Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Moro veste fantasia de terceira via, mas o terno é de Bolsonaro
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
A inflação de candidatos que se autodenominam opções de terceira via, na presunção de que haveria uma disputa polarizada entre Lula e o candidato do Valdemar, esbarra na leitura superficial do que se trata a eleição de 2022. A disputa que será travada e está sendo ensaiada não é entre partidos políticos, entre candidatos, mas entre democracia e fascismo.
Moro entra oficialmente no jogo para o qual treinou nos últimos quatro anos - ainda como juiz e depois como cabo eleitoral do ex-chefe, usando toga ou no Ministério da Justiça - tentando tirar a vaga daquele que protegeu, por pensamento, palavras e obras. Veste uma fantasia de opção - a tal "terceira via" - uma criação idealizada para uma realidade à qual não se ajusta. Na verdade, o terno que usa é do mesmo alfaiate do ex-chefe e ídolo. Tem o mesmo molde.
O discurso propalado, de busca de "terceira via" como resposta à insatisfação do eleitor entre as candidaturas óbvias do ex-presidente e do atual, é mais um contorcionismo linguístico do que propriamente uma verdade eleitoral. Claro que falar em terceira via cria a esperança de que existe um caminho alternativo, que não considere que a democracia esteja em jogo e que se trata apenas de uma questão de desalojar um mandatário incompetente e descontrolado, por um lado. E por outro, impedir que um populista desavergonhado com o dinheiro público, condenado à cadeia, volte a comandar o país.
A simplicidade do raciocínio que acena com uma "terceira via", uma resposta ao sonho dos "antipolarização" - seja lá o que isso for - tem uma expressão corriqueira em inglês: wishful thinking - o desejo, o sonho, mais do que os fatos. Os argumentos de pesquisas que dizem "nem-nem" para Lula e para o candidato do Valdemar criam uma fantasia, segundo a qual é essa a possibilidade que está em debate. Como se o discurso fosse o embate baseado em matizes político-partidários.
A escolha será entre democracia e fascismo. Aqueles que se juntarem sob o guarda-chuva de um lado ou de outro serão os protagonistas da História. Aqueles que insistirem em criar um universo paralelo, com falas tangenciais sobre modelos econômicos mais ou menos liberais, sobre políticas públicas mais ou menos inclusivas, deixam de fora o tema central: os valores democráticos como esteio para a sustentação do Estado.
O candidato do Valdemar não tem problema em chegar em fóruns internacionais, como a cúpula da democracia, promovida pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e discursar (arrastando as palavras lidas no teleprompter) e fazer juras de amor ao estado de Direito e ao diálogo. Entretanto, se lhe falta desenvoltura para ler o texto que apregoa aquilo que os países democráticos defendem, tem a espontaneidade e vigor para atirar contra o STF (Supremo Tribunal Federal), praguejar contra a preservação da vida, para a qual o passaporte vacinal contribui, minar por dentro as instituições e fazer vista grossa para desmandos na área ambiental.
A confusão de entendimento sobre o significado da palavra liberdade, por exemplo, seu mote central atualmente, revela a incapacidade - para alguns má-fé - que tem na simplificação da fala a sua mais potente arma para criar confusão e fazer cortinas de fumaça. Porém, está diante dele um porta-voz para as teses que ele, o candidato do Valdemar, levou aos palanques em 2018: a luta contra a corrupção, contra o fisiologismo, "contra tudo isso que está aí", agora no centro dos discursos do seu ex-ministro da Justiça. Os dois disputam na mesma raia. Moro quer ser Bolsonaro.
Moro traiu a magistratura, fazendo dela um palanque para a trajetória política pessoal, colocando a retórica jurídica a serviço dos interesses do candidato que apoiava, para se beneficiar rapidamente de posição de luxo no governo, que agora rejeita, mas que aplaudiu na fila do gargarejo. Moro quer ser Bolsonaro, é a mesma via. Não uma outra.
Os outros quase candidatos à Presidência da República em 2022 - Ciro, Doria, Simone Tebet, Rodrigo Pacheco - são coadjuvantes de luxo nesse momento histórico. Não têm fôlego para afugentar a besta. Não há viadutos que tirem o país do confronto inevitável, repito, a escolha entre democracia e fascismo.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.