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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Quem quer um cheque em branco precisa ser uma tela em branco

Colunista do UOL

03/06/2022 04h00

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Os dois candidatos preferidos do eleitorado brasileiro até o momento não têm plano de governo, fazem campanhas absolutamente personalistas e não prometem nada concreto. As promessas todas giram em torno de ser melhor ou menos pior do que o outro. Antes que a bancada da falsa simetria fique atiçada, vale explicar que Lula e Bolsonaro não são iguais nem semelhantes, são profundamente diferentes.

A estratégia de campanha, no entanto, é semelhante. As duas equipes de campanha sinalizam não ter intenção de ir a debates. Talvez Jair Bolsonaro esteja copiando o que fizeram seus antecessores, como o próprio Lula. Nem FHC foi a debates de primeiro turno na reeleição. Mas é fato que Jair Bolsonaro já ventilava que poderia declinar convites para debates na eleição passada, quando não era presidente. É precisamente a posição de Lula agora.

O mais curioso é o posicionamento dos apoiadores, que parece mudar da água para o vinho. Uma atitude é democrática ou antidemocrática a depender do autor, não da atitude. O eleitorado petista esculhambou Jair Bolsonaro por tentar fugir de debates nas eleições de 2018. No final, ele acabou ficando de fora somente depois de sofrer o atentado.

A reação dos mesmos lulistas agora é diferente. Entendem como estratégia eleitoral aceitável não ir ao debate se o atual presidente também não comparecer. A militância bolsonarista obviamente não perde a oportunidade para apontar o dedo contra o PT, que estaria fugindo do debate democrático ou não teria como se sustentar num debate.

Pode parecer que ambas as militâncias são espelho da outra, que os líderes populistas são um o espelho do outro. E não são em absoluto. Não são o espelho de nada porque não oferecem nada além da própria personalidade e do conceito de candidatura forte.

Jair Bolsonaro fará um governo de bases liberais com a cara da Faria Lima ou irá fazer jus à sua biografia e seu primeiro governo, atendendo interesses corporativistas de alguns ramos do funcionalismo público? Lula fará um governo de restauração democrática à semelhança dos mandatos anteriores ou vai prosseguir com os discursos populistas e vendettas como o processo contra Sergio Moro?

Só eles dois podem dizer, embora apoiadores e adversários achem que têm as respostas na ponta da língua. Ocorre que as respostas estão na imaginação. Quando um candidato se coloca como uma tela em branco, como é o caso, cada eleitor projeta nele os próprios anseios e desejos. O amor e o ódio por um ou por outro acabam sendo convertidos em discursos que tentam explicar racionalmente programas de governo que jamais foram prometidos ou sequer cogitados.

E como o político faz depois que assume? Simples, continua sem prometer nem assumir nada. Ele é muito melhor ou então é até menos pior do que seu adversário seria na mesma situação. Jair Bolsonaro mostrou que é possível tocar um governo por anos nessa toada e ainda cogitar uma reeleição. Quem quer um cheque em branco precisa ser uma tela em branco.