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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Candidatos descobrem que ser vagabundo é muito pior do que ser corrupto

O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia de despedida dos ministros que deixam o governo para concorrer às eleições - Pedro Ladeira - 31.mar.22/Folhapress
O presidente Jair Bolsonaro em cerimônia de despedida dos ministros que deixam o governo para concorrer às eleições Imagem: Pedro Ladeira - 31.mar.22/Folhapress

Colunista do UOL

07/06/2022 04h00

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Parece que o rótulo de preguiçoso realmente está colando na figura do presidente Jair Bolsonaro. Até Lula resolveu surfar na onda que começou pelas redes sociais e ganhou a imprensa nacional. Neste final de semana, as redes do ex-presidente já estampavam o meme "vagal do Planalto". Os blogs petistas reproduziam à exaustão postagens com detalhes da agenda incrivelmente vazia da presidência.

Durante a campanha presidencial, uma das frases mais repetidas por Jair Bolsonaro era que o xingavam de algo porque não podiam xingar de corrupto. Combate à corrupção talvez seja o apelo eleitoral mais eficiente no Brasil. Além do atual presidente, foi usado por Lula, que prometeu levar a "ética na política" do PT ao governo. Antes, Fernando Collor prometia caçar os "marajás". Até Jânio Quadros se elegeu prometendo varrer a bandalheira e usando uma vassoura como símbolo de campanha.

São governos que fizeram muitas coisas e acabaram com tantas outras, menos com a corrupção. Os eleitores, que amam dizer que apoiam o combate à corrupção, muitas vezes encontram desculpas para seus ídolos políticos.

Já ouvi de bolsonaristas que rachadinha é algo menor porque todo mundo faz. Orçamento secreto foi o centrão quem obrigou a fazer. Problemas na pandemia são culpa do STF. Lulistas agora garantem que os processos da Lava Jato foram fraudes, invenções completas. As anulações não foram por erros técnicos nem abusos, era tudo mentira e todo mundo é inocente. Os milhões devolvidos em acordos de leniência nada significam.

Dizem por aí que esperteza é bicho que come o dono. Muito provavelmente estamos diante deste caso. O brasileiro não sabe como funciona a rotina do Poder Público e os políticos se aproveitam disso. A agenda de madame do presidente da República é um grande problema menos pela possibilidade de folga e mais pela probabilidade de trabalhar sem institucionalizar. Mas isso não faz parte do imaginário popular nem do debate público.

Quantos encontros o presidente da República teve sem registrar quem são as pessoas, qual o assunto tratado e o que foi acertado? A falta de transparência da agenda presidencial é acintosa e perigosa, mas não é o suficiente para afetar a imagem de Bolsonaro de forma preocupante. A suspeita de ser preguiçoso, quem diria, é vista como algo bem mais grave.

A lenda urbana de que deputado trabalha pouco porque as sessões ordinárias de plenário vão de terça a quinta é tratada como verdade até por gente inteligente. Na nossa cultura arcaica de trabalho, que valoriza a presença mais que a produtividade, apontar políticos como nossa antítese faz parecer moral ser workaholic.

Na tentativa de reeleição de Fernando Haddad para a prefeitura de São Paulo, a agenda vazia foi um problema pela mesma razão, a de ser tratada como medida do quanto ele trabalhava. Virou até briga judicial a história de que ele trabalharia pouco ou acordaria tarde. Verdade seja dita, aquela agenda parecia a do Elon Musk perto da agenda oficial de Bolsonaro, mais vazia que Brasília em feriado prolongado.

O presidente não tem como fugir da redução de danos, precisa que essa conversa não domine o debate até a eleição. Até pode parar de se exibir dançando funk em lancha, andando de jet ski e fazendo motociata. Seria a parte mais fácil. O interessante será a solução a ser dada para a agenda. Omitir compromissos pode ser uma tática semelhante à de colocar sigilo de 100 anos em tudo, para evitar desgaste com a divulgação da informação. A emenda saiu pior do que o soneto. O brasileiro perdoa tudo, menos político preguiçoso.