Topo

Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

No 7 de Setembro, 33 milhões de famintos irão às ruas apoiar Bolsonaro?

GETTY IMAGES
Imagem: GETTY IMAGES

Colunista do UOL

06/09/2022 18h52

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Jair Bolsonaro não transformou o Bicententário da Independência em um Grande Comício Eleitoral com o intuito de fazer ciranda. Como ele mesmo vem avisando, vai usar as micaretas para emparedar instituições, ameaçar opositores, atacar as urnas, excitar cabos eleitorais e gerar imagens.

Esse último ponto vale uma reflexão. Uma conhecida tática adotada pela equipe do presidente é usar imagens de multidões para tentar convencer que o apoio a Jair é maior do que realmente é. Partem de um fato comprovado (o presidente é uma pessoa popular que atrai multidões) para vender uma ideia falsa (essas multidões demonstram que a maioria dos brasileiros está com ele).

Ele já tem feito isso, ao longo dos últimos anos, com motociatas, carreatas, comícios e manifestações. Mostra uma aglomeração e aponta como a prova de que ele tem mais votos que Lula.

Mas considerando que o eleitorado apto a votar consiste em 156.454.011 de almas, os 31% (segundo o Ipec) que pretendem apoia-lo representam 48,5 milhões. Ainda assim, isso é menor que os 44% que Lula têm hoje, ou seja, 68,8 milhões.

Mesmo se encher a Esplanada dos Ministérios, a avenida Atlântica e a avenida Paulista, Bolsonaro não poderá dizer que o povo brasileiro está com ele, mas sim que ele é capaz de mobilizar seus seguidores. De acordo com institutos de pesquisa, o bolsonarismo-raiz gira em torno de 15% da população, o que não é pouca gente.E que, além disso, ele foi bem-sucedido ao se aproveitar de uma data cívica para sobrepor um comício, atraindo pessoas que estavam acostumadas, desde criança, a ir ver desfiles de 7 de Setembro.

Por isso, fotos e vídeos produzidos nesta quarta irão circular pelos grupos de WhatsApp e de Telegram e pelas redes sociais, transmitindo a ideia de que o país está com ele. E, consequentemente, que apoia suas pautas antidemocráticas, como o emparedamento das instituições, a ameaça aos opositores, os ataques às urnas, a excitação de seus cabos eleitorais.

A tática usa o mesmo método de ilusionismo presente na tentativa erodir a credibilidade dos institutos de pesquisa. A campanha à reeleição do presidente se aproveita da ignorância em matemática de parte da população para vender que enquetes realizadas dentro da bolha bolsonarista têm mais valor que pesquisas feitas com o rigor científico. Como tem muita gente que nunca teve uma aula de estatística, caem no conto do vigário.

Vale lembrar que as pesquisas mostraram uma estagnação de Bolsonaro. Na Ipec, Lula manteve 44%, enquanto o presidente oscilou de 32% para 31%.

Só há uma forma, contudo, de acreditar que Bolsonaro conta com o apoio do povo brasileiro: se, ao menos, 10% daqueles 33,1 milhões de famintos forem às ruas para dizer que o apoiam apesar de tudo.

O que não vai acontecer, pois enquanto estiverem rolando as micaretas bolsonaristas, os trabalhadores pobres estarão mais preocupados em tentar garantir a própria sobrevivência. De acordo com o Ipec, a rejeição do presidente entre quem ganha até um salário mínimo oscilou de 53% para 56%, entre os dias 29 de agosto e 5 de setembro.

Mas mesmo que fossem às manifestações, o presidente não conseguiria enxergá-los, como não tem sido capaz de vê-los desde que assumiu. Em julho de 2019, ele afirmou: "Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira". E no último dia 26, insistiu: "Alguém já viu alguém pedindo um pão na porta, no caixa da padaria? Você não vê, pô".

Em suma, Bolsonaro falará ao seu povo escolhido, o que é muita gente, mas exclui mais gente ainda.