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Proposta de Haddad para Plano Safra é impraticável, dizem ruralistas

A proposta do ministro Fernando Haddad (Fazenda) em usar o Plano Safra para induzir à diversificação de alimentos e reduzir a dependência da monocultura nos estados é inviável, dizem parlamentares da bancada ruralista.

Mais de 80% da produção de arroz vem do Rio Grande do Sul. O que estamos propondo no próximo Plano Safra: fazer com que os estados diversifiquem um pouco a produção, ou seja, não fique uma cultura concentrada em um estado só. Ao invés de um estado produzir só arroz ou milho, vai ampliar um pouco seu cardápio de culturas.
ministro Haddad, em entrevista nesta quarta-feira (8)

Os ruralistas dizem que a ideia não funciona por vários motivos:

  • cada agricultura responde a clima, condições geográficas e vegetação específicas;
  • a falta de assistência técnica para diversificar produção inviabilizaria o plantio;
  • e os preços aumentariam por causa do custo para adaptar a produção, entre outros.

Ainda que a bancada ruralista seja, em sua maioria, oposição ao governo Lula — e, portanto, mais suscetível a criticar o Executivo —, a declaração do ministro tampouco encontra respaldo entre especialistas do setor, que também apontam diversos entraves para promover uma mudança no direcionamento do programa de crédito rural.

Arroz em risco

A declaração de Haddad vem na esteira da catástrofe climática que se abateu sobre o Rio Grande do Sul e alagou a produção agrícola. O estado produz 70% de arroz do país e, agora, o mercado vê risco de inflação e desabastecimento do alimento.

"O ministro está vendo o momento de catástrofe no Brasil onde um estado tem produção com percentual significativo de um alimento, um grão essencial para o brasileiro", diz o deputado Sérgio Souza (MDB-PR), que já presidiu a FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária).

Ele acrescenta que "entende a intenção" de Haddad, mas que o arroz está no sul por vários motivos: são áreas de baixio, com concentração de água, onde a cultura se instalou há séculos. Souza diz que o produtor rural busca o equilíbrio entre o custo de produção, o lucro e o eventual risco daquele cultivo. Portanto, afirma, o governo não pode impor a diversificação pelo Plano Safra, e sim apenas tentar estimular de alguma forma com o crédito rural, "senão fica inviável" para o produtor.

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Ex-ministro do Meio Ambiente na gestão Jair Bolsonaro, o deputado Ricardo Salles (PL-SP) diz que o arroz, por exemplo, é produzido no Rio Grande do Sul porque é uma cultura que demanda muita água e o estado tem um índice pluviométrico favorável.

O argumento de direcionar a produção de acordo com Plano Safra é fora da realidade. O programa existe para permitir que as áreas com verdadeira vocação de produção possam investir sem o risco de oscilações de mercado. Você vê qual a vocação, quem quer produzir, vai lá e apoia. Não vai pegar o sol do Paraná e levar para o interior do Nordeste.
deputado Ricardo Salles (PL-SP)

"Dou o benefício do erro, da dúvida, ao Haddad. É uma lógica de mercado, que funciona para muita coisa", diz Salles.

Vice-presidente da Comissão de Agricultura, deputado Evair de Melo (PP-ES), classifica a iniciativa de Haddad como política, não técnica. Segundo ele, serve para o governo dizer que está fazendo algo pelo setor e pela cheia no Rio Grande do Sul, e os produtores não vão aderir. Para ele, o risco econômico oferecido por uma eventual mudança dificulta a proposta de Haddad.

Evair ressalta que seria preciso uma série de garantias como preço mínimo e crédito barato. para que a iniciativa funcionasse. E afirma que a mera distribuição de sementes faria com que apenas instituições ligadas ao governo, como MST, plantassem culturas diferentes.

Titular da Comissão de Agricultura, o deputado Pezenti (MDB-SC), diz que cada região se adapta em torno de uma cultura — e aí estão incluídos estabelecimentos comerciais e assistência técnica, que se especializam em um ramo de atividade. Pezenti afirmou que se fosse fácil já teria sido feito. Ele acrescenta que ninguém planta em região distante e gasta com transporte por opção. "É muito mais complexo que o ministro pode imaginar."

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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