Natália Portinari

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Congresso toma controle de R$ 4,5 bi na Saúde e exclui Planalto

Após um ano de briga entre o Congresso e o governo pelo controle do dinheiro do Ministério da Saúde, parlamentares conseguiram assegurar o poder sobre R$ 4,5 bilhões em emendas previstas para 2024 que devem ser rateadas entre aliados do governo.

A mudança é fruto de cobranças do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e de outros parlamentares para que as liberações de verbas na saúde se tornem mais ágeis e mais volumosas, irrigando o caixa de prefeituras aliadas.

A pressão de parlamentares pelas verbas da Saúde e para ter nomes de confiança em cargos no ministério é um dos fatores pesando contra a ministra Nísia Trindade, que sofreu cobrança recente do presidente Lula em uma reunião ministerial.

O aumento de poder dos congressistas é resultado de dois fatores: 1) a maior parte da verba para "atendimentos" na Saúde deixou de estar sob controle da ministra e agora está na comissão de saúde da Câmara dos Deputados; 2) uma nova regra das emendas de comissão, de 2024, tirou poder do Palácio do Planalto.

No ano passado, o governo atendia deputados e senadores na saúde através das emendas parlamentares comuns, mas também com uma verba do ministério que havia sido reservada para negociações políticas, registrada no Orçamento como "A400". Na saúde, foram liberados R$ 2,67 bilhões nessa modalidade.

Essas transferências, na modalidade "fundo a fundo" -- do fundo nacional para os municipais -- são as prediletas de deputados e senadores porque caem rapidamente no caixa das prefeituras, com burocracia reduzida.

No linguajar orçamentário, o dinheiro serve para custeio, ou seja, para quitar as contas do município na área de saúde. Não é preciso aprovar um projeto ou passar pela aprovação da Caixa Econômica Federal, como acontece nas obras públicas.

Neste ano, os atendimentos na saúde migraram do "A400" para as emendas de comissão. São indicações feitas pelos presidentes de comissões temáticas da Câmara e do Senado ao governo federal, em que líderes partidários também costumam influenciar para dividir as indicações entre suas bancadas.

Saúde tem maior verba

A Comissão de Saúde da Câmara, com R$ 4,5 bilhões, é a que tem mais dinheiro entre os R$ 11 bilhões previstos em emendas de comissão neste ano -- além disso, R$ 5,6 bilhões alocados em outras comissões foram vetados por Lula, mas o Congresso ameaça derrubar os vetos em breve.

O deputado Dr. Francisco (PT-PI) foi eleito presidente da comissão em 13 de março, o que significa que terá o poder de ditar o destino desse dinheiro.

Ao UOL, ele disse que ouvirá o colégio de líderes partidários para ratear as indicações com todos os deputados da Câmara, e não apenas com os integrantes de sua comissão. Segundo ele, os critérios de divisão ainda não estão definidos.

Solução provisória

Para a votação dos vetos presidenciais, prevista para as próximas semanas, o governo federal já prometeu também uma verba "extra" -- essa, sim, deve sair direto do caixa dos ministérios, como ocorria com o "A400".

São R$ 6 milhões prometidos para cada deputado que votar a favor da orientação do governo nos vetos. Metade dessa verba deve ser destinada na saúde e o resto no desenvolvimento regional, turismo, cidades e esporte.

Há uma disputa em andamento sobre o controle dessa verba, que vai servir como solução provisória até a repartição das emendas de comissão. Parlamentares querem que os pedidos sejam encaminhados também diretamente aos ministérios e não passem pelo Palácio do Planalto.

Nova regra

A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2024 trouxe uma previsão que deu poder aos deputados e senadores, determinando que os ofícios com as indicações das emendas de comissão sejam enviados pelos presidentes aos ministérios, e não à SRI (Secretaria de Relações Institucionais).

Dessa forma, o Congresso tirou da negociação a SRI, ministério comandado por Alexandre Padilha no Palácio do Planalto. Padilha é alvo de constantes críticas de parlamentares da base aliada.

Como mostrou a Folha, no final do ano de 2023, a distribuição das verbas "A400", comandada pela SRI, privilegiou municípios ligados ao PT.

A segunda comissão com maior verba é a de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado, presidida por Marcelo Castro (MDB-PI). São R$ 2,47 bilhões (R$ 1,9 bilhão foi vetado). No ano passado, ele usou o dinheiro da comissão para beneficiar uma construtora de seu irmão no Piauí.

Para o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE), a mudança é positiva, mas ainda não resolve o entrave dos repasses na saúde. Ele frisa que recentemente, muitos municípios tiveram aumento nos tetos do que podem receber, mas que ainda não ficou claro de onde vão sair os novos pagamentos.

"É um avanço importante, mas o governo precisa ainda dar uma solução em relação à questão das emendas da saúde. Os prefeitos receberam esse aumento de teto, mas de onde vão vir os recursos? Se só aumentar o teto e o governo não mandar (dinheiro), vai ser uma expectativa frustrada."

Nísia sob pressão

Os alvos das críticas de parlamentares sobre a SRI são o ministro Alexandre Padilha e o assessor Mozart Sales, encarregado do controle sobre a liberação de emendas e de verbas "extra" para políticos do Congresso.

O novo modelo das emendas de comissão, porém, aumenta a pressão para ocupar o ministério com nomes de confiança de políticos do Centrão, porque os pedidos do Congresso serão recebidos diretamente pela pasta.

A demissão do secretário de Atenção Especializada à Saúde, Helvécio Miranda Magalhães Júnior, após denúncias sobre a gestão de hospitais do Rio de Janeiro, abriu um flanco para que o Congresso tente emplacar um aliado no cargo. A secretaria concentra a gestão de boa parte das emendas parlamentares no ministério e, agora, é ocupada por um interino.

Nísia, porém, já indicou nos bastidores que quer um nome de confiança sua para a secretaria, de perfil mais técnico. Os médicos sanitaristas Hêider Pinto e Adriano Massuda estão entre os cotados.

Investigações sobre desvios

A PF (Polícia Federal) e a CGU (Controladoria-Geral da União) têm apurações em andamento sobre desvio de dinheiro de emendas na modalidade "fundo a fundo", cujo uso aumentou no governo Jair Bolsonaro.

No Maranhão, 47 municípios entraram na mira do Ministério Público Federal (MPF) pela suspeita de adulterarem dados para receber mais emendas desse tipo. Já no início do governo Lula, o Ministério da Saúde mapeou 457 municípios em que houve, potencialmente, esse tipo de fraude.

No esquema investigado no Maranhão, há a suspeita de que contratos para aquisição de equipamento médico e de terceirização de pessoal tenham sido usados para desviar dinheiro dos cofres públicos.

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