os cortes, o Planalto abriu o cofre das emendas. Bem pagos, deputados e senadores entregam menos do que Fernando Haddad planejou e muito menos do que o mercado exigia. O ronco do dólar não é o maior problema. O dinheiro graúdo sempre fala mais alto que o miúdo. A questão é que o ponto de ônibus não tem voz, mas tem voto.

O perigo de tanta afronta é o brasileiro subempregado, subnutrido e sub-representado concluir que a democracia não foi feita para ele. Quem assiste sem dar um pio não poderá piar se um meteorito vindo da extrema-direita cair sobre 2026.

Opinião

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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