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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Áudios golpistas indicam que CPI será uma catástrofe para o bolsonarismo

Colunista do UOL

08/05/2023 19h47

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Aliados de Jair Bolsonaro conseguiram aprovar uma CPMI do Golpe para tentar convencer a opinião pública de que a culpa pelo ataque a Brasília, no 8 de janeiro, foi das vítimas. Será que não contavam com a quantidade de revelações constrangedoras que serão liberadas durante o trabalho da comissão pela investigação da Polícia Federal sob supervisão de Alexandre de Moraes, mostrando que o bolsonarismo planejou com afinco a derrubada da República?

Recentemente, presenciamos conversas sobre um golpe de Estado entre o ex-major Ailton Barros, amigão de Bolsonaro, com o faz-tudo do então presidente, o tenente-coronel Mauro Cid. Ambos estão presos e com os celulares apreendidos em meio à operação que investiga fraude em dados de vacinação. Nas redes sociais, aliados de Jair tentaram minimizar, dizendo que Barros era um falastrão.

Agora, a história escala vários degraus ao envolver o coronel da reserva Élcio Franco, homem de confiança do governo, que foi colocado como secretário-executivo do Ministério da Saúde para ajudar o general Eduardo Pazuello.

Ambos coordenaram a sabotagem da saúde pública que foi a atuação da pasta, permitindo a morte de milhares de pessoas durante a pandemia. O nome dele apareceu na CPI da Covid não apenas por acusações de demora deliberada na compra de vacinas, mas também de permissão de superfaturamento.

Franco e Barros discutiram por áudios as possibilidades para um golpe de Estado, incluindo a mobilização de 1,5 mil militares, a prisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, o receio do comandante do Exército em apoiar o ato de insurreição e a chance de Bolsonaro ser preso. As conversas, que fazem parte dos áudios encontrados nos celulares apreendidos, foram divulgadas pela CNN Brasil.

"O Freire [Gomes, comandante do Exército na época] não vai. Você não vai esperar dele que ele tome à frente nesse assunto, mas ele não pode impedir de receber a ordem. Ele vai dizer, morrer de pé junto, porque ele tá mostrando. Ele tá com medo das consequências, pô. Medo das consequências é o quê? Ele ter insuflado? Qual foi a sua assessoria? Ele tá indo pra pior hipótese. E qual, qual é a pior hipótese?", afirmou Franco em um dos momentos.

Em outro, Barros afirma: "Esse alto comando de merda. que não quer fazer as porras, é preciso convencer o comandante da Brigada de Operações Especiais de Goiânia a prender o Alexandre de Moraes. Vamos organizar, desenvolver, instruir e equipar 1.500 homens".

Com a conversa entre esses três militares próximos a Jair, as evidências vão chegando mais perto dele, que fomentou por anos uma tentativa de golpe de Estado para, agora, tentar terceirizar as responsabilidades. Vai ficando, dessa forma, impossível negar que um grupo de militares tentou perpetuar Bolsonaro no poder - o que, convenhamos, é extremamente constrangedor para as Forças Armadas.

Aliás, militares terão que se manifestar bastante na CPI do Golpe. Vídeos do circuito interno do Palácio do Planalto, captados durante a invasão bolsonarista de 8 de janeiro, apontam que um grupo deles que estava por lá no momento do quebra-quebra foi frouxo ou golpista. Conversavam, riam, checavam os celulares, serviam água aos invasores, ajudavam os criminosos a escaparem sem dar voz de prisão.

Em uma das gravações, divulgada após ordem do Supremo Tribunal Federal, cerca de dez deles, lotados no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), descansavam no anexo do Palácio, enquanto a horda destruía o edifício principal. Devem ter enchido de orgulho o antigo chefe, general Augusto Heleno - que deve ser convocado junto com o general Gonçalves Dias, indicado por Lula, que aparentemente não comandava a própria tropa.

E após a invasão das sedes dos Três Poderes, o Exército impediu a entrada da Polícia Militar para prender golpistas no acampamento em frente ao QG. Com isso, muitos bolsonaristas tiveram tempo de fugir. O então comandante do Exército, general Júlio César de Arruda, disse a Lula que haveria um banho de sangue se a PM entrasse. Diante dessa chantagem, o presidente cedeu.

E muito antes de as hordas vandalizarem o Palácio do Planalto, o Congresso e o STF, em 8 de janeiro, antes mesmo dos trancamentos de rodovias para tentar evitar a posse de Lula (que ocorreram sob vistas grossas de parte da Polícia Rodoviária Federal), a primeira tentativa de golpe foi executada no dia 30 de outubro, quando a PRF, sob as ordens do então ministro da Justiça Anderson Torres, criou bloqueios que dificultaram o deslocamento de eleitores, principalmente no Nordeste. Onde o petista tinha maioria.

Inquérito da Polícia Federal sobre o caso aponta que o setor de inteligência do Ministério da Justiça fez um levantamento dos locais onde o petista foi mais votado para subsidiar bloqueios de estradas no segundo turno. Não só isso, como Torres viajou à Bahia para pedir apoio da superintendência da PF local à ação da PRF. Em depoimento, nesta segunda (8), ele negou a ação conjunta das duas instituições e o uso do levantamento para atrapalhar a votação.

Já como secretário de Segurança Pública do Distrito Federal, Torres deixou a estrutura do policiamento da Esplanada dos Ministérios frouxa e viajou para os Estados Unidos. A PM, por conta de suas decisões, não foi capaz de conter os golpistas. Depois disso, ainda surgiu um documento de natureza golpista no armário de sua casa. Dava autoridade aos militares para atropelarem o Tribunal Superior Eleitoral e melar as eleições.

Para azar do bolsonarismo, tanto o STF quanto a Polícia Federal estão empenhados em descobrir os que planejaram o golpismo. Como suas ações estão muito mais avançadas do que a CPI, que ainda nem começou os trabalhos, corre o risco de a comissão ser pautada pelas decisões de Alexandre de Moraes e as operações da PF ou pelo conteúdo a ser compartilhado por ambos. O governo Lula, que tentou evitar a criação da comissão, agora já vê se prepara para usá-la para despir em público o ex-presidente.

Eles vão negar até a morte, mas deve ter gente no Congresso rangendo os dentes de arrependimento.